Síndrome de Guillain-Barré: brusquense que teve doença rara relata sobre recuperação
Iraci Soares chegou a ser internada na UTI; outras quatro pessoas tiveram o diagnóstico neste ano em Brusque
Iraci Soares chegou a ser internada na UTI; outras quatro pessoas tiveram o diagnóstico neste ano em Brusque
Desde o início do ano, cinco pessoas foram atendidas pelo Hospital Azambuja com a síndrome de Guillain-Barré. Trata-se de uma doença rara, em que o sistema imunológico ataca os nervos. Um dos pacientes foi a faxineira Iraci Soares, de 64 anos de idade.
Em abril, Iraci foi diagnosticada com dengue e passou por três médicos. O tratamento não obedecia e ela ficou cada vez pior. Por duas semanas, a moradora do bairro Rio Branco sentiu que havia algo diferente no corpo. Ela estava sem apetite e sentia gosto de ferrugem na boca.
“Depois, na Quinta-feira Santa, eu estava pior. Comecei a sentir o formigamento na perna e depois já não conseguia mais andar direito. Entrei no Hospital Imigrantes com cadeira de rodas”, recorda.
Naquele momento, Iraci pensava que receberia o remédio indicado e iria melhorar. Com o fim da medicação, a equipe médica a enviou para casa e orientou ela a esperar pelo fim dos sintomas.
“Na sexta-feira de manhã eu não podia mais andar. Aí chamei os filhos, o corpo estava endurecendo. Das pernas, essa sensação começou a subir pelo corpo e já sentia nas mãos. Me joguei no sofá, meus filhos trocaram a minha roupa e fui para o Hospital Azambuja”, continua.
Na unidade hospitalar, Iraci foi atendida e fez o tratamento da dengue, mas novamente sem reação. Pelo contrário, ela só piorava. A primeira orientação médica era aguardar dois dias para a melhora. Contudo, a suspeita do médico do plantão era que ela teria essa síndrome rara, o que fez Rosângela, filha da Iraci, pedir pela internação.
“A doença poderia afetar os órgãos e eu poderia morrer. O médico ligou para o doutor Osvaldo [Quirino de Souza] e ele orientou me internar. Fiquei uma semana na enfermaria do hospital, tudo pelo SUS, conta.
Para comprovar o diagnóstico, Iraci foi examinada. De acordo com o médico neurologista Osvaldo Quirino de Souza, o diagnóstico ocorre pelo líquido cefalorraquidiano (LCR), o líquor na espinha, ou pelo eletroneuromiografia. No caso de Iraci, foi coletada água da medula dela e o resultado apontou pelo distúrbio autoimune.
“A doença é grave, pode levar a insuficiência respiratória e perda dos movimentos dos membros e até a morte”, ressalta o médico.
Após a confirmação, o próximo passo é ir atrás da medicação. No caso da síndrome de Guillain-Barré, é necessário receber a Imunoglobulina humana por cinco dias.
Segundo Osvaldo, o medicamento é fornecido pelo estado gratuitamente. O valor, caso Iraci tivesse que arcar sozinha, é de R$ 130 mil por dia. “O estado entrega esse remédio até no final de semana. Foi uma situação pontual, é sazonal. São de três a quatro casos por ano e até o momento nunca faltou essa medicação, até porque esse remédio é usado para outras patologias”, explica.
A aplicação do remédio poderia deixar Iraci abatida, já que ela não se alimentava direito naquela época por conta da dengue. No terceiro dia de tratamento, ela começou a sentir as reações.
“Comecei a piorar. Pelo meio-dia minha filha [Rosângela] foi almoçar, quando ela chegou [no quarto] ela me viu espumando, com a boca e dedos roxos. Ela só gritou para as enfermeiras, que examinaram a minha pressão, que estava em 28. Estava infartando. Buscaram oxigênio, me colocaram em cima de uma maca e fui para a UTI”, diz.
A partir daí, com os aparelhos, Iraci perdeu a consciência. “Só escutava a minha filha chorar ao meu lado. Fiquei dois dias inconsciente, entre a vida e a morte”, enfatiza.
A pressão de Iraci foi regulada e ela acordou. A traqueostomia a impedia de falar, mas ela conta que estava consciente e ficou duas semanas internada na UTI.
“Eu estava toda dura, sem conseguir me mexer. Minhas pernas pareciam que tinham dois sacos de cimento em cima. Eu só conseguia mexer um pouco a mão e os dedos”, relembra.
“Me falaram que a calma faria eu sair mais rápido do hospital, e fui melhorando. Na metade da segunda semana tiraram o traqueo. Eu achava que nunca mais iria falar e a andar daquele jeito”, continua.
Aos cuidados do neurologista Marcelo Jose Mandalis Swerts, Iraci iniciou a fisioterapia já no hospital e continuou a melhorar. No dia 6 de maio saiu da UTI e ficou dois dias em observação. No dia 8 de maio, dia das Mães, os médicos a liberaram para casa.
“Eu vim sem andar, praticamente sem musculatura. Fiz fisioterapia com um profissional particular, o Leonardo Fischer Neto, que me ajudou e me incentivou. Eu não sabia escovar os dentes, comer sozinha, ir ao banheiro, não sabia fazer nada, também precisava da ajuda dos filhos e da nora. Mas eu fui ficando boa”, relata.
A perspectiva médica era que Iraci voltaria a andar em quatro meses e poderia trabalhar em dezembro. Contudo, em dois meses Iraci já conseguiu andar sozinha e em três meses voltou ao trabalho como faxineira.
Iraci conta que, após quatro meses, ainda sente dormência nos dedos dos pés e na mão. “Ainda não consigo abrir uma garrafa de refrigerante, mas com o tempo [a dormência] vai sair. Vou voltar a minha vida normal”, completa.
No caso desta síndrome, Osvaldo aponta que ela pode acontecer após uma virose. Por exemplo, a infecção por Campylobacter, que causa diarreia, é a mais comum entre as que desencadeiam a doença.
Outras infecções que podem causar o distúrbios são: Zika, dengue, chikungunya, citomegalovírus, vírus Epstein-Barr, sarampo, vírus de influenza A, Mycoplasma pneumoniae, enterovirus D68, hepatite A, B, C, HIV, entre outros.
A incidência anual é de dois casos por 100 mil habitantes e pico entre 20 e 40 anos de idade. Entretanto, recentemente, os casos ficaram mais frequentes pois acometeram pacientes da Covid-19 e, mais recentemente, da dengue.
“Muita gente teve durante a Covid, mas o paciente estava entubado e não referia a perda de força. O diagnóstico era feito depois que ele acordava. Só que daí já estava em fase de recuperação, não havia investigação e nem medicação. Os nossos últimos pacientes foram formados principalmente após dengue, inclusive em adolescentes, sendo um de 15 anos”, detalha.
Conforme ele, o último caso registrado no município foi na última semana e, atualmente, não há internados no município. Ainda, há o registro de uma paciente que faleceu com a síndrome. “Os óbitos acabam acontecendo por conta de outras complicações, como infecções. A internação é muito prolongada”, ressalta.
“Não há um fator de risco claro de evolução da síndrome, que pode se desenvolver aleatoriamente após qualquer infecção viral ou bacteriana. A pessoa precisa ficar atenta, pois vem ao hospital após dez a 15 dias da infecção. Aí ela pode aparecer de uma forma leve a moderada e grave, a forma grave pode atingir o cérebro”, finaliza.