João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Coronavírus e Gripe Espanhola em Floripa

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Coronavírus e Gripe Espanhola em Floripa

João José Leal

Em Florianópolis, já escrevi numa crônica anterior, a gripe espanhola chegou com data marcada. Para o jornal O Estado, foi no dia sete de outubro de 1918, a bordo do navio Itajubá, “vindo do norte da República, com 38 doentes de influenza, quatro deles em estado grave”.

A grave epidemia já era conhecida pelo morticínio que vinha causando na Europa, desde o começo daquele ano. Dois dias antes, o próprio jornal havia noticiado que “a terrível epidemia da influenza espanhola paira como uma grande ameaça sobre o Brasil”.

Mesmo assim, o diário desconsiderou a gravidade do caso do Itajubá, tratando-o como uma ocorrência sanitária comum e sem maior importância para a saúde da população da cidade. E procurou minimizar o perigo, afirmando que as autoridades da saúde “prontamente tomaram as necessárias providências para evitar que a doença se propague em Florianópolis”. Parecia que nada aconteceria de mal, na capital catarinense.

No entanto, no dia 06 de novembro, o jornal informa sobre a situação de calamidade sanitária em que se encontrava a capital de Santa Catarina. Em letras garrafais alerta ao povo florianopolitano que: “A PESTE DA GUERRA ESTÁ FLAGELANDO TERRIVELMENTE OS POBRES DA NOSSA CAPITAL”. Em seguida, vem o apelo à “alma generosa do povo, suplicando-lhe que ajude a mitigar o sofrimento e a miséria desses infelizes”.

Na verdade, desde o começo do mês de novembro, a “Influenza hespanhola” havia se intensificado e o “número de enfermos era cada dia mais elevado”. Já se contavam mais de 4 mil pessoas doentes. O jornal informava, ainda, que “a situação dos nossos pobres é aflictiva e impressionante”. Ninguém poderia “deixar de acudir esses infelizes”, porque a caridade é a “virtude predileta de Deus”.

Mais grave que a “maldita peste”, era o quadro de miséria social que “tortura e martyriza milhares e milhares de infelizes”. O flagelo se tornava maior porque “a terrível enfermidade reduziu à miséria centenas e centenas de famílias”, que agora estariam mendigando para sobreviver. A situação seria tão caótica que, somente mais tarde, quando a doença fosse superada, “seria possível descrever as proporções apavorantes que assumiu essa epidemia”.

Interessante notar que o principal trabalho de combate à epidemia foi conduzido pela sociedade civil, por meio de uma Comissão de Assistência aos Necessitados, criada por iniciativa do próprio jornal O Estado. O farmacêutico João Medeiros da Silva atendeu a centenas de moradores do “Morro do Céo”. Registrou que o quadro de doença e pobreza ali existente era chocante. “As casas pareciam a hospitais”. Por todos os cantos havia doentes, muitos deles sem cama. “Deitados numa esteira, ali permaneciam no ardor da febre alta, outros queixavam-se lancinantes dores”.

No dia 3 de dezembro, o jornal publicou um texto do médico Alfredo Araújo, informando que, “felizmente, a pandemia da gripe está extinta ou erradicada da zona urbana da nossa bela capital”. A fúria da epidemia durou pouco mais de um mês. Mais de 10 mil pessoas teriam sido infectadas e, no mínimo, 130 seriam as mortes causadas pela gripe em Florianópolis.

Escrevo esta crônica, na certeza de que a epidemia causada pela Covid-19 também logo será erradicada e o tempo de confinamento chegará ao fim.

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