Isso é coisa de criança
– É, né? Cê tá sentindo cheiro de quê?
– De ti.
– De mim? Passou o ventinho aqui e levou aí pra ti, foi?
– Sei lá. Parece que a gente tá na nossa casa.
– Ah. Tipo uma sensação que o cheiro leva a gente pra outro lugar, filho?
– Quê? Ah é…Tem que ter um monte de vento pra levantar nós. Um furacão só, né?
– Quis dizer o sentimento que dá. O cheiro traz uma lembrança.
– Como ele sabe?
– Sabe o quê?
– O que a gente lembra.
– Não é bem que ele sabe. O vento às vezes leva e traz cheiros que já passaram pela gente e daí voltamos ao tempo, para lugares que já sentimos isso. Ou com pessoas que sentimos.
– É, né, mãe. Cheiro de cocô também o vento leva.
– Oh, e se leva!
– Mas daí eu não lembro de ti, mãe.
– Ufa! – ri alto.
Odores são comunicadores. Fragrâncias familiares dão saudade, bálsamo que nos transporta sem permissão, perfumes que atiçam degustação, sedução. O cheiro vem e nos leva. É muito rápido. Catinga, então! Tem cheiro que dá soco no estômago ou até esgoela a gente. Ranço, fetidez faz qualquer um lembrar que tudo apodrece. Cheiro mexe conosco, serve de reconhecimento. Salva ou embriaga. Alerta ou relaxa.
– Filho?
– Quê?
– O melhor cheirinho do mundo é tu.
– É porque tu é minha mãe, dã.
Karline Beber Branco – professora e mãe