Manilhas que ligam nada a lugar nenhum
Há mais de duas décadas, a Prefeitura de Brusque recebeu do governo federal vultoso montante de recursos para iniciar a implantação de redes coletoras de esgoto sanitário. Os números impressionam: investimento equivalente a mais de R$ 30 milhões, sem considerar a variação inflacionária neste período, para implantação de mais de 60 km de redes. O […]
Os números impressionam: investimento equivalente a mais de R$ 30 milhões, sem considerar a variação inflacionária neste período, para implantação de mais de 60 km de redes.
O município foi beneficiado, em 1993, com recursos federais do Programa de Saneamento Emergencial e Geração de Emprego (Prosege). No entanto, a obra foi executada com deficiências que impossibilitaram o aval técnico do governo federal, fato que será detalhado a seguir.
Recentemente, entrevistamos o ex-prefeito Danilo Moritz sobre o tema. Ele comandava o governo quando os recursos foram liberados, explicou detalhadamente a sucessão de erros de três governos, incluindo o seu, para que as redes de esgoto sanitário implantadas àquela época já não sirvam mais para nada.
Moritz relembra que, quando entrou na prefeitura, em 1993, o processo para a implantação da rede de manilhas para coleta do esgoto já estava em fase avançada. A licitação havia iniciado na gestão anterior, de Ciro Roza, e coube a ele, em janeiro, finalizá-lo.
O ex-prefeito relembra que foi um processo licitatório considerado “estranho” por ele. O motivo? Todas as empresas interessadas apresentaram propostas idênticas, ocorrendo a definição da vencedora por sorteio.
“Hoje eu estou convencido de que aquilo tudo foi manipulado”, diz Moritz.
Mas o processo seguiu e a ele coube assinar o contrato, o que ele diz ter se arrependido amargamente. “Se fosse hoje, não assinaria”, diz. Moritz avalia que, naquela época, ele e sua equipe não concordaram com pontos do projeto executivo, que estava mal feito.
Chegou a enviar ofícios ao governo pedindo para substituir as manilhas por aço, mas a resposta foi negativa: o projeto tinha de ser seguido à risca.
“Aonde eu vou, ainda hoje, sou culpado por ter colocado as manilhas, quando o projeto não foi meu”, afirma. “Se eu tivesse um pouco mais de experiência, não teria assinado o contrato. Só que esse grupo de engenharia que ficou comigo era todo do governo anterior, então…”.
Ainda assim, como o recurso já estava liberado, decidiu prosseguir. Houve, entretanto, inúmeros problemas com a obra. O ex-prefeito disse que a postura da empresa contratada não era adequada, e os serviços demoraram para serem executados.
Aos trancos e barrancos, a rede de manilha ficou pronta até o fim de seu governo, mas ainda não estava em funcionamento. Para isso acontecer, seria necessário captar recursos para licitar as chamadas redes-tronco, que fazem a ligação entre as redes que atravessam a cidade e a estação de tratamento.
Moritz disse que orientou pessoalmente o ex-prefeito Hylário Zen, que o sucedeu em 1997, sobre a necessidade de executar as redes-tronco, e que este foi bastante receptivo à orientação. Entretanto, as redes não saíram do papel, apesar de haver recursos disponíveis no governo federal.
Na avaliação do ex-prefeito, não foi Zen o culpado pela rede-tronco não ter sido implantada. Ele credita isso ao mau assessoramento que o sucessor teve, assim como ele próprio o teve anteriormente.
“Não por causa do seu Hylário, mas havia ali dentro da gestão outros políticos, que não quero nem citar o nome, que não foram buscar o dinheiro. Se tivessem buscado, hoje o esgoto estaria funcionando, mesmo não sendo o melhor”, avalia.
Portanto, a avaliação de Moritz é que Roza errou ao licitar o projeto com redes de manilhas, cuja durabilidade e a qualidade é menor; que ele próprio errou ao dar seguimento ao projeto, quando haviam problemas; e que Zen errou ao não concluir o projeto, já que este já estava praticamente finalizado.
Os reflexos dessas decisões são sentidos até hoje. Por um tempo, o município ficou com o nome sujo junto ao governo federal, já que as redes de manilha ficaram esquecidas e se deterioraram, não havendo possibilidade de serem prestadas as contas dos recursos repassados pelo convênio.
Isso só mudou em 2009, quando a prefeitura conseguiu liminar para ter seu nome retirado do cadastro de pendências do governo federal.