João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Brusque, anos 1970: geladeira e TV

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Brusque, anos 1970: geladeira e TV

João José Leal

Quando cheguei em Brusque, em novembro de 1971, para exercer o cargo de Promotor Público, não imaginava que por aqui ficaria. Mesmo que os rumos da carreira ministerial apontassem para outras comarcas, optei por ficar na Terra fundada pelo Barão de Schnéeburg até me aposentar. Talvez, por aqui fique para sempre. Afinal, árvore velha, dificilmente, se transplanta.

Neste meu já cinquentenário de vida brusquense, um pouco ator, um pouco espectador, muitos fatos presenciei no palco da história desta cidade que, durante quase um século, dependeu do bom desempenho da atividade têxtil das suas três grandes e pioneiras tecelagens, que hoje já não mais existem.

Encontrei uma Brusque ainda pequena, pouco mais de 30 mil habitantes, na qual viviam as tradicionais famílias de origem alemã, italiana e polonesa. Os migrantes aqui chegados eram poucos, a maioria vinda de perto, das cidades do vale do Rio Tijucas para trabalhar na construção civil e nas tecelagens. Brusque ainda se orgulhava de se chamar Berço da Fiação ou Cidade dos Tecidos.

Claro que outros migrantes, funcionários públicos como eu, bancários, jogadores de futebol, os primeiros médicos especialistas, aqui também chegavam e continuam aportando para trabalhar e ganhar a vida, o pão nosso de cada dia, como diz a parábola bíblica, que significa muito mais do que o simples pão do café da manhã, mas sim comida na mesa para as três refeições e casa para morar com geladeira, TV além de outros eletrodomésticos que então se tornaram objeto de consumo da classe média brasileira.

Graças ao crediário, com suas longas e “suaves” prestações, geladeira na cozinha e TV na sala deixaram de ser bens supérfluos, privilégios da elite, para também adentrar e ocupar o seu espaço nas casas dos nossos operários. Era duro e sempre será. Mas, valia a pena o sacrífico do pagamento mensal das prestações a perder vista, sempre renovadas. Afinal, era preciso garantir a frescura dos alimentos e o sabor de uma loira engarrafada estupidamente gelada, sem precisar ir ao bar da esquina.

De sobra, era o prazer de se sentar num sofá, para assistir ao noticiário, acompanhar a novela de cada noite e vibrar com os gols e vitórias do time do coração. Além da paixão nacional, o programa do Sílvio Santos e o Fantástico eram presenças obrigatórias nas telas da magia televisiva das tardes e noites dos brusquenses e dos brasileiros daquela época.

Penso que o consumo massificado da geladeira, hoje presença branca nos lares, garantiu uma melhor qualidade de vida para a grande maioria dos brasileiros. Por sua vez, a TV transformou os hábitos e costumes dos brasileiros. As pessoas permaneceram mais em casa e as tradicionais visitas entre amigos foram encolhendo e hoje ninguém mais se visita, porque se não é a TV é a internet.

Não me lembro de quando as coisas mudaram, mas sei que continuarão inevitavelmente mudando. Penso que o processo de transformação acontece de forma gradativa como a nos preparar e, quando percebemos, já estamos acostumados à mudança ocorrida na vida social.

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