Natal 1915: guerra e o primeiro advogado brusquense
Era 25 de dezembro de 1915. Na edição daquele dia tão importante para a cristandade, a Gazeta Brusquense não publicou nenhuma matéria sobre o Natal. Apenas as tradicionais mensagens de “Boas Festas e Feliz Ano Novo”, pagas por famílias da elite brusquense, foram publicadas na página 3. E mais nenhuma palavra sobre a festa natalina. […]
Era 25 de dezembro de 1915. Na edição daquele dia tão importante para a cristandade, a Gazeta Brusquense não publicou nenhuma matéria sobre o Natal. Apenas as tradicionais mensagens de “Boas Festas e Feliz Ano Novo”, pagas por famílias da elite brusquense, foram publicadas na página 3. E mais nenhuma palavra sobre a festa natalina. Assim como vinha acontecendo desde o começo da I Guerra Mundial, a primeira página foi ocupada por mais um extenso artigo enaltecendo as forças armadas alemãs.
Só no final da página 2 foi publicada uma pequena nota sobre Júlio Renaux, filho do capitão da indústria brusquense, que havia regressado à cidade no dia 22 de dezembro, depois de ter concluído “um curso brilhante e recebido o diploma de Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais”, no Rio de Janeiro. Segundo escreveu o jornal, “a chegada do Dr. Júlio Renaux, o primeiro filho do município formado em Direito, foi uma verdadeira festa para os habitantes de Brusque”.
A Gazeta não estava exagerando. Autoridades e muitos brusquenses tinham se deslocado ao som da Banda Concórdia até a entrada da cidade para recepcionar e prestar “uma carinhosa homenagem” ao novo bacharel em Direito. Na ocasião, “o prefeito Vicente Schaefer proferiu um vibrante e eloquente discurso de saudação ao novel advogado”.
Naquele tempo, diploma de bacharel em Ciências Jurídicas era coisa rara, privilégio só permitido aos filhos da elite econômica e política brasileira, ostentado como verdadeiro troféu pertencente à comunidade local. Talvez por isso, ao final do seu inflamado discurso e em nome do povo brusquense, o prefeito presenteou o novo advogado com “um lindo anel de rubi, ladeado de brilhantes”, símbolo da corporação dos profissionais do direito.
Em seguida, provavelmente com o anel a brilhar no dedo anelar da sua mão esquerda, o primeiro advogado nascido em Brusque acompanhou “o préstito puxado pela Banda Concórdia”, até o Hotel Schaefer, no centro da cidade. Ali, foi saudado pelo jovem Alexandre Gevaerd, representante da Mocidade Brusquense.
Então, o Dr. Júlio, “visivelmente comovido, agradeceu as manifestações de simpatia e carinho de que estava sendo alvo da parte de seus conterrâneos”. No seu longo discurso, não deixou de citar o pensamento de um grande jurista alemão, afirmando que “a vida do Direito é uma luta incessante” para garantir a ordem e o progresso social. E afirmou que estava voltando para lutar pelo Direito, pelo progresso e o desenvolvimento da sua cidade natal.
Assim era no começo do século passado e continuou sendo por muito tempo depois. A comunidade orgulhava-se dos seus raros profissionais diplomados nas poucas faculdades existentes no país, considerando-os um verdadeiro troféu de bem-estar social para os seus habitantes.
Hoje, se o poder público municipal decidisse presentear cada advogado com um anel de rubi e brilhantes, com certeza, muitos milhares de reais seriam gastos para fazer a alegria das joalherias da cidade. E os céus da cidade faiscariam em dias de sol com o brilho de tantos diamantes.