Infectologistas de Brusque divergem sobre possibilidade de fim da quarentena no estado
Reabertura dos estabelecimentos foi anunciada pelo governador, que voltou atrás na decisão posteriormente
O governador Carlos Moisés da Silva havia anunciado que, a partir de segunda-feira, 30, diversos serviços voltariam funcionar em Santa Catarina. No entanto, após reunião com prefeitos neste domingo, 29, ele sinalizou que a quarentena ainda não será interrompida.
Conforme a proposta inicial, na quarta-feira, 1º, outras atividades e serviços privados não essenciais, como academias, shopping centers, bares, restaurantes e comércio em geral, também serão autorizados a voltarem a funcionar. A limitação de entrada de pessoas em 50% da capacidade de público do estabelecimento continua valendo, podendo este estabelecer regras mais restritivas. Infectologistas de Brusque têm opiniões diferentes sobre essa abertura do comércio.
A infectologista Letícia Ziggiotti, que atende na Clínica Techy, em Brusque, e também no hospital Nossa Senhora das Graças, de Curitiba, e no Hospital do Coração, de Balneário Camboriú, considera bastante precoce encerrar a quarentena neste momento.
“Em uma epidemia, quem tem que tomar à frente é a saúde, e não a economia. Sou absolutamente contra a reabertura do comércio. Acho que temos que discutir em termos de saúde como proteger a população. Nós temos que aprender com outros países que estão tendo a epidemia agora. Houve outros países que tentaram, em função de aspectos econômicos, não fizeram uma fiscalização do isolamento”, lembra.
Para Letícia, o Brasil tem um fator de agravamento que é a condição socioeconômica da população.
“Especialmente em um país como o nosso, muita gente de classes menos favorecidas, os idosos não têm condição de isolar-se. A gente não conhece como o vírus vai se comportar na nossa população. Antes de tomar uma decisão como essa, é importante que a gente consiga entender qual o comportamento do vírus na nossa população e não colocar em risco as pessoas como uma aposta”, diz.
Já o infectologista dos hospitais Imigrantes e Azambuja e da Prefeitura de Brusque, Ricardo Freitas, entende que o retorno gradativo dos estabelecimentos é importante para o funcionamento da sociedade.
“Um desfecho ruim dessa doença para as pessoas que não têm outra doença associada, com menos de 40 anos, é extremamente raro. Uma vez imunizada, a pessoa não pegaria novamente e não traria para dentro de casa, de forma que você consegue proteger a população mais vulnerável. Precisamos que faça a roda da economia girar. A gente entende que, se ficar muito tempo parado, daqui a pouco o serviço de saúde fica inviabilizado, pela falta de recurso financeiro para gerir a saúde”, defende.
Para Freitas, a estratégia correta seria o isolamento vertical, diferente do horizontal que está em vigor no momento, com a população mais vulnerável e idosos em confinamento por mais 7 ou 14 dias.
“Precisamos proteger populações específicas, e começar a abrir o comércio aos poucos. Quem vai se expor na rua, talvez já até estiveram em contato com o vírus, e vão começar a criar uma imunidade, como aconteceu com o H1N1, por exemplo”.
Caso haja a reabertura dos estabelecimentos, Letícia alerta para que as pessoas redobrem os cuidados de higiene das mãos, das superfícies da casa, principalmente das que tiverem contato com o exterior, e também da higiene respiratória, como cobrir o rosto quando tossir ou espirrar.
“Quem conseguir ficar em casa, acho que isolamento social é a única medida que a gente tem. Quem tiver sintomas, que a pessoa fique em casa em isolamento, como temos uma quantidade de testes disponível muito pequena, não temos noção real de quantos casos estão circulando na comunidade”, ressalta.
Freitas alerta para que as pessoas que forem trabalhar mantenham a higienização por álcool gel, também nas lojas. Também defende que os estabelecimentos evitem aglomeração, e continuem com a distância de segurança, para evitar a transmissão do vírus de forma mais intensa.
Ele lembra que o município está antecipando a vacinação para a influenza, para evitar que a influência desta doença seja grande sobre a população e o sistema de saúde. Outra preocupação é a dengue.
“Eu acho que o sistema de saúde vai conseguir suportar. Estamos antecipando a vacinação pela influenza, para proteger o inverno que está vindo, então, supostamente, vamos ter uma boa cobertura para influenza, e não vamos ter que nos preocupar com isso. A guerra contra a dengue, porém, ter que ser eterna. Em Brusque, os trabalhos já voltaram no combate às endemias, e o inverno também diminui a proliferação da dengue”, lembra.
Tratamento com hidroxicoloroquina
O Ministério da Saúde começou a distribuir aos estados 3,4 milhões de unidades dos medicamentos cloroquina e hidroxicloroquina para uso em pacientes com formas graves do Covid-19.
Ainda não há evidências científicas suficientes que comprovem a eficácia do medicamento para casos de coronavírus, por ser uma doença nova, no entanto, o Ministério defende que há estudos promissores que demonstram o benefício do uso em pacientes graves.
O protocolo prevê cinco dias de tratamento e é indicado apenas para pacientes hospitalizados
Sobre a hidroxicloroquina, Letícia afirma que tem o alinhamento da Sociedade Brasileira de Infectologia. Ela menciona que é ainda uma droga em estudo e que está sendo utilizada porque não há outra opção terapêutica disponível.
“O Ministério da Saúde lançou um protocolo sobre o uso, mas ainda precisa de estudos. Não tem como dizer se funciona ou não sem estudos e resultados consistentes. É uma droga que ainda consideramos experimental”.
Freitas acredita que o medicamente é bastante promissor e que tem sido efetivo no tratamento de pacientes graves e com carga viral elevada.
“É um medicamento bastante promissor, tem mil pessoas sendo testadas, trabalho encabeçado pelo hospital Albert Einstein (São Paulo). Ele tem apresentado em trabalhos anteriores uma certa efetividade no que tange a redução da carga viral e melhora do paciente. Se o paciente tem uma forma leve, a gente não tem resposta ainda, por isso achamos receoso sugerir à população”.
A revista Istoé divulgou em matéria na quinta-feira, 26, que quatro pacientes de UTI tiveram alto após o uso deste medicamento, combinado com outros, em São Paulo.