“Quem está em tratamento consegue ter qualidade de vida e melhorar”, aponta psicólogo sobre prevenção ao suicídio em Brusque
Rede pública realiza atendimentos voltados à saúde mental, além de oferecer serviços especializados
Até novembro de 2022, Brusque havia registrado 19 suicídios no ano, o maior número anual desde 2000, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Vigilância em Saúde. Para atuar na prevenção, a rede pública realiza atendimentos voltados a saúde mental, além de oferecer serviços especializados.
“O suicídio é um assunto muito complexo. Ele está entre os sintomas do quadro depressivo. Dentro de uma avaliação de risco, quando o paciente chega até nós, tentamos entender a dinâmica de vida dele”, conta o psicólogo Jones Trajano Ceci Emann.
Jones atua na Equipe Multiprofissional de Atenção Especializada em Saúde Mental (Ament), em Brusque. Trata-se de um projeto do Ministério da Saúde que tem o objetivo de facilitar o acesso das pessoas ao nível maior de atenção à saúde mental. “É uma equipe composta por médicos, assistente social e psicólogos, e também cabem outros profissionais incluídos na equipe multidisciplinar”, explica.
O profissional ressalta que muitos pacientes escondem esses sintomas. Dentre eles, estão a ausência de prazer, prejuízo do sono, agressividade e mudanças de comportamento. Ao fazer perguntas e promover a conversa, o psicólogo conhece cada vez mais os contextos do usuário e consegue identificar algum dos sinais de risco.
Entretanto, Jones comenta que o atendimento pode demorar e a família é essencial nesta avaliação. “Quando a gente descobre históricos de tentativas, sabemos que aumenta a probabilidade de novas ocorrências. Então, sabendo disso, encaminhamos aos serviços especializados”, continua.
O psicólogo explica que na Ament é oferecido suporte ambulatorial para um tratamento moderado. Na rede pública, o Caps II e o Caps AD fazem o atendimento especializado. O primeiro é destinado aos transtornos psicológicos, já o segundo é para aqueles que sofrem com a dependência química.
Conforme o profissional, muitos pacientes e familiares passam pela triagem na Ament, contudo muitos já procuram diretamente o atendimento especializado.
O atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) pode ser buscado tanto pelas Unidades de Saúde, pelo Centro Integrado de Apoio Psicossocial (Ciaps) ou diretamente nos serviços especializados.
Problema subestimado
De acordo com o psicólogo, existem muitos mitos sociais acerca do suicídio. “Muitos falam que é besteira, bobagem e que quem fala em suicídio não vai cometê-lo. Suicídio não é bobeira, são diversos fatores envolvidos, como a depressão, alterações biológicas, comportamentais e sociais. Então, temos sempre que ficar atentos, se a pessoas está em sofrimento de saúde mental ou com depressão, até mesmo com históricos. A qualquer sinal que a pessoa apresentar”, aponta.
Segundo ele, os sinais podem ser identificados pela própria família, inclusive em crianças, como o desempenho escolar. “Às vezes a pessoa que está em tratamento demonstra mudança de humor para melhor. Ou seja, de repente ela está melhor, faz coisas fora da rotina. Precisamos ficar espertos pois a pessoa pode estar se despedindo”, alerta.
“É muito importante saber que a depressão não tratada causa o suicídio. Quem está em tratamento consegue ter uma qualidade de vida, melhorar, retomar seus projetos e viver de maneira bem melhor. É importante esclarecer o assunto, se a pessoa estiver em sofrimento, perceber um sinal, pode buscar ajuda”, completa.
Após a pandemia
Segundo Jones, o maior número de suicídios é cometido por homens, mas o maior número de tentativas é cometido por mulheres. Ele explica que homens costumam usar meios mais letais. Outra questão comentada pelo psicólogo é o agravamento dos casos de depressão e ansiedade após a pandemia da Covid-19.
“Vemos que já tínhamos um problema de saúde mental, mas aflorou mais após a pandemia. Principalmente entre os jovens, entre 15 e 25 anos. Muitos deles com depressão, crise de ansiedades e fobias, como ataque do pânico”, conta.
Jones ressalta que sociedade precisa olhar com mais cuidado para a saúde mental. Ele aponta que a depressão superou o número de doenças crônicas, como a diabetes, no Brasil, por exemplo.
“Ela é tão importante quanto o tratamento de outras patologias. Precisa-se pensar em políticas públicas para melhorar os serviços, implementar ações preventivas, para que o problema não se agrave cada vez mais. Não apenas apagar incêndios, mas ter pensamento estratégico. Evitar um futuro suicido”, salienta.
Uso de substância
A psicóloga Roselaine Favaro, que atua no do Caps AD, ressalta que o abuso de substâncias psicoativas podem influenciar uma situação crítica. “É bastante grave, as pessoas acabam se encorajando diante do uso da substância. Isso traz alterações neurológicas, que podem dar um impulso para o ato”, conta.
Além disso, o uso cada vez mais frequentemente pode, também, ocasionar uma overdose. “Acaba fugindo do controle pela dependência. Num primeiro momento, usa-se a substância pelo prazer, com o uso contínuo acaba gerando a dependência. Busca-se pelo primeiro prazer, que foi bom, e vai aumentando a dose, até perder o controle do uso”, explica.
Neste sentido, o trabalho ocorre em conjunto com a família, para que se tenha um olhar de suporte no tratamento.
Roselaine também detalha que o setor recebe muitos pacientes com transtornos mentais associados com a dependência química. “A pessoa quer diversas formas para acabar com a dor. Às vezes ela não que se matar, mas que acabar com uma dor muito forte”, enfatiza.
Janeiro Branco
A campanha Janeiro Branco tem o objetivo de chamar a atenção da humanidade para as questões e necessidades relacionadas à Saúde Mental e Emocional das pessoas e das instituições humanas.
Em 2022, a temática abordou a saúde mental como uma questão mundial. Já neste ano, o tema é “Converse com alguém”, com objetivo de buscar por serviços especializados. A intenção é mostrar que há formas de tratar a saúde mental, prevenir o suicídio e promover qualidade de vida.
“Essa conversa pode ser até com alguém com afinidade, porque já é um passo para a pessoa ter consciência, se ouvir e, quem sabe, buscar ajuda. Pessoas que estiverem em sofrimento podem buscar o serviço. Buscar uma orientação, pois às vezes a pessoa pensa que a situação está numa perspectiva, mas na verdade é outra”, finaliza Roselaine.