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Pedestal contemporâneo

O mundo contemporâneo coloca, no pedestal dos grandes homens e mulheres, aqueles ou aquelas que conseguiram adquirir grandes riquezas materiais. Normalmente, também têm grande poder e gozam de grande estima, glória e até vedetismo. Desta forma, já desde a modernidade continua-se a privilegiar a quantidade em detrimento da qualidade. Em outras palavras, o “ter mais” […]

O mundo contemporâneo coloca, no pedestal dos grandes homens e mulheres, aqueles ou aquelas que conseguiram adquirir grandes riquezas materiais. Normalmente, também têm grande poder e gozam de grande estima, glória e até vedetismo. Desta forma, já desde a modernidade continua-se a privilegiar a quantidade em detrimento da qualidade. Em outras palavras, o “ter mais” para poder “aparecer mais” é apreciado e valorizado bem mais do que o “ser mais”. É claro que o ter mais está relacionado aos bens materiais. Não se trata do ter mais participação na vida do povo, na vida sociocultural da Nação pela solidariedade, pela busca da justiça, da fraternidade, pela luta para que haja menos desigualdades, pela construção de ambientes mais seguros…

De fato, há em todo o ser humano o desejo, o impulso interior de crescer, de se desenvolver. Muitos, porém, enganam-se redondamente quanto ao rumo e conteúdo desse crescimento, além dos meios indispensáveis que precisam ser adotados. É, aqui, que muitos pensam que basta fazer crescer o montante de bens materiais, colocá-los em forma de um pódio, para depois pôr-se sobre eles, como se fosse um pedestal, para crescer mais, ser grande perante os demais. É como aquela mulher baixinha, mas que compra e calça um sapado de salto alto para aparecer maior, mais alta, mesmo sabendo que o salto alto não acrescenta nada a sua pessoa. Todavia, dá-lhe a satisfação de sentir-se alta e de aparecer mais, comparando-se ou competindo com os demais.

A sociedade e cultura contemporâneas são cúmplices desse modo de pensar e de comportar-se. Se o ser humano contemporâneo não for educado para a reflexão, para o saber “tomar distância” da realidade circunstante, é presa fácil dessa mentalidade consumista e valorizante do “ter” e do “aparecer”. Será sempre mais difícil de convencê-lo que a grandeza, o poder e a verdadeira satisfação de vida não residem no “ter”, no “possuir”, no “aparecer” e sim no “ser”, no “ser-mais” para poder “servir” melhor aos seus semelhantes e a Deus.

Não importa o tamanho do pedestal ou do salto alto. O que importa é o “ser” da pessoa que tem e que desfruta desse “ter”. Não é o montante de “coisas” que satisfaz o interior do ser humano. Mas, sua sede de infinito, de ir além, de superar seus próprios limites. De fato, o ser humano foi criado para superar-se, para ultrapassar-se sempre. Não pode contentar-se com o que já é. É um eterno insatisfeito. Não basta, porém, preencher essa insatisfação com bens materiais. Momentaneamente, até podem dar alguma satisfação. A longo prazo, porém, a insatisfação volta com carga maior e com mais exigências, com consequências imprevisíveis. Tudo isso porque os bens materiais não saciam a fome e sede de infinito que está no íntimo do mais íntimo do ser humano.

Quanto mais necessidade de bens materiais você tiver e precisa, para se sentir feliz, certamente crescerão suas probabilidades de se sentir insatisfeito e assim vai se estendendo sua infelicidade. Por isso, de tanto almejar os bens materiais, de lutar para obtê-los e, deles, se servir e usufruir o ser humano vai perdendo a capacidade de imaginar que possa existir outra maneira de viver sua vida e com mais conteúdo do que essa.

Reside, aí, talvez o grande drama dessa situação: o embotamento da imaginação do obcecado pela ambição do “ter” que não lhe passa mais pela mente a possibilidade de outro modo de se viver e construir sua existência. É a pobreza humana na riqueza material. É o pobre pedestal apresentado ao ser humano pela cultura atual.