O ponto de inflexão
Apesar da vida frenética que levo, sou uma pessoa naturalmente preguiçosa. Isso parece contraditório, mas é resultado de um processo que começou quando decidi não deixar que a preguiça me dominasse. Lembro-me exatamente desse dia. Eu era adolescente, estava no seminário e era um dia de árduo trabalho com enxadas e pás, que eu detestava. Mas, naquele dia, tomei a decisão de não murmurar nem fazer corpo mole. Então, engatei uma quinta e só sosseguei quando já estava tudo terminado, o que me deu uma satisfação maior do que a que teria se pudesse ter escapado da responsabilidade. Percebi, então, que poderia direcionar minha ação por uma decisão da vontade, independente de gosto ou tendência natural. Esse dia foi um ponto de inflexão na minha vida, o que, na linguagem matemática, representa o ponto em que uma curva muda de direção num gráfico.
Mas a preguiça não me abandonou por conta disso. A cada dia tive que dizer não a ela para não deixar de fazer o que deveria, ou para não fazer com desleixo e rapidez o que poderia e deveria ser feito com cuidado e capricho. Se não tivesse tomado aquela decisão, provavelmente teria perdido muito tempo empurrando responsabilidades com a barriga e fazendo escolhas em nome do menor esforço, e não teria conseguido fazer tudo o que fiz. Provavelmente levaria uma vida mais tranquila, mas certamente mais medíocre.
Como diz o ditado, é mais fácil mover uma montanha que mudar um hábito. Como os hábitos são formados pela repetição de atos, quanto mais cedo tomarmos a decisão de mudá-los, menos esforço precisará ser despendido na tarefa. Aquelas manias que carregamos durante toda a vida dificilmente serão mudadas.
A cada semestre, tenho a oportunidade de encontrar pessoas que começam um curso superior, como um novo projeto de vida. Procuro insistir que o que fará a diferença nesse percurso é a atitude intelectual que terão diante dos conteúdos e tarefas. Para tanto, hábitos dispersivos adquiridos durante a vida escolar devem ser modificados. Os que estão a meio caminho, ou já concluíram o desafio podem avaliar o resultado, e medir a qualidade do tempo pela decisão que tomaram de vencer a si mesmos e evoluir, ou de burlar o processo em nome da facilidade e do prazer imediato. Quem enganou a si mesmo pela lei do menor esforço certamente traz um gosto amargo de tempo perdido, de qualidade desperdiçada. E isso vale para todos os nossos projetos e atividades.
A curva da nossa vida pode ter seu ponto de inflexão a qualquer momento. Só depende de uma decisão da nossa parte. Como diz a parábola, ainda é tempo de cavar a terra em volta da figueira, adubar e cuidar para que ela produza frutos, antes que seja cortada. E sempre há setores da nossa vida carentes de melhoria. Então, que a nossa curva esteja sempre na ascendente.