Uma praça
Gente pra lá e pra cá. Por lá vejo mais misturas que se permitem encontrar em pele mesmo. Mamães com carrinhos de bebê importados, outras que desceram do ônibus, crianças com cachorrinhos distintos e outras com os sem coleiras, bicicletas “posudas” e outras que dão para o gasto, molecada se pagando por meio das originais e outros por meio das falsificadas.
Boa parte das pracinhas de cidades pequenas são assim, democráticas, saladas coloridas, pessoal correndo o risco de esbarrar em desconhecidos, conviver, deixar crianças conviverem. Parecem até lugares felizes, provas que diferentes classes convivem em harmonia, será? Bem, mas isso tudo só se sustenta até o mendigo, ou a malacada, ou o lixo, ou os três, aparecerem. A tolerância é higiênica, portanto os que, ou, aquilo que é estranho e sujinho causa intolerância no lugar de despertar curiosidade e gerar compreensão.
Faz poucos dias que me rendi à brincadeira Pokemóm Go e fui caçar as criaturas fofinhas com a filharada. Como praças são lugares estratégicos para esse joguinho insolente, lá estávamos. Enquanto eu arregaçava mangas e calças para sentir o sol acolhedor em um dos bancos da pracinha, fiquei de olho nos pequenos.
Não demorou para meu filho criar uma rede de novas amizades. Ele e os primos iam pingando nos montinhos de pessoas que estavam de olho no celular e encostavam as cabeças dando “start” em conversas estranhas sobre bichinhos virtuais de um mundo paralelo. Aquilo foi me dando uma aflição.
O terror estrangulou-me nos gritos:
– Filhooo! Pessoal!
Eu previa alguém arrancando o celular das mãos deles, eu previa alguém os levando, eu previa o mal. Mas, por quê? Eu testemunhava uma interação incrível entre pessoas que nunca se viram e despenquei no medo.
– Ah, mãe! Espera!
Gente pra lá e pra cá. Sol sendo empurrado pelo vento, garotada solta e uns compartilhando o mesmo litro de coca cola, rindo alto, bem alto, uns descalços, uns com cigarros… Estava visivelmente insegura, mas por quê? Eu assistia os meus cheios de autonomia, se comunicando livremente, trocando, vibrando e eu não relaxei.
– Crianças! Vamos! Agora!
– Mãnheee!! Por favor!!
Sorrindo torto, fui costurando o caminho entre os estranhos e alcancei os meus. O pânico acossando meu calcanhar e os pré-conceitos nutridos em mim iam crescendo pelas orelhas e olhos de cada gente que estava ali. Agarrada nos braços das crianças, bem na linha de saída da praça eu sou enlaçada por:
– Moçaaa? Oh tiaaa!!
Finjo que não é comigo, persisto nas minhas crenças e previsões e sigo, embora a voz se reproduza e nela acompanhada o som da corrida atrás de mim.
– Oh, Moça! Tá surda? Tua bolsa ficou no banco.
Karline Beber Branco – professora (e mãe!)