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Como ser ético, hoje?

Para situar a pergunta que serve de título desta reflexão é preciso apreendê-la no quadro mais amplo da vida sociocultural da Sociedade e da Cultura contemporâneas. Hoje, nós vivermos em uma sociedade e cultura diversas do período moderno, o anterior. Portanto, num mundo que se convencionou denominá-lo de Pós-Modernidade. O filósofo polonês Zygmunt Bauman (1925-2017) […]

Para situar a pergunta que serve de título desta reflexão é preciso apreendê-la no quadro mais amplo da vida sociocultural da Sociedade e da Cultura contemporâneas. Hoje, nós vivermos em uma sociedade e cultura diversas do período moderno, o anterior. Portanto, num mundo que se convencionou denominá-lo de Pós-Modernidade.

O filósofo polonês Zygmunt Bauman (1925-2017) descreveu esta realidade sociocultural nova e a caracterizou, como sendo uma “sociedade líquida” ou “ cultura líquida”. Segundo ele, a denominou desta forma, porque se perdeu o “ponto de referência” para nossas opções, escolhas, ações. Vivemos num mundo do imediato, do provisório, passageiro. Tudo escorre como a água por meio de nossos dedos. Tudo é conduzido pelo individual, pelo singular, pelo particular. Tudo é regido pelo relativismo. Nada além do transitório, do efêmero. Nada de absoluto.

Sem referência ao Infinito, ao Absoluto, à Transcendência, a Ética permanece, pura e simplesmente, no horizonte humano. O ser humano fecha-se, no seu âmbito individual e passa a ser a “medida de todas as coisas”, como já dizia e afirmava o filósofo grego Protágoras (481-411 a. C.). Na maior parte das decisões e escolhas, prevalece a escala individual dos valores. Quase só se pensa no “eu”, raramente o “nós”, o comunitário, o social, no bem comum.

Nesse ambiente sociocultural, com frequência, escutam-se apelos, clamores enérgicos que é necessário recorrer à Ética. Ela se tornou um clamor inevitável para quem quer ou “ficar bem na foto”, sobretudo, em tempos de campanha eleitoral. Faz parte de quase todos os discursos políticos, institucionais ou econômicos. Até religiosos. Mas, é importante entender que esse entusiasmo pela ética não é necessariamente neutro. Na verdade, para muitos, a palavra “ética” é utilizada como um slogan, nada mais do que um discurso para tentar impressionar os ouvintes. Pelo estilo de vida, sobretudo na política, percebe-se que não se trata de um convite à lucidez, a um verdadeiro engajamento ético, mas, apenas, para marcar presença no “espaço político”.

Todavia, tentemos considerar dois aspectos desse apelo constante ao termo “ética”. De um lado, podemos nos alegrar ao constatar que a busca se tornou inevitável, no ambiente sociocultural que vivermos. De fato, com raras exceções todos falam da necessidade de instaurar um ambiente que prestigie a atitude ética. Por outro lado, porém, não há ainda sinais significativos de uma autêntica transformação na postura ética. Portanto um efetivo engajamento no compromisso de retomar um caminho ético que supere o puramente individual (o “eu”) e se volte para o plural, o comunitário (o “nós”).

Há, porém, significativa reação de pensadores e de pessoas engajadas nos ambientes sociais que fazem um trabalho de conscientização ética que, aos poucos está trazendo a esperança de dias melhores, com um comportamento ético, fundado em valores que dão consistência a existência humana e ao comportamento humano. Contudo, essa postura ética exige um empenho nas ações humanas, escudado na coerência e na autenticidade, fundadas em valores humanos e sobre-humanos.

Para isso acontecer, porém, há um trabalho longo a fazer: recompor a Filosofia no seu verdadeiro papel. O de ser a mestra da vida, que possa sedimentar a vida humana num solo firme, com um fundamento que sirva como ponto de referência para o pensar e o agir humanos, que a Modernidade lhe subtraiu. Uma tarefa árdua, pois tem que recompor, restaurar um terreno escorregadio, sem consistência, movediço, bem caracterizado por Bauman de “terreno líquido”.