Patrimônio histórico de Brusque é destruído

Casarão Strecker é mais um edifício histórico demolido na cidade; políticas públicas para preservar a memória do município ainda engatinham

Patrimônio histórico de Brusque é destruído

Casarão Strecker é mais um edifício histórico demolido na cidade; políticas públicas para preservar a memória do município ainda engatinham

A paisagem da esquina da rua Carlos Gracher com a avenida Otto Renaux não é mais a mesma. Desde sábado, 30, o casarão construído pela família Strecker não existe mais.

O local, que é de propriedade da WK Administradora de Bens desde fevereiro, foi demolido para dar lugar à outra edificação. O casarão da torre arredondada agora faz parte apenas da memória dos brusquenses.

A demolição pegou todos de surpresa. Não apenas a população, mas também a prefeitura, que em julho já havia negado o pedido de demolição da construção feito pelo atual proprietário. “Infelizmente, tivemos a nossa ordem de indeferimento desobedecida”, diz o diretor do Instituto Brusquense de Planejamento (Ibplan), Laureci Serpa Júnior.

Em Brusque, todos os pedidos de demolição de edificações precisam passar pelo órgão. É o Ibplan o responsável por analisar e conceder, ou não, a autorização para a destruição. Quando o órgão identifica que o imóvel a ser destruído consta no catálogo do patrimônio histórico do município, finalizado em 2011, entra em contato com o Conselho do Patrimônio Histórico, que faz a sua análise e dá o parecer final. “Temos essa parceria. O parecer da demolição não cabe ao Ibplan, mas ao conselho. Eles se manifestaram contra a demolição, e nós indeferimos o pedido da empresa”, afirma.

Na manhã dessa segunda-feira, 1º, o proprietário já foi multado em R$ 28.234,40. “O proprietário já reconheceu a multa. Multamos por ser uma obra sem autorização e pelo descumprimento da nossa determinação”, informa Júnior.
Além do proprietário do local, a empresa de terraplanagem que executou o serviço também deve ser multada pela prefeitura, em aproximadamente R$ 7 mil. “Estamos esperando o posicionamento do proprietário para que ele nos informe qual a empresa de terraplanagem que executou o serviço e também vamos multá-los, por executarem um serviço sem a autorização do Ibplan”.

Agora, o proprietário do antigo Casarão Strecker tem até 10 dias para se manifestar. “Será emitida a multa e o não pagamento dela coíbe qualquer manifestação da empresa perante o Ibplan. Se a multa não for paga, poderemos segurar qualquer outra atividade que a empresa queira realizar dentro de Brusque”, explica. Procurado pela reportagem, o atual proprietário do terreno, Waldir Furbringer, não foi localizado.

Para a superintendente da Fundação Cultural de Brusque, Eudez Pavesi, a construção tinha uma importância histórica para a cidade. De acordo com ela, o Conselho do Patrimônio Histórico apresentou algumas ideias ao proprietário para que ele desistisse da demolição, mas não tiveram sucesso. “Sabíamos da intenção do proprietário. Fizemos contato com ele, fomos até a empresa, oferecemos os incentivos do Programa Preservar, que aprovamos em 2013, isenção de IPTU e outros impostos, alvarás, a possibilidade do direito construtivo, em que ele poderia ganhar direito de construir em outra área de sua propriedade, preservando o casarão, ele não aceitou e demos o parecer negativo à demolição”, explica.

Apesar da perda, Eudez reconhece o direito do proprietário. “Vislumbrávamos um ponto de venda naquela arquitetura, valorizaria qualquer negócio, mas também observamos o direito de propriedade do cidadão. Infelizmente, ele se sentiu no direito de demolir. Agora, vai ser penalizado pelo Ibplan, mas sabemos que isso não resolve. A casa já foi demolida, essa é uma questão muito difícil de resolver”, afirma.

Ela destaca que, agora, o conselho está pensando em penalidades em casos de desrespeito ao patrimônio histórico do município. “Estamos estudando uma forma de autuação em casos como este. Temos essa proposta de multa por ser um patrimônio, mas ainda não sabemos como fazer isso. Primeiro, nos preocupamos em buscar a sensibilização através do incentivo porque sabemos que somente a multa, dependendo do poder aquisitivo do proprietário, não vai bastar”.

Eudez cita a perda da identidade das famílias herdeiras dessas construções históricas como fatores para as sucessivas demolições. “Nas vistorias que fazemos, percebemos que hoje quem ocupa essas construções são a terceira ou quarta geração da família, que não tem tão presente a história que a família teve com essa casa e não entendem como essa construção se identifica com o coletivo. Se a própria família não vê isso, como que nós, enquanto poder público, temos que fazer com que a construção seja mantida?”, questiona.

Perda de identidade

O historiador Paulo Vendelino Kons lamenta a destruição de mais uma construção histórica de Brusque. Para ele, é preciso que o poder público seja mais efetivo nas ações para que garantam a preservação dessas construções. “Essa não é a primeira. Aconteceu, está acontecendo e vai acontecer novamente. O poder de polícia do poder público municipal tem que fazer algo. Não adianta ficar lamentando, é preciso passar das palavras para a ação”.

Kons afirma que a demolição desses imóveis reflete em uma perda de identidade. “O respeito pelo passado e a responsabilidade pelo futuro dão à vida a direção certa. Se não respeitarmos o passado, não temos direção certa, e nem caminho a seguir. É muito grave, sério, que isso esteja acontecendo. Há de se ter politicas públicas que garantam o respeito à história de Brusque, passivamente se vem assistindo isso ao longo dos anos, e nada se fez”.

Para ele, é fundamental a convivência do passado com o presente. “Sei que existe uma expectativa econômica de retorno desses espaços, mas nós temos que ter a competência de fazer essa mediação, conseguir manter esse patrimônio e não ver como um ônus. Ele tem várias finalidades, inclusive agregar valor. Uma coisa é ter nesse espaço uma atividade do que ter um espaço qualquer construído”.

Kons destaca ainda a responsabilidade dos herdeiros de construções históricas como o Casarão Strecker. “É claro que o ônus de manter essas construções não deve cair apenas aos proprietários, eles devem ter uma série de incentivos, mas também se deve ter claro, que para se fazerem merecedores do legado que receberam tem que minimamente conservar e dignificar a história de seus ancestrais”.

>> Confira a matéria completa na edição desta terça-feira, 2, do jornal impresso

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