X
X

Buscar

Preparação contra enchentes: qual a estrutura de Brusque para enfrentar chuvas semelhantes às do RS

Com o estado vizinho castigado pelas cheias, município deve ficar alerta

Se as chuvas intensas que afetaram e destruíram diversas cidades do Rio Grande do Sul em maio – deixando milhares de mortos e desabrigados – acontecerem em Brusque, o desastre se repetirá, ou o município está preparado para enfrentar eventos climáticos extremos e não repetir os erros do estado vizinho. O município aprendeu com as tragédias de enchentes passadas?

Para responder esse questionamento, a reportagem do jornal O Município procurou a Defesa Civil, o prefeito de Brusque e um especialista para entender o cenário atual na preparação, prevenção e mitigação de acontecimentos climáticos.

Terceiro município do Brasil com mais áreas de risco, com 199 locais, segundo o Serviço Geológico do Brasil, além dos alagamentos, Brusque precisa lidar com uma de suas principais consequências: os deslizamentos. Atualmente, a estimativa é de que 14 mil pessoas habitem esses espaços, segundo o coordenador da Defesa Civil de Brusque, Edevilson Cugiki.

Para evitar o colapso do sistema de defesa contra enchentes, o município precisa de ações de curto, médio e longo prazo, além de políticas públicas eficientes e estratégias adequadas dos órgãos competentes para agir em casos de resgates e evacuações de moradores.

Lições do passado

Apesar da catástrofe recente no estado vizinho, Brusque e todo o Vale do Itajaí já enfrentaram enchentes de grandes proporções no passado. Houve evoluções e mudanças para que as perdas das tragédias já vividas em Brusque não se repitam? Para o coordenador da Defesa Civil, sim.

Após a inundação de 2008, considerada a quarta maior do município, melhorias foram feitas na estrutura e no contingente da Defesa Civil. “De lá para cá, a gente teve um aumento no efetivo. Por exemplo, essa estrutura que tem hoje foi construída pensando numa situação de evento [de enchente].”

Atualmente, o efetivo da Defesa Civil conta com 16 pessoas, cinco veículos e 12 embarcações. De acordo com Edevilson, as equipes são suficientes, mas em momentos de calamidades, é necessário auxílio de outros órgãos, como Corpo de Bombeiros e Polícia Militar.

Atualmente, a Defesa Civil conta com cinco veículos e 12 embarcações – Amanda Kuhn/O Município

“A gente tem conseguido suprir a necessidade com o nosso efetivo, então em uma situação maior a gente vai acabar solicitando pessoas de outros departamentos da prefeitura para auxiliar”, diz.

A sede também mudou de local e hoje está instalada em uma região mais alta do município. Em 2011, na segunda maior enchente da história, o antigo prédio na rua Manoel Tavares foi atingido.

Nova sede da Defesa Civil, inaugurada em 2018 – Amanda Kuhn/O Município

Em 2024, o orçamento da Defesa Civil de Brusque é de R$ 1,6 milhão. Valor suficiente, e que tem aumentando a cada ano, segundo o prefeito André Vechi.

“A gente tem a visão de que no momento de calmaria que temos que fortalecer a Defesa Civil, não adianta quando tivermos um desastre, um episódio de enchente, ou querer colocar dinheiro, porque daí vai ser tarde demais. Temos que agir sempre de forma preventiva e planejada.”

“A gente tá preparado para enfrentar tudo o que enfrentamos até agora, né? Tivemos a terceira maior enchente da história ano passado no dia 17 de novembro e a cidade conseguiu superar, né? A gente reconstruiu o que tinha que reconstruir”, declara.

Necessidade da iniciativa privada

A assistência da iniciativa privada e da sociedade civil em momentos de calamidades é defendida pelo chefe do Executivo e pelo coordenador da Defesa Civil. Por exemplo, o uso de veículos maiores, como jipes.

“A gente não tem como ter uma previsão segura de quantas enchentes vai ter no ano. Como essa demanda é muito pontual, não convém fazer um investimento tão grande, não que não seja importante, se tivesse dinheiro sobrando até seria, né? Mas não convém a gente fazer investimento tão grande agora para talvez deixar os veículos parados por um ano sem utilidade”, afirma o prefeito.

Para Edevilson, a responsabilidade em situações extremas é de todos. “A gente não pode pensar no evento adverso somente como uma ação do poder público. O poder público vai balizar as ações que vão ser feitas, mas toda a população tem que ser responsável.”

Segundo ele, a principal ferramenta utilizada pela Defesa Civil para combater inundações em Brusque é a prevenção.

“A principal estratégia que a gente usa hoje é o alerta antecipado. Então a gente faz a projeção de nível e com base nela conseguimos saber as áreas que vão ter alagamento e emitimos o alerta com horas de antecedência, o que agiliza esse processo para que o resgate não seja necessário.”

Antes, durante e depois da enchente

A presença da população em áreas que deveriam ser preservadas, regiões ribeirinhas e o nível do rio Itajaí-Mirim são as principais preocupações das autoridades em casos de chuvas intensas em Brusque.

Para algumas áreas de risco, em situação mais crítica, que podem ser atingidas por alagamentos e deslizamentos, há planos de retirada e evacuação dos moradores, aponta Edevilson.

“O pessoal tem a ideia de que quando foi classificada como área de risco acabou e não se faz mais nada, mas na verdade a área de risco é dinâmica. Hoje existe uma área de risco e se faz alguma obra lá e ela deixa de ser de risco ou pelo menos diminui a sua classificação de risco, então ela pode ser ocupada de maneira segura.”

Para o geólogo, mestre em Geografia e doutor em Engenharia Civil Juarês Aumond, uma das soluções é retirar moradores de áreas de risco e não permitir novas construções em locais perigosos.

Houve avanços, mas é preciso ainda mais melhorias na estrutura da Defesa Civil. “É preciso repensar a Defesa Civil não só daqui da nossa região, mas de todo o Brasil inclusive, porque nós temos que ver onde foi ocupado que antes não tinha grandes problemas e a partir de agora vai ter”, alerta Juarês.

“Uma das questões é tirar as pessoas das áreas de risco e colocar em áreas que não são de risco. As prefeituras e o governo federal tem que agir rapidamente. Por outro lado, nós temos que também pensar em como educar essas pessoas porque existem três momentos: antes, durante e depois do desastre”, avalia.

Sistema de defesa contra enchentes

As avenidas Beira Rio, o conjunto de macrodrenagem, o monitoramento das chuvas e do nível do rio Itajaí-Mirim integram o sistema de contenção de enchentes de Brusque. Conforme o coordenador da Defesa Civil, ele é eficaz, mas é testado em situações extremas.

“Ele é eficaz. Eficiente depende do tamanho do evento, eficaz e eficiente são diferentes. Eficaz é ele funcionar, eficiente é ele funcionar no tempo certo. Isso é extremamente complicado de fazer”, pontua.

Na Defesa Civil, há o sistema de telemetria, com pluviômetros e monitoramento de rio e ribeirões, e as costas de cheia, instaladas em 2014.

Para o sistema de drenagem brusquense funcionar perante chuvas extremas, Edevilson destaca que “depende da quantidade de chuva” e que as avenidas Beira Rio “foram feitas justamente para alagar” e diante de enxurradas, servem para “aliviar a situação”.

Em um cenário de enchente, “o tempo de resposta [das ações do município] vai ser maior ou menor dependendo do tamanho do evento.” Em sua avaliação, não é possível evitar totalmente os efeitos de uma enxurrada. “Danos materiais sempre vão ter, porque a única forma da gente acabar com eles seria praticamente tirando a cidade daqui.”

Para o prefeito, também não é possível evitar os estragos. “Quando a gente fala em algum fenômeno da natureza, algum evento climático como esse [enchente], a gente não consegue impedir e evitar, né? A gente consegue mitigar o estrago e para isso a gente precisa de planejamento.”

Sem sistema de drenagem municipal, que atualmente está em fase de elaboração, o foco da prefeitura são as bacias hidrográficas, além de diversas obras planejadas. Macrodrenagem em bairros como Santa Rita, Primeiro de Maio e Cedrinho estão em andamento, previstas para serem entregues em até quatro anos.

Sobre as obras realizadas e previstas para o futuro, Edevilson declara que não é possível afirmar se elas serão suficientes para evitar inundações maiores. “Qualquer obra de engenharia tem um limite de atuação, a gente não tem obra de engenharia que vai acabar completamente com o evento adverso.”

A curto prazo, o Executivo investe em limpezas e manutenção de valas, conforme o prefeito.

Eventos mais frequentes, mas há soluções

Juarês estuda mudanças climáticas há 40 anos e informa que enchentes serão cada vez mais frequentes, mas destaca que é possível reverter a situação. Ele diz que a proporção das enchentes como as do Rio Grande do Sul, em que a água alcançou locais nunca antes afetados, pode atingir Brusque. “Pode e vai. É uma questão de tempo.”

“É cada vez mais frequente as chuvas concentradas num lugar e menos no outro, devido às mudanças climáticas, ao uso e ocupação da nossa região que foi muito caótica, aos desmatamentos, à prática de agricultura em lugares errados”, avalia.

“Podemos nos preparar para o pior, serão mais frequente as inundações, os vendavais, ciclones extratropicais, isso tudo vai nos afetar profundamente mas não podemos ser pessimistas, temos que ser otimistas, o homem tem capacidade de se adaptar a essas novas mudanças, mas tem que agir rápido.”

Brusque já enfrentou diversas enchentes no passado – Vitor Souza/O Município

Ações como retirada das pessoas de locais de risco, revegetação de encostas e áreas urbanas, drenagem artificial e macrodrenagem subterrânea são iniciativas que o poder público pode tomar para evitar o colapso do município em momentos de chuvas fortes.

O prefeito alega que a revegetação é uma medida que funciona na teoria, mas na prática é complicada, devido à presença de residências e a dificuldade de realocação dos moradores. “Na prática eu não vejo muita viabilidade, principalmente por esse ponto de vista de custo e interesse.”

O pesquisador diz que as principais estratégias de enfrentamento a desastres naturais são educação da população, prevenção e comunicação direta e facilitada aos moradores.

“Além da educação, eu penso que as escolas de primeiro, segundo grau e as universidades têm que ensinar as crianças e adultos o momento que nós estamos vivendo, para estarem atentos e saberem como proceder no caso de uma sirene, por exemplo.”

“Hoje Brusque se vira bem frente a esses eventos climáticos, mas tem muito que melhorar e a gente não vai se acomodar”, garante o chefe do Executivo.


Assista agora mesmo!

Kaktu’s: a história do bar de Guabiruba que marcou a geração dos anos 90: