Editorial: a segurança enxugando gelo
O noticiário nacional traz diariamente informações da questão de segurança do Rio de Janeiro, que chegou num ponto de ruptura e precisou de uma intervenção militar. Em novembro do ano passado, antes de pedir exoneração, o secretário de segurança Roberto Sá falou numa entrevista que “ temos uma impunidade que fomenta a violência”. Na ocasião fez duras críticas a penas que considerou brandas e que neste sistema não resta outra situação: “temos que continuar a enxugar gelo”.
À primeira vista nos sentimos distantes da realidade do Rio, mas podemos estar equivocados. Em matéria publicada semana passada aqui n‘O Município, vimos que o número de roubos diminuiu em 46% em 2017 em relação a 2016. Foram 94 casos contra 202. Em relação aos furtos, foram 662 incidências, 38 a mais do que no ano anterior.
Em relação aos homicídios, foram seis no ano passado. Um número maior que 2017, que teve quatro, mas muito melhor que a média do estado, que em 2017 teve 14 mortes por 100 mil habitantes.
Mesmo com números crescentes de furtos e homicídios ainda estamos dentro de uma situação privilegiada, mas temos que fazer uma ponderação. Estes números foram feitos a partir de um levantamento da Polícia Militar, captados pelo 190 e que tiveram uma checagem por parte da corporação.
Não estão computados assim todos os chamados e nem os dados advindos de registros da Polícia Civil. Desta forma podemos afirmar que eles servem como uma amostragem, mas não como a realidade total dos crimes praticados por aqui.
Outra situação: as causas que afetam o Rio são as mesmas que nos afetam. O sistema jurídico é idêntico. Tanto no Rio como em Brusque. A polícia prende um ladrão com uma TV em flagrante.
Ele é conduzido a delegacia e em seguida, solto. Para ficar preso o meliante tem que ter uma ficha caprichada, e estar incomodando muito. Neste caso talvez fique preso dois ou três dias. A impunidade é a certeza de que o crime compensa.
Não podemos achar que este bem-estar vai durar para sempre. Os números mostram uma tendência à criminalidade
Mesmo aqueles que são condenados gozam de um privilégio impensável. Temos em torno de 200 apenados condenados ao regime semiaberto e aberto, mas como não há albergue e nem tornozeleiras eletrônicas em Brusque eles estão tão livres como qualquer cidadão de bem.
No Rio, o tráfico de drogas se aproveitou desta leniência para fazer seu império e estabelecer seu território. Por aqui, esta atividade começa se alastrar também. Segundo o comandante da PM, Moacir Gomes Ribeiro, ainda na matéria da semana passada, nunca a apreensão de drogas foi tão alta.
Em 2017 foram apreendidos quase 140 quilos de maconha, nove quilos de crack e dois quilos de cocaína. “O tráfico é um chamado para o crime: causa furtos, roubos, homicídios” afirmou.
Um outro fator que chamou a atenção da Polícia Militar nos últimos três anos é a participação de menores, tanto no consumo quando no tráfico de drogas. Numa escala menor, até nisso estamos seguindo o modelo carioca. Neste assunto o Conselho Tutelar precisa sair de sua área de conforto e agir para evitar que o menor de hoje se torne o bandido profissional de amanhã.
O que ainda nos torna especiais neste cenário são dois fatores. Primeiro, temos uma economia forte, que dá oportunidades de renda e emprego às pessoas. Em segundo lugar, há um esforço de lideranças e da polícia em combater o crime e conscientizar o cidadão. Iniciativas como a Transitolândia e o Proerd são modelos para o estado.
Mas não podemos achar que este bem-estar vai durar para sempre. Os números mostram uma tendência à criminalidade. Este cenário precisa ser revisto como uma prioridade da cidade. Os sintomas que adoeceram o Rio são os mesmos que estão adoecendo Brusque e não adianta achar que a polícia sozinha vai resolver o problema.
Aliás, hoje temos um dos piores índices de policiais por habitantes, (mais de 1000 habitantes por policial). A falta de efetivo e de estrutura para combater o crime dá a impressão que “a polícia está enxugando gelo”, afirmou o comandante Gomes, coincidentemente os mesmos sentimento e frase proferidos pelo ex-secretário carioca, Roberto Sá, antes da intervenção.