O caminho dos acordos: como funciona a conciliação na Justiça do Trabalho de Brusque
De 2015 a 2021, município teve índice de acordos em processos trabalhistas de mais de 56%
De 2015 a 2021, município teve índice de acordos em processos trabalhistas de mais de 56%
De 2015 até o primeiro semestre de 2021, 14.982 processos deram entrada nas duas varas da Justiça do Trabalho de Brusque. Deste total, 8,5 mil foram solucionados por meio de acordo entre as partes, ou seja, 56,7% dos casos.
O índice de conciliação na Justiça do Trabalho de Brusque é considerado um dos mais altos do estado. O percentual de resolução por acordo na cidade, de 2015 até junho deste ano, é maior que o de Balneário Camboriú, por exemplo, que no mesmo período teve um percentual de 50,3%, e de Jaraguá do Sul, com índice de 44,1% dos casos solucionados por conciliação. Ambas as cidades contam com duas varas do trabalho e têm população semelhante à de Brusque.
A cidade também fica à frente quando comparada com Blumenau, que tem mais do que o dobro da população, e quatro varas do trabalho ativas, com um índice de acordo de 43,4% entre 2015 e o primeiro semestre deste ano.
Cada vez mais, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT-SC) tem estimulado a prática da conciliação nas ações trabalhistas, já que a medida, além de beneficiar as duas partes – empregado e empregador – também ajuda a desafogar o judiciário, acelerando a resolução dos processos.
Neste sentido, o TRT-SC implantou em Brusque, em 2019, o Centro Judicial de Solução de Conflitos (Cejusc). Desde novembro de 2019, todos os fóruns trabalhistas de Santa Catarina contam com a estrutura, que foi criada com o objetivo de estimular o diálogo e o acordo entre trabalhadores e patrões.
“O Cejusc é uma estrutura pensada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2010 como meio alternativo para a solução de conflitos. O acordo abrevia muito o caminho do processo, todo o trâmite processual. Não é preciso ouvir testemunhas, designar diligências, perícias e diminui também todo o custo”, observa o juiz-coordenador do Cejusc de Brusque e também juiz substituto da 1ª Vara do Trabalho, Paulo Cezar Herbst.
O Cejusc de Brusque foi criado em junho de 2019. Desde então, até 30 de junho deste ano, já realizou 1.373 audiências, que resultaram em 521 acordos nas fases de conhecimento, liquidação e execução dos processos.
Vale lembrar que em 2020, o órgão ficou cinco meses sem realizar audiências devido à pandemia da Covid-19. As conciliações do Cejusc só retornaram em setembro, por meio de videoconferência. Desde que foi criado até agora, o Cejusc de Brusque tem uma média de acordo de 50,1%.
Em dois anos de atividades, o órgão já homologou R$ 13,1 milhões em acordos. Foram R$ 4,1 milhões em 2019, R$ 8,2 milhões em 2020 e R$ 744 mil até o primeiro semestre deste ano.
“R$ 13 milhões é um bom número. É um valor que circulou na economia da cidade nos últimos dois anos e que certamente impactou muitas pessoas. Mas para mim, não interessa o valor do acordo, mas a satisfação das partes em ter o problema resolvido. Para mim, tanto faz homologar um acordo de R$ 1 milhão ou mais, como já aconteceu, quanto um de R$ 500, pagos em 10 vezes de R$ 50”, destaca o juiz.
O encaminhamento dos processos trabalhistas para o Cejusc não é obrigatório. Quando se entra com uma ação trabalhista, o processo é distribuído primeiro para a 1ª ou para a 2ª vara. É feita então uma triagem e o que na avaliação dos diretores de secretaria pode resultar em acordo, é encaminhado para o Cejusc.
“Tem aqueles processos que a gente sabe que não haverá acordo. Determinadas empresas não fazem acordo por questões de estratégia empresarial, então esses nem adianta ir para o Cejusc”, explica o juiz-coordenador, Paulo Cezar Herbst.
Entre essas empresas, estão estatais como Correios, Caixa Econômica e Banco do Brasil.
De acordo com o juiz, os processos que dão entrada na 1º vara geralmente são remetidos ao Cejusc já na fase de conhecimento. Já a 2ª vara costuma encaminhar ao órgão os processos na fase de liquidação de sentença e de execução.
Há ainda a opção de as partes solicitarem o encaminhamento da ação direto para o Cejusc, o que, de acordo com o juiz, tem acontecido com cada vez mais frequência.
“Se de cada dez processos que são encaminhados ao Cejusc, conseguirmos quatro acordos sem defesa, sem nada, é 40% menos trabalho que se dá para a vara, diminuindo a taxa de congestionamento. O Cejusc é uma via rápida para acelerar o trâmite dos processos, não só para aqueles que resultarem em acordo, mas para aqueles que não resultam em acordo também”.
Assim que um processo é encaminhado ao Cejusc, é marcada a audiência, que atualmente é realizada por videoconferência. As audiências de conciliação em Brusque estão sendo marcadas para 30 dias porque as intimações são entregues via Correios.
O juiz Paulo Cezar Herbst explica que as audiências de conciliação no Cejusc tem uma metodologia diferente do que é feito nas audiências comuns.
Nas varas do trabalho, o juiz realiza a primeira audiência de conciliação e se as partes não chegam ao acordo, o magistrado pode fazer uma proposta. Já no Cejusc, o juiz atua mais como um terceiro mediador, pois não se envolve tanto na negociação entre as partes.
“Tentamos aproximar as partes, entender o caráter do conflito e aproximar na tentativa que conciliem. O papel é ser um facilitador da conciliação”.
No Cejusc, as audiências também são mais informais. O objetivo é deixar as partes mais à vontade para falar. “Se sentindo mais à vontade, a tendência é que o índice de acordo seja maior. Eu, por exemplo, evito usar a toga nas audiências do Cejusc para que as partes se sintam mais próximas”.
A estrutura da sala de audiência do Cejusc também é diferente. As mesas são redondas e o juiz não tem lugar especial, senta na mesma mesa, ao lado das partes. A sala é decorada de forma com que as pessoas se sintam em casa.
“A verdadeira justiça, muitas vezes, não está na sentença do juiz, que é baseada no entendimento do juiz sobre o caso. Muitas vezes, a sentença é justa para a parte que ganhou e injusta para quem perdeu. A justiça, para mim, é quando as partes se acertam, quando fica bom para os dois lados”.
O juiz Paulo Cezar Herbst avalia que os bons índices de acordo em Brusque se devem muito ao perfil conciliador da maioria dos advogados que atuam na região. “Nossos advogados têm uma cultura de conciliação muito boa, tanto os que representam empregados, quanto os empregadores. Todos saem ganhando”.
Advogado trabalhista do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Têxtil de Brusque (Sintrafite) há 18 anos, Márcio Silveira tem uma média de 70% dos casos atendidos pelo sindicato finalizados em acordo.
De acordo com ele, dois fatores principais influenciam para que o empregado escolha fazer um acordo em sua ação judicial: o risco de o processo não dar certo e a demora para a resolução de um processo normal.
“Às vezes, a empresa oferece um valor à vista, então ele prefere fazer o acordo porque está precisando deste dinheiro. Sempre procuro conciliar, tanto em primeiro quanto em segundo grau porque desafoga a justiça e é bom para o empregado, que recebe e bom para a empresa que não sofre uma condenação maior”.
Advogado trabalhista voltado para as empresas, Paulo Piva também destaca a importância da conciliação para as duas partes. Ele ressalta a reforma trabalhista, em vigor desde novembro de 2019, como uma facilitadora dos acordos.
“A reforma trabalhista tornou as ações trabalhistas mais justas. Não é mais só entrar com o processo, correr o risco de não ganhar e não ter sanções. Hoje, o pedido inadequado está sujeito a despesas de processo e honorários do advogado. Então os processos são mais certos, mais justos. Há uma paridade maior entre as partes”.
Em razão disso, há o alto número de acordos porque “os pedidos sendo mais justos, aquilo que efetivamente seria devido, as partes se aproximam para tomar o ajuste”, diz.
Na última década, a Justiça do Trabalho teve muitos avanços em Brusque. Além da instalação do Cejusc, em 2019, a cidade teve a instalação da 2ª vara, em 2014, que era uma reivindicação antiga da sociedade.
O juiz Paulo Cezar Herbst lembra que a 1ª Vara do Trabalho de Brusque é uma das mais antigas do estado e a instalação da 2ª vara, tantos anos depois, era uma grande necessidade.
“Muitas vezes, a chegada da Vara do Trabalho em uma cidade é vista com maus olhos pelos empresários, ainda tem algumas pessoas que pensam assim, mas já mudou muito. Hoje a maioria dos empresários vêem a Justiça do Trabalho não como inimiga, mas como auxiliar na resolução do conflito”.
O magistrado observa que a nova reflete o crescimento econômico do município. “A Justiça do Trabalho só se instala ou cresce quando há demanda. Se há demanda por mais processos, demonstra que aquela cidade é pujante, que há uma rotatividade de empregos, que é próprio da economia. E a instalação da 2ª vara em Brusque se deu porque a cidade cresceu muito”.
Outro grande avanço da Justiça do Trabalho na cidade foi a sede própria. Antes do moderno e amplo prédio, a 1ª e 2ª Varas do Trabalho funcionavam no mesmo prédio do Banco do Brasil, em uma estrutura reduzida.
Foram investidos na nova sede, que fica na avenida Monte Castelo, no Centro, quase R$ 3 milhões. O local atende todos os requisitos de acessibilidade e sustentabilidade e proporciona mais conforto aos usuários da Justiça do Trabalho.
A mudança para a nova sede aconteceu em 2020 e a inauguração oficial foi em uma cerimônia virtual, em dezembro. Devido a pandemia, a nova sede ainda não está funcionando integralmente no local, já que os servidores estão atuando remotamente e as audiências são realizadas on-line.
“O espaço ficou muito melhor e espero poder daqui a pouco tempo voltar a atuar no local para que todo mundo possa usufruir da nova instalação”, finaliza o juiz.