João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Conversas Praianas: Sueli

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Conversas Praianas: Sueli

João José Leal

As chapecoenses do condomínio Alvorada do Atlântico estão novamente reunidas para a conversa de fim de tarde. Mesmo com o calor do verão, a cuia do mate amargo vai passando de mão em mão, cevando a prosa, confirmando o ditado gauchesco que matear é prosear. A sexagenária Sueli, veranista, está sorvendo o chá quente enquanto diz para as amigas:

— Nasci na colônia, no interior de Passo Fundo. Minha mãe me deu o nome de Sueli, em homenagem à parteira que veio à nossa casa para fazer o parto. Mas, não gosto do meu nome. Ainda se fosse com y. Eu gostaria mesmo é que fosse Suellen, com dois “eles”.

— O que tens contra esse nome? Minha mãe se chamava Sueli. E eu até acho bonito, gosto da sonoridade. Não é como esses nomes estrangeiros, que a gente tem que revirar a língua para pronunciar e que nada têm a ver conosco. Afinal, estamos no Brasil. Olha só a tua opinião. Gostarias de ser chamada de Suellen? É mania besta dos brasileiros. Só gostam de nome inglês para os seus filhos.

— E, agora, também para os cachorros. Minha vizinha comprou um Golden e botou o nome de Sunset. Perguntei a ela o que significava. Disse que não sabia, que tinha visto no Face e gostado. Vejam só a ignorância. Penso que devemos prestigiar a nossa Língua portuguesa.

— Desculpa. Nada contra a tua mãe nem contra a nossa Língua. É que os meus pais mudaram para Chapecó e a dona da zona de meretrício se chamava Sueli. Quando era adolescente caçoavam de mim. Na escola, como se diz hoje, faziam até bullying comigo. Quer ver quando a professora fazia chamada. Nos primeiros dias, parecia que todos ficavam gozando de mim. Eu tinha uma vergonha desgraçada.

— Numa tarde, minha mãe que só cuidava da casa e dos filhos, foi à loja do meu pai para pegar dinheiro e ir ao mercado. Flagrou o meu pai conversando com a tal de Sueli, como se fossem velhos e chegados amigos. Ficou uma fera. Foi uma briga desgraçada, o meu pai dizendo que a Sueli era apenas uma freguesa e minha mãe dizendo que não acreditava, que todos os homens são iguais. Ficaram brigados mais de um mês. Eu tive que enfrentar tudo isso.

— Durante muito tempo, eu não suportava que perguntassem pelo meu nome. Ficava sem jeito, toda ruborizada. O pior é que, quando eu estava numa festa ou numa reunião social, algumas amigas gritavam Sueliiiiii, bem alto, só para me ver constrangida. Era terrível, um sofrimento que só eu sabia o quanto doía.

— Quando casei e o padre falou bem alto o meu nome, quase perdi a voz para dizer o sim. A sorte é que eu tinha me preparado. Não podia dar vexame na frente dos convidados e nem perder o marido, que na época era figura escassa na praça de Chapecó. Então, fui superando aquele trauma e hoje já não me importo mais. Mas, gostaria de ter sido batizada com outro nome.

Colabore com o município
Envie sua sugestão de pauta, informação ou denúncia para Redação colabore-municipio
Artigo anterior
Próximo artigo