Pe. Adilson José Colombi

Professor e doutor em Filosofia - [email protected]

A família Aracuã

Pe. Adilson José Colombi

Professor e doutor em Filosofia - [email protected]

A família Aracuã

Pe. Adilson José Colombi

No ano passado, 2019, apareceu em o muro e nas árvores próximas à horta um suposto casal de Aracuã ou Araquã, um dos aninais da Mata Atlântica. Escrevo suposto casal, pois não tínhamos certeza de ser um casal. Mas, com o passar dos dias a dúvida foi satisfeita com uma confirmação ao vivo. Aparece o, agora, casal, todo garboso e faceiro com seu rebento bem miudinho. Um “pintinho” todo tímido, que não desgrudava da mãe. E ela sempre atenta e cheia de cuidados, catando algo para oferecer ao descendente. E, assim, foram passando os dias, até o pequeno criar um corpo bastante robusto. Tornou-se esperto, mas continua sempre perto de seus pais.

No início, o casal Araquã era desconfiado e sempre alerta ao menor ruído. Retiravam-se para as árvores próximas do muro da horta, quando detectavam algo que os incomodava e tirava sua tranquilidade. Com o passar dos dias, foram criando coragem e até com a presença de pessoas. Hoje, já são bem mais mansos, calmos, não se atemorizam com a presença de pessoas que, certamente, já conseguem identificar de alguma forma. Perderam aquela cautela de guarda que tinham ao iniciar as suas incursões pelos canteiros de nossa horta.

Pouco a pouco foram se tornando de simpáticos e atraentes, um pequeno problema. Começaram a deixar sua marca. E, cada vez mais, deixando as consequências de suas andanças pelos canteiros de hortaliças que cultivamos para uso próprio. Aprenderam a se servir de quase tudo o que é plantado nos canteiros. Apreciam, porém, com mais avidez as folhas de couve. E, como são agora três e dão a impressão que estão sempre com fome, vão devastando as folhas de couve, deixando, apenas, o caule e os talos das folhas. Dessa maneira, vão desfigurando o canteiro. Não contentes, com a couve, passeiam por outros canteiros e vão saboreando também as mudas tenras de repolho e alface recém-plantados. E, o agora o então “pintinho”, hoje, robusto jovem vai auxiliando e bem no estrago. A família Araquã tem o hábito, quase diário, de tomar seu banho de barro arenoso da horta, em buracos que já fizeram. Tomaram posse do pedaço. São os “invasores” de terra alheia. “Posseiros”. Na verdade, são vítimas da vida urbana.

Aquilo que, no início, era bonito, simpático, atraente, cativante, relaxante, vistoso, com o tempo vai mudando de figura. Será que a realidade (família Araquã) que mudou ou foi nosso modo de ver a realidade que mudou? Na verdade, a família Aracuã, nunca deixou de ser aracuã, ave da Mata Atlântica, rústica que deixou seu habitat natural (mata) e foi impelida a viver e buscar alimento em um ambiente que não é mais o seu original. Foi expulsa de suas terras. Tornou-se uma “família sem-terra”. Começou a fazer parte do “MST” dos que perderam sua terra e casa: a Mata Atlântica. E cada vez mais vão surgindo candidatos a viver tal situação.

Teve que “armar sua barraca”, em uma horta de casa paroquial. Teve que se adaptar ao ambiente urbano e, nele, buscar o alimento que pode alcançar com suas andanças, pela redondeza. Quando o encontra com relativa abundância, não desperdiça a oportunidade. Isso faz, mesmo que tenha que mudar seus hábitos alimentares como, de fato, teve que fazer. De frutos da Mata Atlântica, teve que se habituar com outros alimentos, para a família Araquã, exóticos (como as folhas de couve, repolho, alface…). Foram e são criativos, a fim de sobreviver em ambiente que não é mais o seu nativo. A vida é dura para todos os viventes. E, muitas vezes, pensamos que só nós, humanos, temos que viver essa dureza.

A família Araquã faz refletir, como o Papa Francisco não cansa de alertar: o que estamos fazendo, com nossa presença, em a nossa Casa Comum, o Planeta Terra.

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