O diálogo impossível
Sócrates e Platão, os iniciadores da filosofia nos moldes em que ela se notabilizou e se tornou “clássica”, foram instigados ao filosofar por conta da retórica relativista dos chamados “sofistas”, que preparavam os jovens atenienses para a vida política. Uma característica do discurso sofístico, como ele nos foi repassado por Platão e depois por Aristóteles, é o seu descompromisso com a verdade. Na sofística, a relação entre linguagem e realidade é quebrada, de modo que o discurso humano é capaz de sustentar qualquer tese. Na retórica dos sofistas, o que interessa é o resultado prático que a ação política, que usa o discurso apenas como ferramenta, vai atingir.
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No período renascentista, essa ideia renasce com Nicolau Maquiavel, que cria um ser imaginário, um tal “príncipe” sem escrúpulos, que se estabeleceria pela força e pela persuasão, igualmente sem qualquer compromisso com a verdade e com a ética.
No mundo contemporâneo, a partir do século XIX, essas ideias voltaram a ganhar força.
Friedrich Nietzsche se propôs a solapar as bases de toda a cultura ocidental, estabelecida pelos gregos a partir de Sócrates, e pela moral judaico-cristã. Karl Marx afirmava que o seu papel e o dos seus seguidores não era mais interpretar o mundo, tentando entendê-lo, mas alterá-lo pela ação revolucionária.
Aliem isso a pensadores que se propõem a desconstruir a cultura, reinterpretando tudo de várias maneiras, de modo que ninguém nunca saiba o real significado de nada. Voltamos à velha sofística. A verdade não existe. Tudo é relativo.
Com essa mentalidade, pode-se defender qualquer coisa, mesmo que seja contra a lógica, já que mesmo os princípios fundamentais do pensamento, como o da identidade (uma coisa deve ser sempre idêntica a si mesma) e de não contradição (uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo, sob as mesmas circunstâncias) são questionados.
Essa é a cara do “debate” cultural contemporâneo. Não há mais diálogo algum entre posições divergentes, porque é impossível dialogar sem que as partes compartilhem de algum critério comum.
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Se dois católicos discutem, podem decidir a questão pelo uso de documentos da Igreja ou da palavra do papa, já que ambos os aceitam. Se for um católico e um luterano, podem usar a Bíblia. Se for um cristão e um hindu, podem apelar à crença na divindade e na vida após a morte. Se for um cristão e um ateu, podem usar os princípios da razão e do bom senso. Mas quando a própria razão é desprezada, restam apenas ações e discursos isolados em seus respectivos guetos, visando somente aos resultados práticos que interessam aos seus defensores.
Só assim é possível sustentar que é preciso soltar um presidiário, condenado em segundo grau, contra uma lei que ele mesmo assinou, porque ele é candidato a presidente. Ou que aborto é pauta legítima de direitos humanos, ou que não temos nenhuma identidade sexual, e por aí vai. Bem-vindos ao hospício. Este que vos escreve é Napoleão Bonaparte.