Policial civil de Guabiruba é investigado por cobrar comissão em venda de carga de fios ilícita
Caso foi apurado pela Polícia Civil e também está sendo investigado em inquérito do Ministério Público
Caso foi apurado pela Polícia Civil e também está sendo investigado em inquérito do Ministério Público
O policial civil Ariovaldo Dias de Sousa, 42 anos, de Guabiruba, é investigado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público (MP-SC) pela prática do crime de corrupção passiva.
Ele foi denunciado por um empresário do ramo têxtil da cidade por supostamente cobrar R$ 10 mil de comissão sobre a venda de uma carga de fios de origem ilícita.
De acordo com o inquérito da Polícia Civil, conduzido pelo delegado Alex Bonfim Reis, o caso iniciou em 2021, logo após a investigação sobre cargas furtadas e roubadas em Guabiruba, que resultou na recuperação de toneladas de fios e prisões, incluindo a do empresário Jean Carlos Gums.
Com a divulgação do caso pela imprensa, um empresário do ramo têxtil da cidade suspeitou da procedência das mais de 320 caixas de fio que Jean Carlos Gums havia deixado em sua empresa dias antes.
Por precaução, ele entrou em contato com a delegacia de Guabiruba e foi atendido pelo policial Ariovaldo. Ao receber a denúncia, o policial foi até a empresa e constatou que a carga de fios era de procedência ilegal. A maior parte da carga estava encaixotada e uma pequena fração já havia sido colocada nos teares.
Segundo a denúncia, o policial disse ao empresário que as caixas seriam apreendidas, mas que ele poderia ficar com os fios já colocados nos teares e vendê-los.
Após confirmar a procedência ilegal da carga, o policial Ariovaldo entrou em contato com o delegado Fernando Farias, responsável pela investigação, e informou sobre a localização do material receptado, mas não informou a ele sobre os rolos que já estavam nos teares. Ou seja, para o delegado, toda a carga ilegal havia sido apreendida, o que é o procedimento correto.
No entanto, apenas as caixas com os fios foram apreendidas. O delegado destaca, no inquérito, que o procedimento comum é apreender todo o produto do crime, inclusive o que está em linha de produção ou já transformado em tecido.
De acordo com o inquérito, após a retirada da carga e sem ter mais relação com a investigação, o policial Ariovaldo voltou a procurar o empresário, com a intenção de cobrar parte dos valores que seriam obtidos com a venda dos fios propositalmente deixados nos teares.
Em depoimento, o empresário afirmou que o policial solicitou R$ 10 mil como comissão pela venda dos fios. De acordo com o denunciante, essa quantia seria muito superior ao valor comercial deixado nos teares, estimado, segundo ele, entre R$ 6 mil e R$ 7 mil.
Para provar as acusações, o empresário apresentou à polícia todas as mensagens trocadas com o policial Ariovaldo via WhatsApp sobre o assunto.
De acordo com o inquérito da Polícia Civil, pelo conteúdo das mensagens de áudio e texto, “ficou evidente que Ariovaldo contatou o empresário por dias seguidos, primeiro para tratar das investigações e depois para impor uma parceria comercial e solicitar valores indevidos”.
Durante a troca de mensagens, o policial chega a indicar um empresário interessado em comprar a carga. Ele também se oferece para ir junto receber o dinheiro de um possível comprador e, ainda, se dispõe a cobrar um eventual devedor.
Ariovaldo exige que seu pagamento seja entregue pessoalmente e em espécie, usando, ainda, um tom ameaçador.
O inquérito conclui que o policial só desistiu da quantia em razão da recusa do empresário em fazer o pagamento em mãos, exigindo que fosse feito via depósito bancário.
Ainda segundo o inquérito, a versão do empresário ganha força pelas imagens das câmeras de monitoramento da empresa, que registram a presença do policial, pelo menos, três vezes.
As imagens mostram que nos dias 12 e 13 de novembro de 2021 o policial usou a viatura descaracterizada da Polícia Civil para ir até a empresa. Já no dia 21 de outubro de 2021, foi até o local com uma das viaturas.
A investigação destaca que nestas datas as caixas de fios já haviam sido apreendidas e Ariovaldo não tinha mais motivos para procurar o empresário ou alguma relação com a investigação.
Durante o inquérito policial, o empresário teve o celular apreendido e encaminhado à Polícia Científica, antigo Instituto Geral de Perícias (IGP), para a extração de dados e perícia nas mensagens trocadas via WhatsApp.
De acordo com o laudo pericial, as mensagens citadas no relatório coincidem com as extraídas pela perícia.
Durante a investigação, o delegado Alex Bonfim Reis também representou por mandados de busca e apreensão na casa do policial, o acesso e extração de dados do telefone celular, que foram deferidos pela Justiça.
As informações extraídas do celular do policial corresponderam integralmente às recuperadas no celular do empresário.
Em depoimento na delegacia de Brusque, o policial Ariovaldo negou veementemente a prática do crime de corrupção passiva ou qualquer conduta desabonadora.
Ele declarou que não sabia que os fios deixados nos teares faziam parte da carga receptada por Jean Carlos Gums. De acordo com ele, o empresário não havia repassado esta informação na denúncia, por isso, não o orientou a retirar o material.
Durante o depoimento, o policial disse que após a remoção da carga, o empresário pediu sua ajuda para negociar algumas malhas e, por este serviço, pagaria 10% do valor da venda como comissão, o que lhe renderia algo em torno de R$ 2 mil a R$ 3 mil . Ainda segundo o acordado, caso o empresário vendesse a carga por conta própria, só receberia R$ 1 mil como ressarcimento pelos gastos.
O policial disse ainda que por desconhecer a procedência ilícita do produto e por já ter realizado operações comerciais semelhantes, não viu problema em aceitar a proposta.
Ariovaldo declarou que procurou potenciais compradores, mas o empresário conseguiu vender a malha para um conhecido e se mostrou relutante em pagar R$ 1 mil prometidos na negociação.
Por este motivo, o policial disse ter ido pessoalmente à empresa exigir o pagamento, mas não teve êxito. Logo depois, usou o WhatsApp para reforçar a cobrança, foi então que o empresário pediu seus dados bancários, mas o policial confirmou ter exigido o pagamento em mãos.
O policial disse ainda que pela insistência do empresário em fazer o pagamento por depósito, desistiu de receber e não o procurou mais.
Sobre a exigência de receber o pagamento somente em dinheiro e pessoalmente, Ariovaldo justificou que adotou essa medida por causa do imposto de renda e não queria misturar com os valores de sua conta corrente.
Na conclusão da investigação, o delegado Alex Bonfim Reis constatou que “há robustos elementos do cometimento de infração penal contra a administração pública”, por isso, o policial Ariovaldo foi indiciado pela prática de corrupção passiva.
À reportagem de O Município, o delegado regional Fernando de Faveri afirma que a cópia do inquérito policial foi enviada à Corregedoria para análises e providências. Ainda de acordo com ele, o policial investigado está cumprindo suas funções em Brusque, não mais em Guabiruba.
Durante a extração dos dados do celular do policial Ariovaldo, foram constatadas outras possíveis ilegalidades cometidas por ele, que terão investigações à parte.
Uma das suspeitas é que o policial recebeu valores mensais para acessar o banco de dados da Secretaria de Segurança Pública de Santa Catarina e repassar dezenas de informações sigilosas a uma empresa do ramo têxtil de Guabiruba. Em algumas situações, o policial teria realizado serviços de investigador particular para a empresa, oportunidades em que cobrava adicionais ao pagamento mensal.
A reportagem de O Município tentou contato com o policial Ariovaldo, mas ele não atendeu as ligações. A defesa dele também foi procurada, mas informou que irá se manifestar apenas no processo.