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Uma entrevista com Curt Hering

Nas últimas semanas, a Cia Hering esteve no noticiário econômico nacional. Considerada uma das mais valiosas marcas brasileiras, a venda do controle acionário da empresa centenária para o conglomerado Soma rompe o cordão umbilical de Blumenau com uma das suas mais conhecidas indústrias. Muitas pessoas reconhecem a Hering. Mas poucos conhecem a origem da logomarca […]

Nas últimas semanas, a Cia Hering esteve no noticiário econômico nacional. Considerada uma das mais valiosas marcas brasileiras, a venda do controle acionário da empresa centenária para o conglomerado Soma rompe o cordão umbilical de Blumenau com uma das suas mais conhecidas indústrias.

Muitas pessoas reconhecem a Hering. Mas poucos conhecem a origem da logomarca dos dois peixinhos. Explico: em alemão, Hering significa “arenque”, um tipo de peixe, semelhante à sardinha, muito comum na Alemanha. Assim, os dois peixinhos representam os irmãos Bruno e Hermann, imigrantes vindos de Hartha, Alemanha que, em 1880, fundaram a Hering. E, com o assunto da venda da Cia Hering em pauta, aproveito para compartilhar um pouco da sabedoria de um dos seus administradores.

Foi por volta de 1942, em plena II Guerra Mundial, que Nemésio Heusi, diretor da Agência Press-Parga, veio a Santa Catarina em missão jornalística. Entrevistou Curt Hering. Filho mais novo de Hermann, Curt nasceu no dia 8/05/1881, um ano depois da fundação da empresa. Ele foi um dos administradores da Cia Hering e agora estaria completando 140 anos. A entrevista, uma admirável confissão de fé democrática, precisa e profética, não foi publicada à época. Nemésio Heusi a publicou apenas em março de 1958, na revista Blumenau em Cadernos. Vejamos:

“ – Sr. Curt Hering, como jornalista, vim ao meu Estado colher suas impressões sobre a guerra que atravessamos, e qual o destino do Nazi-Fascismo?

A resposta não se fez esperar, sóbria, serena, e com toda a beleza histórica:

– Sr. Heusi, a crise que o mundo atravessa, agravada por esta guerra a que assistimos, provém de fatos históricos. De um lado o poder da força, de outro o poder da liberdade. Os gregos praticaram a democracia pela primeira vez na história, dois mil e quinhentos anos antes que Jefferson a tivesse idealizado. Sólon, e depois Sócrates, foram os verdadeiros apóstolos do Governo do Povo para o Povo, de Justiça, de Direito, de Liberdade e finalmente a Democracia na sua pura essência. Das patifarias de Alcebíades, traindo Atenas para incitar Esparta, resultou que ela fosse destruída, arrasada. Aconteceu, porém, que o ideal democrático não morreu, atravessou séculos para esbarrar na prepotência dos Césares e Augustos Romanos. Destruiu-os caminhando sempre, como uma tocha viva para incendiar, séculos depois, o fausto dos Luízes da França. A Revolução Francesa de 1789 nada mais foi senão o grito de liberdade, a volta triunfal das ideias democráticas. Danton, Marat e Robespierre embriagaram-se com o poder. Suas mortes geraram um governo anárquico, possibilitando o trágico esplendor de Napoleão que, depois de dominar grande parte do mundo acabou como todo déspota em Santa Helena. Mais uma vez o ideal da liberdade venceu o poder da força. Já em nossos dias a marcha do Kaiser através da Bélgica em 1914, ateou fogo a Europa efervescente, e o que assistimos? – foi a guerra desumana do mesmo poder ditatorial da força, contra as raízes profundas daquela democracia que alicerçadas pelos Gregos, na Razão, na Justiça e na Liberdade mais uma vez venceu as ditaduras histéricas. Como vimos, as ditaduras, o poder que se assenta no direito da força e não na força do direito, perecerão. Hitler e Mussolini não serão uma exceção à regra.

E, dando por encerrada a entrevista, Curt Hering concluiu: estamos ainda em plena guerra, e eu lhe asseguro que está perto, muito perto, o fim do Nazismo e do Fascismo. Enganam-se os que subestimam o poder do Povo, esta força poderosa que gira os destinos da humanidade, reagindo todas as vezes que sentir fugir a liberdade, essa conquista que os séculos nos legaram como fundamento sublime do ideal Democrático! “