João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Santiago de Compostela

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Santiago de Compostela

João José Leal

Pela segunda vez, estive em Santiago de Compostela. Lá não cheguei após uma longa caminhada como fazem milhares de peregrinos a cada ano, dando o primeiro passo em Saint Jean-Pied-de-Port, no sudoeste da França ou em qualquer outra cidade mais ou menos distante da emblemática e milenar catedral. Afinal, como dizem os caminhantes, muitos são os caminhos e todos levam a Santiago de Compostela.

Como se sabe, a cada ano, gente do mundo inteiro caminha dias e dias, até mais de mês, para visitar o santuário. Uns, católicos, viajam para fazer a sua profissão de fé religiosa na doutrina, nos mistérios e dogmas da sua igreja. Outros, místicos à procura da paz de espírito, caminham em busca de um utópico nirvana terrestre, o que no fundo significa um esotérico encontro consigo mesmo. No entanto, penso que a maioria mesmo é turista que adora aventuras, fotografias e fazer o que está na moda, percorrendo o badalado caminho.

Todos, no entanto, católicos de fé, esotéricos e curiosos turistas, viajam para ao final adentrar o imponente e milenar templo e, numa manifestação mística de comum crença, se ajoelharem diante da imagem do santo-apóstolo. Para a igreja católica, São Tiago apóstolo deixou a Palestina para pregar na região da antiga Hispânia, então, sob o domínio romano e, volta à terra natal, foi decapitado por ordem do rei Herodes. Segundo a lenda, seu corpo teria sido trasladado ao local onde foi construída a monumental catedral de Compostela.

Na minha idade, já não há milagre capaz de me dar forças para caminhar centenas de quilômetros de fazer calos nos pés, saindo a cada manhã cedo para pernoitar e dormir em colchões espalhados pelo chão de alojamentos de albergues, que um dia foram conventos para acolher monges dispostos a jejuar, orar e se doar a uma vida de austeridade e penitência. Pelo que tenho visto, quando de volta às suas casas, muitos desses peregrinos-turistas usam o automóvel para tudo e não enfrentam uma caminhada sequer para ir ao trabalho, à padaria ou ao mercado.

Assim, cheguei a Santiago de Compostela de trem. Foi uma rápida e confortável viagem de 30 minutos, vindo de La Coruña. Então, da estação central, fiz minha caminhada de pouco mais de dois quilômetros, em meio a centenárias construções, muitas delas remanescentes da Idade Média, até chegar à majestosa catedral. Na grande praça em frente à entrada principal, estava uma multidão de turistas que, certamente como eu, lá chegaram sem muito caminhar.

Mas, vi peregrinos de curta ou longa caminhada chegarem aos pares ou em pequenos grupos. Pesada mochila nas costas, calçados especiais para andar o dia inteiro, uma bengala em cada mão, chegavam com ares de quem havia cumprido uma promessa, uma importante missão ou de ter vencido um grande desafio. Percorrido o caminho, os últimos passos foram dados para ingressar no magnífico templo e assistir à missa solene do peregrino.

Então, peregrinos e turistas, crentes ou não, cada um ao seu modo, rezaram as suas orações diante imagem de São Tiago, postada no centro do magnífico altar revestido em ouro. Não creio em milagre, mas aquele é sem dúvida um momento de paz de espírito e de reencontro consigo mesmo, neste mundo contraditório de felicidade e desgraça, alegria e tristeza riqueza e pobreza.

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