João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

O presidente e a demissão de Sérgio Moro

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

O presidente e a demissão de Sérgio Moro

João José Leal

Na última sexta-feira, em meio às notícias das quase 4 mil mortes causadas pelo coronavirus, assistimos a uma ridícula cena do circo político nacional. Para falar ao povo brasileiro, o presidente Bolsonaro colocou todos os seus ministros em pé, perfilados, em posição de sentido, como se integrassem um extravagante pelotão militar de engravatados. Paulo Guedes, talvez o próximo a receber cartão vermelho para deixar o time, destoava completamente da indumentária do pelotão ministerial.

Era o único de máscara, sem gravata, sem paletó e, curiosamente, sem sapatos. Todo o ministério ali estava reunido, desnecessariamente. Afinal, a fala presencial era destinada à população brasileira, a fim de explicar a exoneração de Sérgio Moro.

Falando de improviso, que deveria sempre que possível evitar, o presidente Bolsonaro proferiu um discurso desconexo, confuso, marcado por confissões de sinceridade duvidosa, numa tentativa inútil de contestar declarações feitas por seu ex-ministro. Sua improvisada fala transformou-se num tortuoso e mal explicado relato de fatos passados, muitos deles sem qualquer relação com a demissão de um ministro de Estado, como o caso de condenações criminais da sua sogra e da mãe desta, por tráfico de droga.

No entanto, as atuais investigações policiais contra parlamentares do seu partido e dois de seus filhos, Jair Bolsonaro deliberadamente omitiu em seu discurso. E são essas as investigações que pretende impedir, trocando a chefia geral da Polícia Federal. Ao menos, pensa que pode interferir no trabalho da polícia, a fim de colocá-la a serviço dos seus filhos e parlamentares do partido. Foi esse o motivo da exoneração de Sérgio Moro que, com toda a razão, não podia concordar com a interferência presidencial no trabalho da PF.

O presidente negou essa sua intenção. Mas, suas improvisadas palavras deixaram escapar, em duas ou três ocasiões, que queria nomear um delegado delegado-geral com o qual pudesse interagir sobre as atividades da PF. Além disso, diante da investigação criminal contra 12 deputados aliados, mandou mensagem dizendo ao ministro Moro que estava na hora de trocar o Delegado-Geral da PF. Assim, ficou claro que a demissão de Sergio Moro, seguramente, um dos seus melhores ministros, ocorreu por causa da indevida interferência do presidente na direção geral da PF.

Sem qualquer argumento nem justificativa razoável para exonerar Sérgio Moro, Jair Bolsonaro procurou denegrir a imagem de uma pessoa de comprovada integridade moral e a quem tanto deve a sociedade brasileira. Nesse momento, o presidente pousou de senhor da honestidade. Com um olhar tenso, ensaiado, mas claramente despido de sinceridade, afirmou que Sérgio Moro propôs continuar no Ministério da Justiça se lhe fosse prometida a nomeação para ministro do STF. Então, cometeu o ato falho mais grave e imperdoável do seu tumultuado discurso, deixando claro que estava faltando com a verdade perante a nação brasileira.

Com certeza não sabia ele que, na véspera, a deputada Carla Zambelli, sua líder na Câmara Federal, tinha trocado mensagens com Sérgio Moro pedindo que aceitasse a mudança na direção-geral da PF, com a promessa de sua nomeação para o STF. Dele recebeu a resposta de “que não estava à venda”. Eis uma prova indiscutível de que Jair Bolsonaro não falou a verdade. Porisso, perde ele a autoridade moral para governar a nação brasileira.

Quanto a Sérgio Moro, penso que seu grande erro foi deixar a magistratura, onde se consagrou como um juiz exemplar, visto até como herói nacional, para integrar um governo cujo presidente tem posições tão diferentes das suas e ainda falta com a verdade.

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