Promotoria pública – A Viagem
Ao ingressar no Ministério Público, senti o drama de enfrentar a importante função “de promover a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais”. Assim, diz a Constituição. No varejo mesmo, significa processar o infrator da lei penal. Na Faculdade, tinha participado ativamente da política estudantil e, no momento de […]
Ao ingressar no Ministério Público, senti o drama de enfrentar a importante função “de promover a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais”. Assim, diz a Constituição. No varejo mesmo, significa processar o infrator da lei penal. Na Faculdade, tinha participado ativamente da política estudantil e, no momento de arregaçar as mangas para o trabalho forense, senti que era preciso correr atrás do prejuízo. Queimei pestanas para superar as dificuldades da prática jurídicas. No mais, sabia que a experiência de ter sido presidente do Centro Acadêmico iria me ajudar no enfrentamento dos embates para a defesa lei e da justiça.
Tempo de salário baixo, poucos se animavam a enfrentar o então longínquo e isolado Oeste, mais gaúcho e paranaense que catarinense, com suas comarcas à espera de um “herói” diplomado em Universidade Federal. Então, mais um dilema, a escolha da melhor cidade para um Promotor solteiro, deixando o Litoral. O Procurador Geral foi incisivo: “Palmitos tem loja das Casas Pernambucanas e concessionária da Willys Overland, que vende Jeep. Então deve ser a melhor”.
E, para lá me mandei, numa fria manhã do dia 28 de maio de 1967. Nunca haveria de esquecer aquela demorada e emocionante viagem de três dias, levando todo meu patrimônio material dentro de três malas, uma de roupas e duas de livros, que o saber era o que importava e juventude sobrava. Viagem de três dias, agora, feita em oito horas para chegar em Palmitos, as pessoas parecem não acreditar. Pensam, sem dizer, que se trata de um lapso da minha memória já envelhecida, maltratada pelo tempo implacável.
Tempo em que um automóvel me parecia sonho distante, sem linha direta de ônibus, não havia outro jeito. Era preciso encarar uma viagem em três etapas. A primeira, começando às 6 horas da manhã, embarcado num pinga-pinga de parar em lugares mil, serpenteando pela serra até chegar a Lages, ao anoitecer outonal daquele final de maio. No dia seguinte, mais uma viagem de 12 horas, o ônibus a percorrer lentamente uma estrada cheia de buracos, parando em qualquer lugar, chacoalhando o tempo todo para maltratar, ainda mais, os cansados passageiros rumo a Chapecó, então disputando a taça de Capital do Oeste.
Ali, mais um pernoite para continuar viagem no terceiro dia. Só, então, cheguei a Palmitos, onde iniciei minha carreira ministerial, numa cidade desconhecida, bastante diferente daquelas do Litoral. Hoje, sinto que valeu a pena. Muito devo ao Ministério Público de Santa Catarina e ao povo daquela comunidade.