Votação sobre nepotismo na Câmara mostra como o mundo da voltas na política
Votação histórica
A primeira votação do projeto de lei que institui em Brusque legislação que veda o nepotismo cruzado entre os poderes Executivo e Legislativo já pode ser considerada histórica, embora ainda seja necessária sua confirmação, em uma segunda votação, a ser realizada provavelmente nesta terça-feira, 17. Trata-se de uma iniciativa ímpar, capitaneada pelo Observatório Social e por um grupo de vereadores, cujo objetivo é começar, debaixo para cima, a propor ideias de moralização da atividade política, mais do que necessária.
Clima tenso
Na sessão de votação, o clima era bastante tenso no início. Ainda não se tinha certeza de que o projeto teria votos suficientes para passar. A base do governo, por mais que se negue publicamente, veio determinada a barrar a votação do texto, ou pelo menos postergá-la. Tanto é que o pedido de vistas que adiaria a votação, de Waldir da Silva Neto (DEM), teve seis votos para aprovação, e só não passou porque o presidente da Câmara, Jean Pirola (PP), desempatou.
Artifício legal
Não obstante, o pedido de vistas, apesar de ser um meio legal, é, como disse o vereador Marcos Deichmann (PEN), apenas um artifício para postergar a aprovação da matéria. Ora, o tema do projeto de lei está há meses em todos os meios de comunicação e domina roda de conversas na cidade. Qualquer cidadão que cair hoje em uma cadeira do Parlamento municipal saberia do que se trata, e teria como votar sim ou não. A alegação de que não se conhece o inteiro do projeto, se tida como verdadeira, demonstraria tão somente falta de interesse pelo debate político.
Pressão que funciona
Nesta votação, outro fator também preponderou. Ao contrário do que havia acontecido no projeto de lei apresentado para proibir vereadores de assumirem cargos na prefeitura, os parlamentares sentiram a pressão popular, tanto feita pela população quanto por entidades representativas. Isso pode ser visivelmente percebido com a sequência dos placares de votação, que mostram que a resistência à aprovação do projeto foi diminuindo conforme avançava-se os debates na Câmara.
Resistência esvaiu-se
No pedido de adiamento da discussão, por exemplo, toda a base do governo votou a favor, com o intuito de adiar o debate. A votação ficou em 7 a 6. Na sequência, votou-se a emenda de Ivan Martins (PSD), que queria excluir os secretários do alcance da lei – uma jogada claramente imoral. Ela foi derrubada por 9 votos a 4. A cada votação, aumentava o clamor na plateia. Repare-se que, até esse momento, havia quatro votos em favor da exclusão dos secretários da lei. Na sequência, entretanto, votou-se a emenda de Paulo Sestrem, que incluiu os secretários no alcance da lei. Nessa votação, foi 11 a 1: apenas Martins foi contra.
Com a maré
A sequência de resultados diferentes deixa claro que havia diversos vereadores inclinados a votar contra o projeto, mas, por pressão popular, tiveram que se juntar à maré vencedora. A população, entretanto, não é tola, e não terá dificuldade de diferenciar os votos sinceros ao projeto, daqueles que desde o começo o defenderam, e os votos que vieram com o único intuito de não se queimar perante a opinião pública.
Força da oposição
Nessa votação, a oposição mostrou força ao conseguir barrar todas as artimanhas contra a aprovação do projeto. Resta saber se o resultado será o mesmo na próxima semana, quando o projeto precisa ser aprovado novamente para poder virar lei. Isso, entretanto, vai depender da sanção ou veto do prefeito Jonas Paegle, o qual é escorregadio quando envolvido em temas polêmicos. Cabe lembrar que, no discurso público, ele defendeu que vereadores não assumam cargo no governo, ao mesmo tempo em que nomeou um vereador para comandar a educação.
O mundo da voltas
Outro aspecto trazido à tona pela votação deste projeto é que, na política, o lado que se está depende da posição que se ocupa na vida pública. Nos arquivos do jornal O Município está registrada a história de Brusque, e aquilo que foi dito e não dito no passado. Nesses arquivos, localizamos matéria sobre uma votação semelhante, realizada em 2013, que mostra posicionamentos antagônicos de personagens de ontem e de hoje.
Mudança na lei
À época, a legislação municipal sobre nepotismo estava sendo adequada à lei federal. Ivan Martins (PSD), então vereador, apresentou uma emenda com objetivo de incluir inciso que descarta a contratação, pelo Legislativo e Executivo, de cônjuge, companheiro ou parente, inclusive como agentes políticos. À época, justificou a necessidade de que Executivo e Legislativo não tivessem amarras políticas ligadas a cargos comissionados. À época, não defendia a inconstitucionalidade.
Base do governo
Por outro lado, vereadores que à época compunham a base do governo, como Marli Leandro (PT), defenderam a inconstitucionalidade da proposta apresentada por Martins. À época, o alvo da oposição era a secretária de Governo e Gestão Estratégica, Ana Ludvig, esposa do então vereador Valmir Ludvig. Naquela época, contudo, a oposição não teve força ou votos para aprovar a mudança na lei anti-nepotismo. Quem está no governo, por sua vez, tem sempre a vergonhosa tendência de se agarrar às regalias e vociferar, o tempo todo, a palavra inconstitucionalidade.