Trilha da Casa do Mel leva à antiga fábrica de beneficiamento de produtos coloniais
Trajeto tem encontro com rios, plantas e animais selvagens
Aos poucos, a natureza vai retomando o que lhe pertence. A própria Casa do Mel, abandonada, já está quase totalmente engolida pela mata e pelo limo. Com isso os trilheiros que aceitam o desafio de conhecer o local entram em contato com a natureza selvagem: são plantas, animais difíceis de serem encontrados na área urbana – como o saguis e inúmeros pássaros –, além de rios de tão difícil acesso que estão fora do mapa hidrográfico de Santa Catarina.
O trajeto é longo. Ao todo, sem contar paradas, são cerca de quatro horas de caminhada dentro da selva, sem acesso à rede telefônica. O trajeto exige um mínimo de preparo físico e, como não poderia deixar de ser, é fundamental a companhia de um guia especializado.
A alta umidade do local e a pouca entrada de sol devido à abundância das árvores mantém o ambiente resfriado, e agasalho é material indispensável. Além disso, a trilha obriga que as mochilas estejam bem equipadas com capa de chuva e mantimentos. O vento frio encana pelo caminho, e todo cuidado é pouco para evitar uma hipotermia.
O corte
Seguindo pela estrada geral do Lageado Alto, a entrada para a trilha da Casa do Mel tem como referência o restaurante Lá nas Trutas. Contudo, é preciso entrar à esquerda antes de chegar ao estabelecimento, em uma rua que segue para o Faxinal do Boos.
O acesso de carro passa a ficar difícil, e é preciso subir a íngreme e estreita estrada a pé. Antes do Faxinal do Boos, contudo, é preciso manter a atenção para acessar um ponto no meio do morro quase imperceptível aos mais desatentos: é o chamado corte. Uma abertura estreita no meio do morro dá acesso ao caminho.
Segundo o dono do restaurante Lá nas Trutas, Paulo Roberto Kormann, a abertura foi realizada sem utilização de maquinário. “Foi no braço. Os homens que abriram ali precisaram trabalhar por seis meses”, explica. A brecha foi realizada para a extração de madeira, sendo a canela uma das mais exploradas.
No coração da trilha
A caminhada pela fenda liga a trilha até a Casa do Mel. A reportagem deu início ao trajeto por volta das 14h30, em um dia de sol. Embora não chovesse há dias, a pouca entrada dos raios solares manteve o solo úmido e escorregadio, dificultando o passeio.
Logo são ouvidos os cantos de pássaros nada comuns na área urbana. No caminho também são encontradas araucárias, sinais da passagem de gralhas-azuis pelo local – ave responsável por disseminar a árvore ao estocar pinhões no solo.
Os feixes de luz que entram por meio de clareiras dão um belo toque à paisagem. O solo de pedras requer atenção, porque o risco de escorregões é grande. Outro fenômeno natural que vale destacar é a formação de arcos com os galhos, que conduzem o visitante como um portal natural.
A exuberância do local é complementada com os córregos que atravessam alguns dos caminhos. As calmas veias de água oxigenam o verde da mata e fazem a longa caminhada valer a pena. É possível encher a garrafa do trilheiro com a água pura da região, sem se preocupar com poluição ou sujeira.
Aproximadamente no meio do caminho para a Casa do Mel é possível encontrar a porteira do que um dia foi a Fazenda Siemsen. Os portões enferrujados e corroídos pela natureza são os elementos que mantém a memória da existência do local. Dentro, não há mais nenhuma estrutura. A mata tomou conta de todo o espaço.
A fazenda pertencia à metalúrgica Siemsen, mas foi abandonada e, aos poucos, destruída.
Cerca de uma hora depois, o destino final da trilha se aproxima. Quando o barulho de cachoeira é ouvido ao fundo é sinal de que a Casa do Mel está próxima. Por um pequeno trecho, um córrego toma conta do caminho e o trilheiro precisa caminhar por cima da água. Mais alguns metros e, atravessando um rio, chega-se ao grande objetivo da trilha.
História da casa
Conhecida como Casa do Mel, na verdade a estrutura foi construída para a produção de diversos produtos orgânicos – incluindo o mel. O proprietário do terreno era Klaus Guenther Hering, herdeiro da família proprietária da empresa de vestuário Hering, de Blumenau.
Formado em economia e filosofia, Hering passou a cultivar produtos orgânicos na intenção de oferecer uma alimentação mais saudável ao filho. Com a falência de sua seguradora, sua dedicação passou a ser totalmente voltada ao cultivo de produtos do campo.
Contudo, a formação do Parque Nacional da Serra do Itajaí e a proibição de plantio e extração de matéria-prima no local foi minando aos poucos o empreendimento. “Eu fui contra. Acredito que havia espaço para a produção, mas o parque foi formado sem consulta.”
Ele explica que chegou a movimentar um grupo de produtores locais na tentativa de evitar a criação do parque. Outro problema foi a falência de sua seguradora. “Quando ela encerrou as atividades, eu perdi as terras para o banco. Isso, junto ao parque, nos fez abandonar o empreendimento”, explica.
No local, havia centrífugas para a produção de mel e outros equipamentos industriais. Tudo furtado ano após ano, sendo que hoje é apenas uma estrutura prestes a ruir. A umidade já corroeu todo o telhado, e o excesso de infiltrações na laje da casa anuncia uma iminente destruição.
Serviço
Casa do Mel
Endereço: Rua Lageado Alto, bairro Lageado Alto
Acesso: Livre
Nível de dificuldade: Moderado
Riscos: Trilha escorregadia
Sinalização: Não há
Você está lendo: Casa do Mel
– Introdução
– Minas Abandonadas
– Carneiro Branco
– Mordida do Gigante
– Spitzkopf
– Mancha Branca
– Morro da Gueba
– Morro São José
– Serra do Paulo Kohler
– Morro Santo Antônio
– Trilha Graff
– Cachoeira Zimmermann
– Cachoeira Vicentini
– Cachoeira da Pedra Lisa
– Cachoeira da Lorena
– Cachoeira do Jerônimo