Conversas Praianas: aterro e bandeirolas da ironia
Foi uma extraordinária obra de engenharia, daquelas de fazer as mentes mais exigentes se espantarem e as mais comuns ficarem empolgadas com os milhões de toneladas de areia roubadas do fundo do mar. Num vaivém de 15 quilômetros pra lá com seu porão vazio e outro tanto pra cá, com seu ventre cheio, a draga […]
Foi uma extraordinária obra de engenharia, daquelas de fazer as mentes mais exigentes se espantarem e as mais comuns ficarem empolgadas com os milhões de toneladas de areia roubadas do fundo do mar.
Num vaivém de 15 quilômetros pra lá com seu porão vazio e outro tanto pra cá, com seu ventre cheio, a draga Galileu despejou milhões de toneladas de areia roubadas do fundo oceânico para alargar a praia em mais 70 metros. E, agora, todos estão a aplaudir o aterro da praia central de Balneário Camboriú.
Realmente, foi uma obra admirável feita com prazo certo, com pontualidade de empresa séria vinda de um país pequeno como a Bélgica, mas grande em tecnologia e seriedade no cumprimento de prazos contratuais. Mas, não se deve esquecer. Sempre que se mexe na natureza, o resultado pode não ser o desejado.
Muitos turistas, aqueles com pouco tempo para ficar, talvez não notem nem queiram enxergar mesmo. Para esses veranistas de curta temporada, praia é tempo de pés n’água, sombra fresca e bebida alcoólica de manhã à noite, é curtição em tempo integral sem hora para terminar porque em breve será a volta ao lar e ao trabalho. No entanto, quem por ali caminhar beirando a água agora forçada ao recuo, pode ver que o mar não gostou da invasão do seu espaço natural de manobra.
O fato é que a praia não é mais a mesma, calma, tranquila, segura, com suas ondas para esparramar lentamente as suas águas ondulantes até se perderem sobre a areia. Antes, placas informavam sobre a poluição ou, de forma menos antiturística, advertiam veranistas sobre pontos impróprios para o banho. Agora, quem pela praia passar com o olhar de frequente caminhante, vai notar um festival assustador de bandeiras vermelhas, mais parecendo uma passeata CUTista ou do MST.
Ali estão para advertir sobre os perigos que agora ameaçam os veranistas. Dizem salva-vidas e surfistas que buracos no fundo do mar, repuxos e correntezas, ameaçam a segurança dos afoitos banhistas. Muitos deles podem até tudo saber da vida, mas não nadar para evitar o abraço fatal do impiedoso Netuno.
Contraditória ironia do turismo praiano, aquelas vermelhas bandeirolas de advertência sobre áreas de exclusão de banho, ali estão fincadas bem em frente a uma multidão de veranistas. Grande parte deles – agricultores do Centro-Oeste – com certeza, não comungam das ideias dessas duas agremiações sindicais.
Sempre vendendo otimismo, dizem as autoridades que o tempo se encarregará de colocar as coisas no devido lugar. Mas, quem poderá garantir?