Hoje o resgate da memória de 1988, como foi vivido em Brusque, fica nas mãos do (agora professor) Luiz Deschamps, vocalista e letrista daquela que foi a principal banda local, na época – o Bandeira Federal. Inspiração e influência para toda aquela cena brusquense de rock. A palavra é toda dele.

 

 

“Trinta anos depois: 1988. O que me vem à memória? Nomes dispersos: New Point; Hau Ai; Irmãos Heil Motos; Araguaia FM: os patrocinadores; FIDEB e Amarelo Vinte: os “espaços de shows” preferidos; e o Contracorrente dando a liga que faltava pra botar no mapa os sonhos de toda essa molecada. 1988 foi um ano insano.

                Quando lembro das pessoas – Luiz Thunderbird, Redson, Rodrigo Del Rey, nossos ÍDOLOS – palmilhando o calçamento e as ruas de lajota e de barro da Brusque desses tempos. Nossos ídolos andavam pelas mesmas ruas por onde andávamos nós!! E a descoberta: nossos ídolos também riam; falávamos o mesmo idioma; e até mesmo alguns sonhos eram muito parecidos… Mas também me lembro dos meus passos, do que eu pensava e sonhava.

                Claro que eu já era mais velho que todos – o ‘decano’ do grupo, no dizer de colunista da Folha de São Paulo. Claro que eu já tinha perdido muitas ilusões; mas nem se tratava especificamente disso – de ‘perder as ilusões’ –; mas de sacar que de sonho em sonho, de passo em passo, o que faz valer a caminhada é o que se deixa feito. E a gente fez muito, muito!! Gente, a gente saiu na FOLHA DE SÃO PAULO!!! Hellooooouuuu!!! A FOLHA fez foto da gente; a molecada em frente ao Amarelo Vinte. E olha que era ‘A Folha de São Paulo’ dos bons tempos; áureos tempos do Jornalismo impresso… E nós lá, naquelas folhas. Brusque e as suas ruas de chão batido, atravessadas por pedestres rasteiros, automóveis antigos e carroças e carros-de-mola; Brusque naquelas folhas!! ‘A Capital do Rock no Sul’. Inesquecível. Sem mais: inesquecível.

                Nunca vou me esquecer das primeiras ‘produções’ que fizemos. Uma coisa era certa: sempre ficava faltando alguma coisa nos nossos shows; sempre deixávamos de fazer algo fundamental. Um dia, faltava um cubo de guitarra sobressalente; outro dia, faltavam cabos ou microfones para alguém; isso quando não errávamos nomes ou os textos das nossas ‘filipetas’ de divulgação.

                As ‘filipetas’. Como era bom entregar aqueles folhetinhos recortados de folhas A4 divididas em 5 partes. Nas saídas dos colégios, nos ‘picos’ mais concorridos, nos bares e bailes que frequentávamos com nossas calças rasgadas, nossos cabelos ‘criativos’ e nosso jeito insolente. Olhando assim eram simples pedaços de papel marcados pela tinta fraca de impressoras vagabundas da Xerox; mas hoje eu vejo que, na real, eram senhas; senhas de acesso a sonhos. E a cada vez que uma senha daquelas tocava alguém, cada vez que uma senha daquelas fazia com que alguém diferente fosse ao show do DaBesta, da Shit ou do Insultos, era um tijolinho a mais na construção dessa história linda que tive o privilégio de vivenciar. Que coisa maluca!

                Trinta anos. Como me serviram tanto, esses meses insanos de 88. Tudo, absolutamente TUDO que eu vivi depois, sempre foi ancorado nessa memória doce, que me confortava na solidão de Porto Alegre, dos novos amigos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tanto que uma das primeiras coisas que fiz na UFRGS foi um fanzine: o Notas Marginais… Adivinha de onde veio a ideia?

                Trinta anos depois, 88 parece distante, mas só nas aparências. Quem viveu aquilo sabe que vai carregar consigo algo único, brilhante, raro, imortal; 88 nunca foi: é, e é pra todo o sempre.”

 

É claro que aquele ano de ápice de toda uma História que precisa ser resgatada não vai caber em uma só semana aqui das nossas conversas. Mais vozes já estão chegando, trazendo mais memórias de um tempo em que Brusque, de repente, para quem estava aqui e também para quem estava vendo de longe, pareceu ser muito maior do que era.

 

as fotos do outdoor e dos ingressos vieram do inesgotável baú do Rafael Risch.