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Por que as pontes caem em Brusque? Especialista explica importância da manutenção periódica

Municípios não costumam fazer vistorias técnicas, o que acaba gerando problemas como os que ocorrerem neste ano

Os problemas relacionados às pontes em Brusque trouxeram à tona a importância das vistorias preventivas destas estruturas. Historicamente, as prefeituras não costumam realizar este tipo de avaliação com frequência, o que, no futuro, pode implicar em problemas mais sérios, como o exemplo de Brusque.

O engenheiro civil Roberto de Oliveira, especialista em pontes e presidente da Associação Catarinense de Engenheiros (ACE), explica que alguns trâmites devem ser seguidos quando o assunto é a conservação das pontes. No Brasil, as vistorias devem ser feitas conforme a NBR-9452, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

Ponte do Trabalhador, que liga o bairro São Luiz e Santa Rita | Foto: Bárbara Sales/O Município

De acordo com Oliveira, a primeira vistoria deve ser realizada logo após a finalização da estrutura e é chamada de vistoria cadastral. Nesta fase, o engenheiro levanta todas as características da ponte, como comprimento total, largura, distância entre os vãos, pilares, vigas, juntas de dilatação, tubulação, etc.

“As prefeituras não costumam fazer isso, mas tem que fazer. Se não, é o primeiro passo para dar errado no futuro”.

São com estas vistorias rotineiras que o engenheiro consegue ver o que pode dar problema mais adiante

Após a vistoria cadastral, a norma de inspeção de pontes, viadutos e passarelas de concreto prevê a vistoria rotineira, que deve ocorrer anualmente. Esta inspeção visa manter as informações sobre a ponte atualizadas. “São com estas vistorias rotineiras que o engenheiro consegue ver o que pode dar problema mais adiante”, destaca.

A norma da ABNT prevê ainda a chamada vistoria especial, que consiste em uma inspeção mais detalhada da ponte, realizada por engenheiro especialista, com o objetivo de interpretar e avaliar ocorrências danosas detectadas pela vistoria rotineira.

Esta vistoria deve ser feita a cada cinco anos, podendo ser postergada em até oito anos, quando a ponte apresentar boas condições de durabilidade.

A importância da manutenção

Associadas às vistorias, o presidente da ACE ainda observa a importância da manutenção periódica. “Classificamos como manutenção a pintura, um reboco, o recapeamento da pista, o conserto de um ferro que está aparecendo, são coisas que não demandam um custo elevado e aumentam a durabilidade da estrutura”.

É sempre melhor e mais barato prevenir do que remediar. As anomalias em estruturas de concreto são auto-acelerantes, ou seja, naturalmente só aumentam com o tempo, se não forem tratadas

Porém, o engenheiro lembra que quanto mais demora para fazer a manutenção, maior será a necessidade de uma reforma, o que aumenta significativamente os custos.

“É sempre melhor e mais barato prevenir do que remediar. As anomalias em estruturas de concreto são auto-acelerantes, ou seja, naturalmente só aumentam com o tempo, se não forem tratadas”.

Drenagem e falta de comunicação

O engenheiro acompanhou o caso das duas pontes que caíram em Brusque: a que liga os bairros Santa Terezinha ao Steffen e o Guarani ao Rio Branco, por fotos e vídeos. Ele avalia que as causas dos desabamentos foram muito similares, mas aparentemente não envolveram a estrutura.

Ponte Prefeito Antônio Heil caiu em junho e ainda não foi consertada | Foto: Bárbara Sales/O Município

“Foi descuido da drenagem das cabeceiras. As pontes daquele porte, que têm um vão relativamente curto, se apoiam normalmente em pilares nas margens. No caso, se apoiaram em muros de contenção de aterro, mas a drenagem ou as águas que vieram das vias que dão acesso às pontes solaparam, ou seja, levaram o material que apoiava os muros que seguravam as pontes, e as estruturas caíram”, analisa.

Após queda da cabeceira em abril, ponte João Libério Benvenutti foi liberada para trânsito em agosto | Foto: Bárbara Sales/O Município

Além das causas estruturais, o presidente da ACE elenca ainda causas conjunturais, ou seja, que podem ter conduzido a estas falhas. Para ele, a falta de comunicação também pode ter influenciado nas duas ocorrências.

“Cada vez mais os serviços de engenharia são conduzidos por equipes, ou seja, cada um faz o seu trabalho: o engenheiro estrutural faz os cálculos das pontes, o outro faz dos muros de contenção dos aterros, o outro faz da rua – pavimentos e pontos de drenagem, e não se comunicam. Isso é muito comum”.

A manutenção em Brusque

Em Brusque, a manutenção das pontes e pontilhões é responsabilidade da Secretaria de Obras, mas conforme o secretário Ricardo de Souza, não há uma periodicidade para a realização deste serviço.

O que acontece, segundo ele, é que a secretaria tem uma equipe de pontilhões e quando eles observam que pode ter algum problema na estrutura, a Secretaria de Infraestrutura Estratégica é acionada para fazer um laudo e então poder consertar o problema. O mesmo ocorre com as pontes maiores, de concreto. Brusque conta com cerca de 500 pontes e pontilhões.

Ponte do bairro Maluche | Foto: Bárbara Sales/O Município

“Nas pontes de concreto, quando fazemos a limpeza das valas, já damos uma analisada. É feita uma constatação visual e se a equipe percebe alguma coisa, aciona a Secretaria de Infraestrutura para fazer o laudo. Mas não há uma periodicidade”, afirma o secretário.

Pontes não passam por vistorias periódicas em Brusque | Foto: Bárbara Sales/O Município

Após os problemas com as pontes João Libério Benvenutti – entre os bairros Santa Terezinha e Steffen– e Prefeito Antônio Heil, no Guarani, a Prefeitura de Brusque fez uma licitação para contratação de uma empresa que vai avaliar as condições de 10 pontes da cidade, com apresentação de laudos com informações técnicas das pontes, das cabeceiras, dos tráfegos da região e quais serviços são necessários para melhorar as condições destas estruturas e um custo estimado para os serviços.

De acordo com a secretária de Infraestrutura Estratégica, Andrea Volkmann, a licitação aconteceu no dia 30 de agosto. A expectativa é que o contrato seja assinado ainda neste mês de setembro para que a empresa possa iniciar os trabalhos.

Na região

Com as recentes ocorrências em Brusque, a preocupação com a manutenção das pontes aumentou em Botuverá. O prefeito Alcir Merízio afirma que recentemente a equipe da prefeitura fez um levantamento da situação das estruturas na cidade, mas geralmente, os reparos são feitos após solicitação dos moradores ou quando a equipe percebe algum problema.

Hoje, o município tem, pelo menos, quatro pontes de concreto ao longo da SC-486. Além dessas, anteriormente, a cidade tinha outras pontes de madeira, que foram substituídas por galerias.

O prefeito afirma que está em contato com a Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí (Ammvi) para solicitar uma vistoria mais técnica nas pontes da cidade, já que a equipe da prefeitura não conta com profissionais especializados nesta área. “Queremos esse laudo mais técnico agora, para ver o que precisa ser feito e dar mais segurança para a população. Já fizemos a inspeção nas mais movimentadas e agora seria algo mais técnico”.

Em Guabiruba, também não há uma rotina específica de vistorias e manutenções das pontes. O secretário de Obras, Jair Antônio Brambila, explica que o reparo é feito quando é detectado algum problema. “Geralmente fazemos manutenção quando tem alguma solicitação dos moradores, pessoas que moram próximo e tem um acompanhamento mais direto”.

O secretário afirma ainda que as equipes são orientadas a verificar a questão da erosão, corrosão ou a situação das estacas ao passar por uma ponte. “Esse é o acompanhamento mais direto que é feito”.

De acordo com ele, Guabiruba tem hoje em torno de 300 pontes. A maioria já em concreto ou em forma de galeria. Poucas ainda são de madeira. “Ao longo do tempo vamos substituindo por concreto ou galeria que tem um tempo de manutenção maior”.

O engenheiro e presidente da ACE, Roberto de Oliveira, afirma que nenhuma prefeitura do estado hoje realiza as vistorias e manutenções em pontes como devem ser feitas. “Primeiro, por falta de mão de obra especializada. Segundo porque não existe essa cultura da prevenção nas prefeituras”, diz.

Situação das pontes em Brusque

Ponte João Libério Benvenutti
Liga os bairros Santa Terezinha e Steffen
Cabeceira caiu na noite do dia 21 de abril
Em 1999 já tinha apresentado problemas na fundação e precisou de reparos
Foi liberada para trânsito em 13 de agosto

Ponte Prefeito Antônio Heil
Liga os bairros Guarani e Rio Branco
Caiu na manhã do dia 9 de junho
Obra de reconstrução ainda não teve início. Convênio com governo do estado foi assinado recentemente, o que permite a abertura do processo licitatório para contratar a empresa responsável pela obra

Ponte Antônio Mohr
Liga os bairros Santa Terezinha e Limoeiro
Interditada em 9 de julho por risco de desabamento
Nova ponte deve ser construída, mas sem previsão de recursos

Ponte DJ-003
Bairro Dom Joaquim
Interditada para caminhões, ônibus e veículos com mais de 2,3 metros de altura desde 13 de julho
Local passa por reparos desde 2013 devido a problemas nas cabeceiras
Nova ponte deve ser construída, mas sem previsão de recursos