ARTIGO: Mais um (louco) para Brusque?
As gerações mais jovens talvez desconheçam, mas Brusque já foi conhecida por possuir uma instituição para tratamento aos doentes mentais que marcou modelos e concepções diferenciadas sobre a loucura: a ala de psiquiatria do Azambuja.
Em virtude da sua existência, na região circulava uma frase muito comum referente a cada novo “suspeito” que entrava na cidade: “Mais um pra Brusque”, indicando que chegava mais um “louco”.
A história da ala de psiquiatria do Azambuja data de 1901 quando foi fundada a Santa Casa de Misericórdia para acolher pessoas doentes e toda sorte de desvalidos. Os atendimentos passaram a ser mais frequentes a partir do ano seguinte quando as Irmãs da Divina Providência, recém-chegadas da Alemanha, assumiram os cuidados do hospital: era o dia 29/06/1902, quando a Santa Casa foi oficialmente inaugurada.
Naquela época não havia médicos, e os atendimentos eram realizados pelas religiosas, informa o padre Éder Celva. Além do hospital, a Santa Casa de Misericórdia também abrigava um asilo, um orfanato, escola paroquial, escola catequética, e ala de psiquiatria. Em 1910, a seção hospitalar da Santa Casa, ganhou autonomia com a finalização de uma construção própria. Brusque passou a contar com uma das primeiras instituições asilares do Estado e o Azambuja passou a ser o responsável pela assistência aos doentes mentais da região.
A professora Ana Cláudia Delfini (2003) no artigo: “A imigração italiana e saúde mental: Mais um (louco) para Brusque?” informa que no Azambuja se visualizava uma das primeiras iniciativas catarinenses em se tratar da loucura mediante um saber médico, especializado, que estava se desenvolvendo no início do século XX.
Entretanto, a loucura continuava a ser tratada com métodos que misturavam o saber religioso, orações e cuidados gerais com o corpo, com métodos terapêuticos naturais, como o recurso aos banhos frios e exposição ao sol. O ala de psiquiatria funcionou no Azambuja até 1942, quando todos os pacientes com doença mental foram transferidos do Azambuja para o Hospital Colônia Santana, em São José, inaugurado oficialmente em 1941.
Em 4 de janeiro o governo mandou um caminhão e, em 6 de janeiro de 1942, mais dois caminhões que levaram os últimos alienados para a colônia Santana. Concluía-se assim a transferência dos pacientes com doença mental. Outros 110 pacientes do Azambuja já haviam sido transferidos para a Colônia Santana anteriormente, em 1939.
Embasada em um caráter científico, a professora Define escreveu que a Colônia Santana representaria um avanço nos cuidados para com os alienados, expresso nos discursos das autoridades locais que não teriam mais que se preocupar com o destino dos loucos e ofereceu tratamentos aos seus pacientes, sendo no princípio, alguns bastante rudimentares, como o uso da camisa de força e o isolamento. Nas décadas de 1940-1950, a produção e difusão de remédios mudaram bastante a manutenção dos loucos, trocando as correntes de aço pelas químicas, e foi inserido o tratamento com insulinoterapia, sonoterapia, convulsoterapia pelo eletrochoque e cardizol, eletronarcose, baneoterapia, lobotomia, malarioterapia e praxiterapia.
Passados quase 80 anos, talvez a frase “Mais um pra Brusque” hoje possa ter um outro sentido, tal como no romance:
“Mas eu não quero me encontrar com gente louca”, observou Alice.
“Você não pode evitar isso”, replicou o gato.
“Todos nós aqui somos loucos. Eu sou louco, você é louca”.
“Como você sabe que eu sou louca?”, indagou Alice.
“Deve ser”, disse o gato, “Ou não estaria aqui”. (Alice no País das Maravilhas, Lewis Carroll).