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véu sem fim

um enjoo, aperto no peito, suador, nó no estômago, falta de ar, palpitações. Medo, nervosismo, preocupação. Todos esses sintomas podem ser um alerta do nosso sistema defensivo: a chegada de uma crise de ansiedade

em um dos cantos da  obra A odisseia, de Homero, Penélope é rodeada de pretendentes para um novo casamento, em virtude, da possível morte de Ulisses, que há vinte anos guerreava em Tróia. A jovem, que acomete em seu coração a esperança do amor que a “tudo espera”, cria o álibi de tecer um véu mortuário para o seu marido, que concluído, lhe obrigaria a casar novamente. Passa a tecer o véu durante o dia, e a destecê-lo à noite.

O mesmo acontece quando nosso olhar, “volta-se para fora”, quando incorporamos o tempo do mundo, como ritmo, destecemos as linhas que percorrem naturalmente nosso próprio corpo. Causador de um estranhamento interno, da ausência de se pertencer. Da aflição da descoberta de que: o tempo do mundo não cabe.

é indigesto, cruel, artificial. Anda sorrateiramente sobre os nossos olhos, sem amalgamar-se em nosso seio. Um encontro, desencontrado. Que por mais que se busque, se vai. Nos impregna de outros e nos impossibilita de “ser”.

 

quantas noites de insônia, dias de choro, de mau humor. Deprimido, aborrecido, colérico.

Quando apalpou o seu corpo, se olhou no espelho, leu Homero, se impregnou de si mesmo em um eterno retorno “para dentro”, ele chorou de emoção e descobriu que o seu próprio tempo era muito mais compreensivo.

Extasiado, em paz, ele parou de destecer-se. Havia retornado.

 


Méroli Habitzreuter
– escritora, pintora e ativista cultural