O chapéu que coube
“Tanto em pintura como em música e literatura, tantas vezes o que chamam de abstrato me parece apenas o figurativo de uma realidade mais delicada e mais difícil, menos visível a olho nu. ” Clarice Lispector, para o Jornal do Brasil, em 1970.
O pintor Eliseu Visconti ao “expressar” a sua “impressão”, nos acalenta com a recordação de amor fraternal e aquecedor de uma mãe. Nos delicia com as cores e borrões dos jardins abstraídos de nossos calcanhares, em um desmaiar cromático.
Silencia o barulho que nos agride na modernidade e nos devolve a companhia materna. O conforto, o toque, a tranquilidade. A família, o tempo…
A relação entre os olhos que se veem, que se permitem olhar. E as flores e verdes que escorrem sobre a cena, com a mesma naturalidade em que a mulher burguesa, dona do lar, nina a criança. Em épocas em que a pose feita ainda refletia o cotidiano, singelamente.
(Ao ver esta obra hoje, eu diria: embalando bons sonhos.)
Tomie Ohtake sobretudo, seria ao mesmo tempo: o tudo e o nada, a partida e a chegada, a presença e a ausência de Eliseu Visconti.
O que talvez dificulte a nossa compreensão a respeito do abstracionismo, seja: o olhar com os mesmos “bons olhos” e nos permitir digerir que a arte abstrata nos mostra pouco, muito embora, nos dê a essência, de todo o resto. Nos daria um bom exemplo, o mestre Gandhi ao dizer “o amor é a força mais abstrata, e também a mais potente que há no mundo”.
O conforto embalado pelo impressionismo nos recheia de impressões, estas, que de tão belas e sutis, nos apreendem na superficialidade de todos os sonhos. Que sonhos apenas são!
Méroli Habitzreuter – escritora e ativista cultural