Conversas Praianas: Covid e feijoada queimada
Penso que já estamos vencendo a batalha contra o coronavírus, esse cavaleiro apocalíptico da enfermidade, que veio do mundo das trevas para trazer doença e morte, para nos afastar dos amigos e parentes. Com vitória ou não, a verdade é que o assunto Covid continua na preferência das conversas das mulheres do Mares do Atlântico. […]
Penso que já estamos vencendo a batalha contra o coronavírus, esse cavaleiro apocalíptico da enfermidade, que veio do mundo das trevas para trazer doença e morte, para nos afastar dos amigos e parentes. Com vitória ou não, a verdade é que o assunto Covid continua na preferência das conversas das mulheres do Mares do Atlântico. Uma delas está justamente falando sobre o quase obsessivo cuidado da amiga da turma, a Maria Zita e o marido, para evitar a doença.
– Vocês não podem imaginar tanto medo do coronavirus. É verdade que os dois já são velhos e do grupo de risco. Mas, estão exagerando. Desde que começou a pandemia, os dois só têm saído do apartamento para ir ao médico. Não sei como conseguem ficar tanto tempo afastados. Tenho falado com ela pelo interfone. Convidei para participar das nossas conversas. Falei que não tem perigo de contágio porque usamos máscara e ficamos afastadas. Mas, não adiantou.
– Ela vive assustada, enxergando o perigo em todos os cantos, em todas as paredes. Disse-me que o corona fica flutuando no ar e não tem máscara que segure esse maldito virus. Para ela, o elevador sempre foi uma caixa de bactérias e vírus. Agora, com a Covid no ar, o perigo aumentou.
– Vocês precisam ver o hall do apartamento da Maria Zita. Está cheio de sapatos e chinelos, sacolas de remédio e compras do supermercado. Tudo de quarentena por dois dias, antes de levar para dentro e tempo do coronavirus sumir. A vizinha não gostou da invasão da área comum, mas a outra disse que é uma questão de saúde pública e que a vida não tem preço.
– Eu também já estou com 70 anos e me cuido. Mas, a Maria Zita está obsecada. Não é normal tanto pânico por causa de uma doença que tem contagiado muita gente, é verdade. Mas, a grande maioria resiste. Muitos, até, nem sentem nada. É como uma “gripezinha”, como disse o Bolsonaro. Acho que a Maria Zita só vê a Globo e está muito influenciada pelo Jornal Nacional.
– Mandou a faxineira ficar em casa e a Maria Zita, que nunca trabalhou, agora, teve que pegar na vassoura, varrer o piso, limpar banheiro, arrumar a cama e lavar a louça. Nunca cozinhou e, por causa da Covid, se meteu a fazer comida. Ontem, parece que a Maria Zita quis fazer uma feijoada. Encheu uma panela de com os ingredientes, botou no fogo e foi ver um seriado na NetFlix.
– Parece que os capítulos estavam tão bons que só lembrou da feijoada quando foi despertada pelo toque do interfone. Na cozinha já estavam o síndico, dois moradores e os bombeiros com extintores nas mãos. A panela estava seca, incandescida, quase numa brasa, a feijoada queimada, a fumaceira tomando conta da cozinha e o apartamento quase pegou fogo.
– Por isso, eu tenho dito. Viver é correr perigo. O que adianta entrar em pânico por causa dessa tal de Covid, se a gente pode acabar morrendo queimada?