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Conheça as trigêmeas brusquenses que comemoram 80 anos neste domingo

Irmãs relembram histórias e momentos marcantes de suas oito décadas de vida

“Maria, senta você ali do lado da Josefina, que a casa é sua e você é a do meio”.

Na sala da casa de Maria, as trigêmeas Josefina Trena, Maria Poper e Eulina de Sousa se acomodaram no sofá, sentadas seguindo a ordem de nascimento. Aos 79 anos, as irmãs já estão acostumadas com entrevistas: “a cada quatro anos a gente fala com o jornal”, contam. Maria tem guardadas edições de O Município de 2004, 2008 e a última, de 2012, quando comemoraram 74 anos. No próximo domingo, 25, completam oito décadas de vida e de muita história.

As três nasceram prematuras, aos 7 meses, numa sexta-feira, dia 25 de fevereiro de 1938. A gestação tripla só foi descoberta na hora do parto. Foram batizadas pelo padre Germano Brandt no domingo, três dias após o nascimento. Josefina nasceu com 600g, Maria, com 800g, e Eulina, a última das três, com 1100g. Com medo de que “as meninas não se criassem”, a família encontrou padrinhos para as três e agilizou o batizado. “Minha madrinha disse pra a nossa falecida mãe, depois do batizado, que eu não chegaria viva em casa”, conta Maria.

Vindas de uma família grande, elas tinham outros dez irmãos, dois dos quais conheceram muito pouco e têm vagas lembranças, pois faleceram ainda na infância. “Era uma família bastante numerosa, para quem era tão pobre”, diz Eulina. “Nosso pai foi muito criticado quando nós nascemos, ele já tinha três filhos, e aí nasceram mais três de uma vez só”, conta Josefina. São o único caso de trigêmeas – ou mesmo de gêmeos – na família.

Relembrando os tempos de criança, Maria conta que quase não tiveram infância: começaram a trabalhar muito cedo, aos cinco anos, ajudando a família na lavoura. O pai trabalhava fora, e muito do sustento da casa vinha do que plantavam na roça. A escola das meninas era longe e, como não tinham carro, faziam o trajeto de 11 km à pé, todos os dias. E, depois de voltar da aula, ainda voltavam para o Centro para levar a marmita para o pai. Lá iam mais cinco ou seis quilômetros.

As irmãs Josefina, Maria e Eulina aos cinco anos de idade. | Foto: Acervo Pessoal

“A gente ia descalça mesmo. Perdíamos os chinelos e, quando nossa mãe comprou uma tamanquinho pra nós, ele dava calo nos pés, então a gente levava na mão”, riem Maria e Eulina. “Mas ruim era no inverno, os dedos do pé chegavam a congelar, a gente não tinha tênis pra usar.” Nostálgica, Josefina suspira: “Era tão bom… Queria que voltasse tudo”.

Com o apoio financeiro dos padrinhos, elas estudaram em um colégio de freiras, e as opiniões das irmãs se dividem: para Maria, “elas eram uns anjos pra nós”. Já para Josefina “elas eram terríveis! A escola era muito rígida, a Eulina era sempre a primeira da classe. Eu só não reprovei por causa dessas duas”, ri.

Estudaram até o quarto ano e, aos 12 anos de idade, deixaram a escola e foram ser “damas de companhia” de moças recém-casadas. “Companhia nada, a gente trabalhava igual escrava”, contam. Aos 14 anos, assumiram trabalho numa fábrica de fiação, a qual Maria gostava muito. “Se precisasse, eu trabalharia até no domingo, sem eles me pagarem nada”.

Uma das alegrias das três em relação à infância foi a inocência que tiveram e mantiveram até a adolescência. Contam que, quando a mãe estava grávida e prestes a dar à luz, elas iam dormir na casa de alguma tia: “Sua mãe está muito, muito doente”, as tias diziam, e as meninas, quando voltavam se deparavam com um novo irmão ou irmã.

“Lembra que eu até briguei com a tia, quando eu vi aquelas roupas de nenê? A gente nunca sabia de nada, ninguém falava sobre essas coisas”, diz Josefina. “E teve aquela vez em que a gente foi pra escola e, quando voltou, a mãe estava lá com o bebê no colo”, relembra Maria.

Assista ao vídeo em que as irmãs relembram histórias e momentos marcantes de suas vidas:

Os assuntos envolvendo sexualidade sempre foram tabu na infância e juventude das trigêmeas. “A gente falava sobre essas coisas entre nós, mas nunca com nossos pais.” Maria relembra o episódio de sua primeira menstruação, aos 14 anos, e de como foi uma surpresa para ela, que não sabia o que estava acontecendo: “Eu estava na igreja, de vestido branco, e escorria tudo… Cheguei em casa, me lavei e escondi as roupas manchadas debaixo do colchão”.

“Hoje em dia já é tudo diferente, a gente não tinha televisão, não via e não tinha como saber de tudo o que a gente vê e sabe hoje”, diz Eulina, quando as três comentam sobre como o mundo está diferente daquele em que elas cresceram. “E tinha menos gente também, então não acontecia muita coisa”, ri Maria.

Para elas, o segredo para chegar tão bem aos 80 anos é, principalmente, a união e a confiança que têm uma na outra. Sempre que podem, fazem visitas e ligam umas para as outras. “O telefone mesmo é uma bênção, ela me liga quase todo dia”, diz Maria, rindo e apontando para a irmã Eulina.

Juntas, as três contabilizam 15 filhos (dois já falecidos), 28 netos e 6 bisnetos. A expectativa é reunir quase todos – Eulina acredita “que vai dar umas 100 pessoas” – neste domingo, 25, para comemorar o aniversário triplo. Depois da missa pela manhã, a comemoração acontece na casa de Eulina, com almoço e festa para os familiares e amigos.