Todo mundo sabe o que é o Pokémon Go: um joguinho para smartphone que, assim que ficou disponível no Brasil, virou febre, fez muita gente comprar celular novo, foi o responsável por alguns roubos, atropelamentos e topadas na calçada. Causou também um preconceito imediato. Entre tantas modinhas que valem tanto quanto pesam, ou seja, muito pouco, justo essa foi escolhida para uma rejeição quase coletiva, como se caçar bichinho virtual na rua (ok, estou simplificando muito a coisa!) seja pior do que o pau de selfie das últimas férias ou ter passado 2015 colorindo livro. Mão na consciência, gente!
O pobre Pokémon Go merece uma defesa numerada, específica para pessoas adultas com espírito crítico.
1 – A gente já começa pelo motivo mais sério que, sozinho, deveria convencer todo mundo a dar uma chance ao jogo: ele estimula seus jogadores a sair de casa e caminhar. Ao contrário da maioria dos games, não dá para fazer praticamente nada nele dentro de casa. Caçar pokémons, reabastecer sua mochila virtual com itens do jogo, chocar ovos. Sim, se para as outras ações nada impede que você subverta as coisas e use um veículo sedentário para procurar pokéstops ou achar bichinhos, para fazer com que os ovos eclodam não tem outra solução: é preciso andar, a pé ou, no máximo, de bicicleta. O jogo percebe a sua velocidade, não tem como enganá-lo! Você precisa andar 2, 5 ou 20 quilômetros para ter pokémons nascidos no seu jogo.
2 – Caso você ache que andar é meio tedioso, com o Pokémon Go você vai começar a querer andar mais uma quadra, só mais uma quadra… porque lá adiante tem um pokéstop, um local em que você pode conseguir itens gratuitos. Nada melhor do que andar com um objetivo, nem que o objetivo seja uma certa ganância por pokébolas.
3 – Caso você tenha chegado à vida adulta recentemente, nem é necessário dizer que o jogo vai alimentar uma deliciosa nostalgia da sua infância regada a Pokémons na TV. Aprenda, isso é uma das melhores coisas da vida. É mãe ou pai jovem? Aproveite e passe suas referências para a próxima geração.
4 – Por falar em adultos e crianças… jogar Pokémon Go vai abrir o leque de assuntos para conversar com seus filhos, netos, sobrinhos, afilhados… mesmo que a meninada ache você uma pessoa meio esquisita por, na sua idade, andar pela rua jogando no celular. Só comece já, antes que eles olhem para você com cara de “isso é tão last week” quando você tentar falar com eles sobre o jogo.
5 – Pensando bem, é ótimo (temos aqui outra razão importante!) quebrar os preconceitos das crianças e adolescentes. Porque eles também têm preconceitos… e não são poucos. Mostre que “velhos” podem invadir o território tecnológico deles. E que o mundo não foi criado ontem.
6 – Movimente seus neurônios! Aprenda novas regras, truques no celular, termos específicos, estratégias de jogo. Use e abuse do Google e pesquise tudo o que você achar complicado no jogo. Tudo isso faz maravilhas pela saúde!
7 – Você sempre achou interessante colecionar coisas? Pois saiba que uma parte do Pokémon Go trata justamente disso, de colecionar bichinhos. O “álbum de figurinhas” do jogo se chama Pokédex e é onde você registra cada Pokémon diferente que você conseguir capturar. Prepare seus tênis, já que são mais de 130 bichinhos diferentes – por enquanto.
8 – Quer alimentar ainda mais os neurônios? Procure se aprofundar no conhecimento dos pokémons, seus tipos, habilidades, como e para que evoluem. É toda uma mitologia pokemística para ocupar seu tempo livre.
9 – Caso você seja uma pessoa competitiva, prepare-se para adentrar aquela parte do jogo que eu pretendo não chegar nem perto: batalhas, controle de ginásios, treinamento de Pokémons. Ou seja, você pode “cuidar de bichinhos virtuais” ou jogar um jogo “de guerra”. Você decide, de acordo com seu estilo gamer.
10 – Mudando de assunto… Pokémon Go coloca você face a face com sua própria personalidade consumista. Você pode exercitar seu autocontrole e resistir à tentação de gastar dinheiro de verdade com o jogo. Pode otimizar os itens gratuitos e…
11 – … exercitar a paciência! Se você não consegue subir de nível no jogo hoje, porque ficou sem bolinhas para capturar bichinhos, lembre-se de que amanhã é outro dia. Um dia em que você pode passar por um pokéstop e seguir jogando, sem despesas.
12 – Ou pode mergulhar de vez no capitalismo, compreendendo que a empresa que criou o jogo tem que lucrar com ele… e investir uns trocos nele. Você escolhe o tipo de jogador que quer ser. Só se lembre de que está investindo dinheiro em diversão e que diversão acaba. Não se arrependa se o jogo for encerrado e seu investimento virar apenas lembrança. Ele foi feito para isso.
13 – Lembre-se: você é uma pessoa adulta. É bom ficar face a face com a frustração. Quem sabe assim você não encara melhor a próxima situação frustrante da vida real.
14 – Reforce a sua capacidade de fazer boas escolhas! Ter atitudes abrangentes ou seletivas? Pensar no futuro ou viver o momento? Pegar um bichinho de baixo CP ou guardar suas bolas para algum que realmente valha a pena? Lições de vida!
15 – O jogo serve para ajudar a aprender a separar o que é real e o que é virtual – mesmo com o uso de mapas reais e da realidade aumentada. Porque não dá para ficar mergulhado no jogo o tempo todo. Até porque a bateria acaba.
16 – Finalmente você vai aprender, na prática, o que é realidade aumentada!
17 – Sua sensibilidade para as sacanagens do mundo moderno será aguçada, quando perceber que atualizações do aplicativo são feitas não só para corrigir bugs e melhorar a jogabilidade… mas também para dificultar a sua vida o suficiente para que você tenha que lidar com a tentação de gastar dinheiro com o jogo. Volte para o item 10!
18 – Você aprende que tem o direito de usar um pouquinho do seu tempo com uma “brincadeira de criança”. Porque não tem nada melhor do que manter ou redescobrir as vantagens de se concentrar em algo que tira você totalmente das preocupações e ocupações da sua rotina. Infantilize-se, sim! Desapegue das opiniões dos outros e seja feliz!
Claudia Bia – jornalista e péssima jogadora de Pókemon Go