João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

500 Anos de Circum-Navegação e o Brasil

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

500 Anos de Circum-Navegação e o Brasil

João José Leal

A roda da história completou mais um longo ciclo. Cinco séculos se passaram desde que, em 20 de setembro de 1519, Fernão de Magalhães deixou o porto de Sevilha para navegar em torno da terra.

Obstinado, como todo desbravador das coisas desconhecidas, o ousado navegador português, a serviço da coroa espanhola, acreditava que iria encontrar uma segunda rota marítima entre a Europa e o longínquo Oriente, especialmente, as Índias. E, assim, desafiou os perigos e mistérios dos mares, em busca das tão valiosas e cobiçadas especiarias. Era uma época em que a canela, o cravo, a pimenta e a noz moscada valiam fortunas, que só chegavam à mesa dos muito ricos.

A data merece uma crônica, pois Fernão de Magalhães aportou no Brasil para reparar e reabastecer suas caravelas. Se navegar era preciso, alimentar os corpos de 240 marujos era, também, indispensável. Sobre a histórica viagem, o italiano, Antônio Pigafetta, escreveu um longo diário. Anotou que a frota parou na baía de Guanabara e que o capitão Magalhães, não encontrou dificuldade para encher os porões das suas cinco caravelas, com água fresca e comida.

Deve ter sido uma animada festa da gastronomia e da gula marítima. Afinal, os marujos tinham navegado por mais de mês, sonhando com água e comida fresca. Aproveitando-se da bondade e ingenuidade dos silvícolas, os navios foram facilmente abarrotados de galinhas, batatas, frutas tropicais e carne de anta, que seria “parecida com carne de vaca”, além de um fruto, “além de ‘pinãs’ muito doces”, o nosso abacaxi. Outros produtos exóticos das tropicais terras brasileiras, devem ter empurrado os famintos marujos e garantido os alimentos para a continuação da viagem, rumo ao sul do continente.

O diário de bordo continua revelando a exploração, chamada de “troca vantajosa”, a que foi submetido o indígena brasileiro: “por um anzol ou por uma faca, nos deram cinco a seis galinhas; por um pente, dois gansos; por um espelho ou uma tesoura, o pescado suficiente para comerem dez pessoas; por um guizo ou por um cinto, os indígenas nos traziam um cesto de batatas, nome que dão aos tubérculos que são mais ou menos a figura de nossos nabos e cujo sabor é parecido ao das castanhas”.

Pigafetta descreve, ainda, a esperteza dos marujos espanhóis para “negociar” com os inocentes nativos brasileiros: trocavam cartas de baralho, “um rei de ouro, por seis galinhas” e os nossos indígenas ainda “acreditavam ter feito um magnífico negócio”. Sobre a antropofagia, anotou que “eles (os indígenas) comem algumas vezes carne humana, porém, somente a de seus inimigos”. Mas, não seria “por gosto ou apetite” e, sim, por uma crença de que, comendo a carne do inimigo, se sentiriam mais fortes.

O relato do escrivão da viagem de Magalhães mostra, com clareza e sem dissimulação, como a nossa gente foi enganada e espoliada pelos colonizadores europeus, que se consideravam um povo superior. E, por isso, com direito a impor, a ferro e fogo, os seus costumes, a sua religião, o seu modo de vida, para submeter os “outros” povos não europeus a um perverso processo de exploração das riquezas produzidas na América, na África e na Ásia.

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