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Higiene estética

Nós, humanos, somos muito complexos, compostos de partes interconectadas. O intelecto – a parte racional – ocupa-se com os juízos de verdade ou falsidade acerca do que se afirma, e sempre foi considerado o elemento mais refinado e nobre da nossa humanidade. Podemos chamar ao conjunto de regras que regem nossa razão de “Lógica” e […]

Nós, humanos, somos muito complexos, compostos de partes interconectadas. O intelecto – a parte racional – ocupa-se com os juízos de verdade ou falsidade acerca do que se afirma, e sempre foi considerado o elemento mais refinado e nobre da nossa humanidade. Podemos chamar ao conjunto de regras que regem nossa razão de “Lógica” e suas descobertas de “ciência”.

Mas, anteriores e mais importantes que os juízos de verdadeiro e falso, estão os juízos de bom ou mau, que se referem àquilo que, na conduta prática da vida, podem produzir benefícios ou malefícios ao indivíduo e à sociedade. Trata do que é justo ou injusto, certo ou errado, virtude ou vício. A essa área, costumamos chamar de “Ética”. A educação ética é de importância capital. Já dediquei alguns artigos a ela, e percebo que o tema está ganhando mais espaço na mente e no coração das pessoas, o que é um ótimo sinal.

Mas há uma instância ainda mais básica e anterior a tudo isso, que costumamos, com muita frequência, ignorar. Trata-se da dimensão mais diretamente sensível da nossa experiência, o modo como primeiro captamos os dados que nos chegam aos sentidos, como estes afetam nossa alma e marcam nossos afetos. A essa área podemos chamar de “Estética”.

Embora a palavra tenha significados derivados e específicos, refiro-me aqui ao estudo desse componente da nossa psique, que forma nossas primeiras impressões sobre o mundo (e me parece bastante válida a máxima segundo a qual a primeira impressão é a que fica). A sensibilidade está na raiz da nossa percepção, e os juízos que ela emite (belo/feio, agradável/desagradável, prazeroso/doloroso) constituem também, de certa forma, o alicerce das nossas concepções éticas e intelectuais.

Como sujeitos reais e práticos, somos o resultado da constituição dessas três instâncias em nós. Não adianta saber intelectualmente um monte de verdades e não ter a sabedoria prática para viver bem, do ponto de vista ético. Do mesmo modo, parece-me impossível, ou pelo menos difícil demais, uma conduta ética genuína sem uma sensibilidade bem orientada.

Desse modo, a estética deveria ser a preocupação fundamental da educação.
As músicas e imagens apelativas, que excitam a sensibilidade das crianças, desenvolvem nelas, cedo demais, a sensualidade. Jogos, imagens e filmes de violência e terror, já tão acessíveis e “apreciados”, por crianças e adolescentes, também vão plantando suas sementes.

A criança não tem capacidade de julgar nada disso do ponto de vista moral, muito menos intelectual, mas sua sensibilidade capta, armazena e desenvolve os estímulos, criando certo “gosto” que, uma vez estabelecido, marca a afetividade e terá forte repercussão na sua postura moral e no seu desenvolvimento intelectual.

Vejo muitos pais e educadores desorientados e indiferentes nessas questões, até por serem, em alguma medida, também produtos dessas influências, especialmente do discurso “moderno” de que gosto é sempre uma questão subjetiva. Aliás algumas manifestações de “arte” têm sido armas de deseducação e desorientação. Assim como, no aspecto biofísico, as mãos devem estar limpas, pois são a porta de entrada de vírus e bactérias, é preciso depurar o que entra em nós através dos sentidos. A higiene visual e auditiva é essencial para não contaminar o coração e a alma.