Para subir de nível
A imensa maioria das pessoas vive no nível 1 do jogo da vida,
buscando usufruir o máximo de satisfação com o mínimo de esforço e incômodo.
Essa é, basicamente, a configuração em que vivem as outras espécies animais. As
regras, nesse nível, são dadas pela sensibilidade do indivíduo. Ele procura o
que lhe dá satisfação imediata e se afasta de tudo que requeira um esforço
adicional. Um item da vida que normalmente é o primeiro a entrar nesse esquema é
a alimentação. A sensibilidade do paladar costuma ser inimiga da saúde do
corpo. Quem é regido pela sensação comerá apenas o que o sentido do paladar lhe
indicar como agradável. Às vezes, nem com um diagnóstico médico sombrio a
pessoa se convence a lutar contra a boca, que insiste em tomar as decisões que
deveriam ser tomadas pelo cérebro. O mesmo vale para as atividades físicas. A
preguiça corporal é outro inimigo mortal da saúde física, mental e espiritual,
mas, para colocar o corpo em movimento, a terrível casca da sensibilidade
viciada exige um esforço que as pessoas do nível 1 dificilmente conseguem
empreender. A vida intelectual sofre com os desmandos da preguiça mental, pois
todo aprendizado que se preze exige uma razoável dose de disciplina, o que
explica, em parte, o número absurdo de analfabetos funcionais no nosso país.
Para acessar o nível 2 da existência é preciso romper essa
casca resistente dos próprios gostos e manias, lutar contra as tendências
inferiores do corpo, impor-se uma disciplina que implica dizer não a inúmeras
satisfações momentâneas em nome de uma realização mais duradoura. Todos os que
se deram ao esforço de enfrentar seu maior inimigo – aquele que mora dentro de
si e impregna sua sensibilidade – experimentaram a enorme satisfação de poder
acessar o segundo nível e ver que, daqui de cima, abrem-se muitas outras
possibilidades. Quem disciplinou o corpo, com alimentação correta e exercícios,
pode agora usufruir dos benefícios de uma saúde melhor e de tudo o que isso lhe
oferece, para além do sabor do chips com coca cola. Quem enfrentou a chatice e
a dificuldade das primeiras letras – e permaneceu firme no exercício da leitura
– acessa um universo de possibilidades intelectuais. Mas parece que todo mundo
se acomodou na calçada da vida e não quer adentrar os belos aposentos do
interior da casa, porque há uma escada um pouco íngreme para subir. A Educação
precisa se dar conta de que esse é o seu principal desafio. Nunca evoluiremos
se não rompermos com essa crônica preguiça e falta de perspectiva.