Nem o feriado barra nosso compromisso de trazer literatura feita pelos adolescentes toda quinta-feira. Hoje, quem ocupa o espaço é Olavo Kormann.
FOBOS
Um olhar oco de cansaço involuntariamente simulado é tudo o que confronta a superfície alva do caderno recém-adquirido. A garganta, já ressecada, emite um som ululante, arauto de uma muda resiliência. A mente, repleta pela onipresença efêmera de vácuos densos, se contorce em um esforço hesitante – e, consequentemente, frívolo – para racionalizar suas infinitas ausências.
“Talvez seja melhor recorrer ao medicamento”, proferidas tais orações falaciosas, ergue-se o prisioneiro de sua masmorra acolchoada. Caminha em ritmo letárgico até a cozinha, os movimentos limitados por um par de correntes, constituídas por elos de sofrimento, que o perseguem com voracidade predatória. Não obstante, o indivíduo não busca dedicar-se a tentativas de fuga – o confinamento, por si só, já se configurava em eficiente rota de escape.
Em um ato de ironia velada, a mão sinistra abandona a socialmente discriminada caneta esferográfica, rendendo-se aos interesses plutocráticos das multinacionais farmacêuticas. Fobos – era por meio de tal nome ancestral que o cativo cotidianamente se referia à seu soberano olímpico. Fobos – famigerada prole de amor e guerra, lícito elixir nocivo, amplamente indicado por sua capacidade inata de induzir tão familiar e primordial instinto de autopreservação. Fobos – mergulha em sua garganta e explode em seu peito, exercendo efeito erosivo sobre sua, uma vez imaculada, alma de poeta. Fobos.