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Clube de Caça e Tiro Araújo Brusque: o berço da vida social

Edificação foi a primeira sede das principais festas e confraternizações do município

O início da construção da edificação onde hoje está sediado o Clube de Caça e Tiro Araújo Brusque data de meados de 1927, mas sua história é de algumas décadas antes. Inaugurado em julho de 1866, o clube é o mais antigo do gênero na América Latina. É também o mais antigo ainda em pleno funcionamento no Brasil.

Como finalidade inicial, o Clube de Caça e Tiro servia para treinamento de tiro para defesa contra os aguardados ataques dos indígenas à época e, na aurora de sua serventia a atividades sociais, para encontros das famílias brusquenses após o culto dominical.

Atualmente, o espaço localizado na rua Hercílio Luz – não por acaso a que mais abriga edificações antigas por metro quadrado em Brusque – é vocacionado aos múltiplos usos que o tornaram um dos símbolos da vida social no município: lá, amigos se reúnem para jogar bocha, praticar tiro ao alvo, brincar no salão de jogos e para festas e encontros sociais.

Edificação atual tem pouco mais de 80 anos, mas o clube está prestes a fazer 150

“A sede social em si, nos primeiros tempos de sua existência, era uma das únicas sedes de maior porte aqui em Brusque. Nós não tínhamos cinema, então ela era utilizada para apresentações de sessões cinematográficas, para sessões de teatro. Tudo era feito ali”, conta Ewaldo Ristow Filho, que presidiu o Clube de Caça e Tiro até junho deste ano.
Ele fala, com orgulho, do papel do clube e de sua quase centenária edificação na construção da vida social de Brusque.

“Nesse período, de 1927 até 1940, o clube era um aglutinador das atividades sociais, culturais e esportivas que aconteciam na cidade”, diz Ristow Filho, “até pela própria localização, no Centro da cidade, assumiu essa função”.

O RANGER DO ASSOALHO
O ex-presidente explica que, embora tenha sido construído especificamente para a prática do tiro ao alvo, a necessidade do clube em atender a demanda de Brusque por um bom espaço de eventos – públicos e privados – sobressaiu-se, o que motivou a construção de diversos anexos, estes, bem mais novos do que a estrutura que ainda resiste, a do salão social, edificação de 88 anos de história.

A parte mais antiga levou cerca de um ano para ficar pronta e foi inaugurada em junho de 1927. A estrutura impressiona logo na fachada, na qual o nome do clube está moldado em letras garrafais, em estilo arquitetônico que remonta à época em que foi construído.

Imagem da atual sede registrada em 1934

Na parte interna, o teto alto e as grandes portas também são elementos característicos do período. Já no segundo piso da edificação está uma grande sala de reuniões, onde, nas paredes, há uma galeria de fotos com todos os ex-presidentes do clube.

O octagenário casarão tem parte de sua estrutura sustentada por um antigo, mas resistente, assoalho de madeira, daqueles que denuncia de antemão a presença de visitantes, devido ao ranger característico quando em contato com a sola dos sapatos.

GARANTIA DE PERMANÊNCIA
Os anexos vieram mais tarde: a secretaria do clube, salão de jogos, restaurante. Ampliações de maior porte foram realizadas em 1997 e em 2004. Uma nova reforma, que englobará principalmente o telhado da edificação, está prevista para ser realizada em 2016, no sentido de se preservar a atual estrutura.

“O salão social é original, o restaurante foi anexado, o hall de entrada e o bar foram outras construções que foram colocadas para dar amplitude à sede, que no decorrer dos anos precisou de mais espaço”, explica Ristow Filho.

No salão social, um imponente lustre é carro-chefe da iluminação

Ele destaca que há consenso, dentro do clube, de que a estrutura precisa ser preservada. “Existe o interesse de conservar, porque ela praticamente faz parte do patrimônio histórico da cidade. Não se pensa, de maneira nenhuma, em derrubar. A edificação atende as expectativas do clube hoje, e acredito que por muito tempo, ainda”.

O ex-presidente afirma que também é inviável, financeiramente, derrubar a estrutura antiga – que está em boas condições – para construir uma sede nova. “Os recursos necessários seriam imensos. A intenção é preservar, até porque ela serve como referência para a cidade, a fachada da sede, e seu estilo arquitetônico”.

Se não houver mudança neste pensamento, há a garantia de que a edificação histórica de Brusque permanecerá em pé, ao contrário de muitas outras, na própria Hercílio Luz, que vieram ao chão nas últimas décadas.

UM SÉCULO DE HISTÓRIAS
A sede do Clube de Caça e Tiro recebeu acontecimentos marcantes da história de nossa cidade, como, por exemplo, a primeira edição da Festa Nacional do Marreco (Fenarreco), realizada há 30 anos.

Na parte interna, uma antiga porta de madeira “de correr” ainda é utilizada

Boa parte das memórias do clube foi vivida na atual sede social. Elas estão retratadas, esmiuçadamente, no livro “Clube de Caça e Tiro Araújo Brusque: Memórias”, coletânea de textos organizada pelo escritor Ayres Gevaerd.

“A entidade logo se revelou a vertente dos principais acontecimentos da então Colônia Imperial, bem como o ambiente das confraternizações, ideal para conservação dos hábitos, costumes e tradições germânicas”, escreveu Gevaerd, no prefácio de sua obra, editada em 2006.

Conforme pesquisa realizada para a produção da obra, a construção da atual sede se deu com colaboração direta de associados e da comunidade. A diretoria nomeou, em meados de 1923, comissões para organização de bazares mensais para arrecadar fundos, para avaliação de qual seria o local ideal para construção e outra para compra de material.

A planta foi aprovada definitivamente em dezembro de 1924, sendo a construção finalizada três anos depois. Nesses anos todos, a sede do clube recebeu incontáveis pessoas em acontecimentos sociais de todo o tipo.

Diversas reformas foram feitas, mas o estilo original foi mantido

Foi, por exemplo, o local escolhido, em Brusque, para abrir as portas ao primeiro interventor federal nomeado para o estado de Santa Catarina: general Ptolomeu de Assis Brasil, em 1931. O Caça e Tiro também foi propulsor, ao longo dos anos, da promoção de músicos locais com as tradicionais domingueiras, realizadas desde a década de 20.

Lá, músicos dos “eruditos” aos mais modestos tiveram seu espaço. Gevaerd lembra, em seu livro, do Gaiteiro Malaquias, que comandou a maior parte das festas entre 1928 e 1930. Sua marchinha “Claudionor” era sucesso, à época.

Do estampido do revólver ao som da gaita de Malaquias, a edificação preservada no coração de Brusque serviu, durante todos estes anos, a todo tipo de convenção social. E, se o tempo permitir, continuará servindo por muitos e muitos anos.