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Secretário de Saúde reconhece que há médicos que não cumprem carga horária

Humberto Fornari explica que havia acordos informais de dispensa de registro do ponto por profissionais

Humberto Fornari, secretário de Saúde de Brusque, concedeu entrevista coletiva nesta quinta-feira, 16, para comentar o editorial veiculado por O Município na quarta-feira, 15, o qual revelou que 66% dos médicos da rede pública não foram assíduos em outubro.

“Fomos pegos de surpresa com essa última reportagem do jornal, onde ela coloca uma verdade, do ponto de vista do ponto e da assiduidade por parte da classe médica”, disse o secretário.

Ele não contestou a veracidade das informações divulgadas, e reconheceu que há, nos quadros da prefeitura, médicos que resistem à ideia de bater o ponto, e afirma que isso é uma situação antiga.

“Muitos ou alguns médicos tinham alguns acordos quase que milenares, desde que assumiram a função dentro do sistema público, isso é de mais de dez anos”.

Segundo Fornari, esses acordos consistem na dispensa do registro do ponto em troca do fornecimento de procedimentos especializados, em outros locais onde trabalham.

Os acordos, afirma, existem desde 2001, e foram corroborados por todas as gestões que passaram pela prefeitura. Na prática, o médico deixa de registrar o ponto e, em troca, produz para a prefeitura uma quantidade ‘x’ de exames ou cirurgias.

“Havia então um acordo de trocas, onde muitas vezes não se cobrava o ponto, e às vezes esse ponto se torna impossibilitado de ser cobrado, uma vez que o profissional não está dentro da área da prefeitura”, esclarece o secretário.

Ele cita como exemplo procedimentos da especialidade cardiologia, como testes de esforço, assim como endoscopias e colonoscopias, que não são feitas na Policlínica e, por isso, o governo não tem controle sobre o horário de trabalho dos médicos.

“Quando a gente coloca que os médicos não estavam batendo o cartão ponto, é verdade, mas existia, e sempre existiu, uma certa troca de serviço, produção por ponto”, comenta Fornari.

“Se isso está certo, se isso está errado, é o que a gente vem discutindo desde o início do semestre passado. Optou-se por fazer com que os acordos fossem rompidos, que a classe médica voltasse a bater o ponto como todo servidor normal”, diz.

Acordos informais entre médicos e governo

Ele confirmou a informação que O Município expôs no editorial, de que a partir de maio deste ano a prefeitura optou por ser mais rigorosa no controle da carga horária dos médicos, cortando gratificação e descontando o salário de quem não fosse assíduo.

Conforme o secretário, havia 13 médicos que estavam contemplados dentro desse pacote de acordos informais, que já foram regularizados, ou seja, que segundo ele, estão cumprindo sua carga horária na íntegra.

Ele diz que, nesses casos, chegou-se “ao ponto final da negociação, cobrando que eles venham a executar aquilo para o que prestaram o concurso, e finalmente vão exercer aquilo que lhe é de dever: trabalhar as oito horas dentro das unidades básicas ou das especialidades”.

Fornari diz que somente a atual gestão tentou mudar esse quadro de acordos informais, que permaneceu o mesmo por uma década. Ele relata que, neste ano, o desconto por falta de assiduidade já chegou a R$ 130 mil, mais do que o dobro dos R$ 50 mil registrados em todo o ano passado.

“Acredito que isso é mostrar responsabilidade por parte da gestão da Secretaria de Saúde”, diz o secretário, o qual reitera que a prática dos acordos foi aceita por governos passados.

“Se assim foi feito até o presente momento é porque alguém aceitou. E não foi um, foram vários gestores, vários prefeitos aceitaram as propostas que vinham acontecendo”, afirma.

“Posso dizer que estou dormindo tranquilo, o que tem que ser feito estamos fazendo, está havendo regularização do ponto, da assiduidade, as negociações para revogar os acordos”, continua o secretário.

Fornari: “situação era caótica em janeiro”

O secretário, durante a entrevista coletiva, autoquestionou-se. “Mas, Humberto, porque vocês não fizeram isso em janeiro?”.

No que emendou a resposta: “porque em janeiro a situação que a gente viu era caótica, do ponto de vista funcional, de falta de médicos, de uma despesa de R$ 1,7 milhão como herança a ser paga”. disse. “Porque não fizemos [a regularização da assiduidade]? Porque tínhamos que acomodar os interesses”.

Ele afirma que não era possível, no começo do ano, simplesmente romper os acordos firmados, porque isso inviabilizaria a prestação de alguns serviços.

Fornari cita como exemplo o fato de que, dentro desses acordos, exames eram feitos por médicos especialistas para os pacientes da secretaria em troca de horas de trabalho, e não havia outro prestador disponível, assim como não há, no momento, para endoscopias, por exemplo.

“Não dá para simplesmente romper acordos, do ponto de vista em que a comunidade estava sendo beneficiada”, diz. “Não é simplesmente romper de uma hora para outra e deixar a população desguarnecida de exames básicos e necessários”.

O secretário diz que foram organizadas negociações para que todos os médicos devessem bater o cartão ponto e permanecer dentro das unidades durante as oito horas diárias.

“Houve desgaste, houve abandonos, teve médico que no momento que o acordo foi rompido, para ele não interessou mais. Ruim seria se tivéssemos mantido, desqualificando o trabalho que estávamos pleiteando”, opina.

Como o corte de salários começou

Fornari relatou que a discussão sobre o cumprimento do ponto pelos médicos iniciou em abril, quando o departamento de Recursos Humanos comunicou a pasta e solicitou saber qual seria o posicionamento da atual gestão sobre os acordos firmados com os médicos, assim como o pagamento de assiduidade, mesmo sem registro do ponto.

Ele afirma que o governo foi surpreendido com a informação e, após discussões, decidiu por romper essa prática. “Em maio já fizemos a redução de quem não tinha o direito de receber. Os valores que são descontados dos médicos são destinados à atenção básica”, disse.

Ele também confirmou informações apuradas por O Município, de que a Procuradoria-geral do município está pedindo a devolução de recursos recebidos por médicos, de forma ilegal.

O secretário diz que se o rompimento dos acordos e corte da gratificação tivesse sido feito no começo do ano, causaria um desfalque em procedimentos.

“Somos legalistas, somos moralistas, mas somos, além disso, responsáveis com a qualidade dos atendimentos à nossa comunidade”, afirma Fornari. Ele ressalta, novamente, que este foi o primeiro governo a tocar nesta ferida.

“Historicamente, nunca se cobrou o cartão ponto dos médicos, nunca se cobrou a assiduidade que estava realmente contemplada na lei”.

Secretário contesta exposição dos médicos

Fornari queixou-se, na coletiva, da exposição da classe médica no editorial de O Município, com a divulgação de nomes. Ele disse que o seu objetivo sempre foi regularizar a situação, mas não gostaria que houvesse a exposição.

“Como médico eu também me senti bastante intranquilo quando da leitura daquela matéria. Neste momento em que estamos fazendo aquilo que nunca se fez, toda a população médica foi exposta, quando estamos reorganizando todo o sistema, a exposição vem à tona”, disse.

“Não entendi porque a classe médica foi exposta da maneira como foi exposta. Gostaria aqui de abraçar a nossa classe e principalmente a classe da atenção básica, que é quem mais sofre. Se alguém está errado está sendo cobrado, e nós como gestores estamos cobrando”.

O secretário disse, ainda, que os fatos vieram à tona “de uma maneira bastante aguda, fazendo com que haja, inclusive, um revés em muitas das conversas que estávamos tendo de maneira mais tranquila junto à classe médica”.

“Nos surpreende, mas a gente entende que notícia é notícia e notícia tem que ser divulgada”.

Ele pediu aos jornalistas, na coletiva, que transmitam à comunidade a informação de que a prefeitura trabalha para regularizar a situação, evitando que haja revolta popular. Ele relatou terem acontecido duas agressões a funcionários públicos por moradores revoltados com os fatos expostos.