Rosemari Glatz

Reitora da Unifebe

Carta de Anita Garibaldi – Parte IV

Rosemari Glatz

Reitora da Unifebe

Carta de Anita Garibaldi – Parte IV

Rosemari Glatz

Eu estava doente, com febre alta e, por mais que tenham insistido, me recusei a ficar em San Marino para ser tratada. Disseram que eu fui acometida por febre tifoide e meu estado de saúde piorava visivelmente, mas eu não abandonaria meu homem e nem a causa da liberdade pela qual lutávamos.

No dia 3 de agosto, fugindo dos ataques austríacos, desembarcamos em Magnavacca. Eu estava agora grávida de seis meses, e sentia que meu filho já não vivia dentro de mim. A febre não dava trégua. Eu não tinha mais forças para andar e Giuseppe me carregou desfalecida nos seus braços pelos pântanos do Lago de Comacchio, na companhia do único soldado remanescente, o Major Giovani Battista Culiolo.

Senti que a vida se esvaecia em mim e nem a certeza de que tinha três filhos pequenos me esperando em casa foi suficiente para me manter viva… O nosso quinto filho também não veria a luz do Sol. Nossos espíritos se juntariam à Rosita, a filhinha que morreu em 1845. Eu tive muita febre nos dias que antecederam minha morte, e acredito que morri em decorrência de infecção, pois o meu filhinho morreu dentro do meu ventre sem que eu tenha conseguido dar à luz. Hoje isso seria chamado morte fetal intrauterina, e a medicina moderna consegue evitar que a mãe morra em decorrência da morte do feto no seu ventre.

O dia da nossa morte também é um dia que deve ser vivido. Deixei o mundo terreno no início da noite do dia 4 de agosto de 1849, na fazenda do Marquês Guiccioli, em Ravenna, poucos dias antes de completar 28 anos. Meu corpo foi sepultado pela primeira vez cerca de 2 horas depois da morte, clandestinamente e às pressas, escondido pela noite, em cova rasa, nas terras da própria fazenda, no local conhecido como Landa Pastorara.

Caçado pelos austríacos, Giuseppe retomou a fuga rapidamente. Precisava salvar a sua vida e retornar para criar os nossos três filhos. E guardar a minha memória, no nosso amor para além da vida. Poucos dias depois, em 11 de agosto, fui sepultada pela segunda vez, em outra cova simples, com uma cruz de madeira, no Cemitério de Santo Alberto em Mandriole, próximo à igreja.

Dez anos depois, liderados por Francesco Manetti, alguns garibaldinos sequestraram os meus restos mortais e os sepultaram em lugar secreto, pois tinham o receio de que minha sepultura fosse violada pelos adversários da unidade italiana, e temiam pelo desaparecimento do meu corpo. Descoberto o sequestro, o padre Francesco Burzatti recuperou os meus restos mortais e os enterrou no interior da igreja de Madriole, perto do altar, onde permaneci até 1859 quando, ao voltar de seu longo exílio, Giuseppe foi até lá acompanhado pelos nossos três filhos, Menotti, Ricciotti e Teresita, para transladar os meus restos mortais.

Meu amor organizou um cortejo fúnebre para o meu digno sepultamento, desta vez em Nice, ao lado da minha sogra. No caminho, passaram com o féretro por diversas cidades, parando para homenagens em Ravenna, Bolonha, Livorno, Gênova e Nice, na França. Com isso, Giuseppe pagou a promessa feita a mim no meu leito de morte, e motivou as populações por onde passou a retomar e prosseguir a luta pela unidade italiana. Depois disso, meu Giuseppe iniciou a segunda parte da guerra pela unificação da Itália.

Em 1931, por solicitação do Governo de Mussolini, a França consentiu no traslado dos meus restos mortais de Nice para Roma. Como as obras do local onde eu seria sepultada ainda não estavam prontas, fui sepultada provisoriamente em Gênova. E, finalmente, em 2 de junho de 1932 o Governo italiano patrocinou um gigantesco traslado dos meus restos mortais, transformando o evento em um dos maiores atos cívicos da história da jovem Itália. O túmulo onde descansa o me corpo está localizado no Monte Gianícolo, em Roma, onde foi erguido um monumento equestre em minha homenagem que recebe visitantes de todo o mundo.

 

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