Hoje a gente dá uma pausa na nossa listagem de destaques musicais de 1977 para dar vez e voz para o Luís Brusque, testemunha ocular e fotográfico de um fato histórico, que marcou 1977 na região. É dele todo o depoimento super saboroso que temos aqui abaixo. Pena que não deu para trazer para cá todas as lembranças que ele resgatou. Prepare-se para uma viagem no tempo muito pouco documentada. Com você… Luís e o Camburock, festival que aconteceu nos dias  28, 29 e 30 de janeiro de 1977 na praia do Estaleiro.

“CAMBUROCK 77 – 1º FESTIVAL NACIONAL DE ROCK foi um empreendimento do empresário da noite de Balneário Camboriú, Emery Lenz. Nessa época, Ademar Tomazoni, também um empresário da noite, de Brusque, estava fazendo umas parcerias com Emery em Balneário, então acabou sendo um auxiliar do colega e divulgador do evento com seu fusca e suas cornetas de som.

Lembro de pintar alguma coisa no fusca e seguir com Ademar para a praia. Ele arrumou um crachá em nome do Cogumelo Atômico para eu ter livre acesso ao palco. Isso significava que eu poderia ficar no palco durante os shows para fotografar as bandas. Acho que eu tinha uma Yashica da mais básica das básicas.

Não existia camarim, não existiam estrelas intocáveis do rock, não existiam seguranças lutadores, aliás, existia pouca coisa além de um grande palco, bem equipado e cheio de luzes, construído de madeira e coberto de lona. Veja Woodstock, era daquele jeito. Uma lona esticada fazia a função de camarim para a privacidade inexistente dos músicos.

Não posso falar pela visão dos outros, só posso falar pelo que consigo lembrar depois de 40 anos, e isso faz a diferença nas histórias contadas por quem estava lá. São perspectivas de vários ângulos. Mas o sol estava de rachar, isso eu sei. Passei algumas horas embaixo do palco (sombra) junto com trocentas pessoas, comendo abacaxi cru, era o que as moedas podiam comprar.

A galera estava lá, Buss, Tuti, Beto Krieger e Valter Seyferth, eram esses que caminhavam juntos pela área. Uma noite dormimos na praia, ao relento, cada um enrolado no seu cobertor. De manhã era só areia, até nos olhos. Não me pergunte como a gente se alimentava, não lembro, água eu buscava no caminhão pipa fornecido pela organização. Ademar trazia sanduíches de Balneário, bolachas também.

Sol rachando, Buss e eu sentados num tronco caído e vem um hippie cabeludo e barbudo claudicando, senta com a gente e a conversa adentra as grandes falas daqueles tempos: “- E aí bicho? –Tudo em cima? – Sóóó´!” E o papo cabeça segue, os amigos fumam e o visitante levanta para seguir caminho. Buss tenta convence-lo a ficar ali mais um pouco, a conversa estava boa. Mas ele diz que tem que ir porque daqui a pouco irá cantar. Hum, ok! Daqui a pouco é anunciado o Bixo da Seda, a banda que estávamos esperando para assistir. E olha lá quem está cantando, era o Fughetti, o mesmo cara dos altos papos. Foi só isso.

Dizem, na internet, que o Eduardo Araújo não foi ao festival enquanto outros dizem que ele se apresentou, inclusive dando bronca na plateia. Bom, uma chuva braba de verão causou pane na aparelhagem e as bandas aguardavam tudo estar seco e seguro para continuar os shows. Eu estava sentado no fundo do palco, jogando conversa fora com o Percy (Made) quando vem chegando o Eduardo Araújo com a guitarra no case. Veio em nossa direção, fiz uma foto quando chegou perto, cumprimentou e perguntou sobre uma previsão de hora para tocar. Percy levantou e foram em busca da resposta. A foto, em preto e branco, perdi na enchente.

Casa das Máquinas foi um outro capítulo da história. Eles eram os mais festivos, aguardando a vez de assumir o palco, Simbas pede para eu fazer uma foto da banda. Aprontei a maquininha, filme pb no gatilho, todos se enfileiraram lado a lado. Fiz a foto. Todos juntos se viraram de costas, baixaram as calças mostrando as bundas. Fiz a foto também. Os caras eram muito engraçados. Segui fazendo mais algumas fotos deles conversando e brincando. Todas perdidas, com os negativos, na tal enchente.

Muitos anos depois, quando o Diego “Memphis Rock” Vechi trouxe o Casa das Máquinas para tocar em Brusque na Grau, a banda veio com três remanescentes da formação clássica – os irmãos bateristas Netinho e Marinho Thomaz mais o tecladista Mario Testoni Jr. Num almoço que fui fotografar, Demian Moritz comenta com Netinho que eu estava lá no Camburock. Pensa na alegria do baterista, fez eu prestar depoimento confirmando que eles tocaram no festival em 77. Claro que sim, eles tocaram. Os músicos novos estavam achando que era conversa mole de velhões. Fui cúmplice na afirmação.

Também lembro do Som Nosso de Cada Dia, do Made in Brazil, dos Krishnas, do Bixo da Seda e os outros evaporaram da minha sempre parca memória. Lembro do Ezequiel Neves (aka Zeca Jagger) passeando de buggy no meio do público. Polícia, muita polícia, vira e mexe tentando resgatar algum filhinho e filhinha de papai e mamãe que fugiu de casa e caiu naquela perdição do rock. Sem contar as drogas, a polícia vinha atrás de drogas. Estava no lugar certo.”

 

Obrigada, Luís!