A estratégia da mentira
O filósofo grego Aristóteles montou um esquema geral de investigação, que é o modelo fundamental de todo conhecimento científico: estrita observância dos fatos e grande rigor no pensamento lógico e na linguagem. Seu trabalho foi desenvolvido com imenso labor durante a Idade Média, especialmente na chamada “filosofia escolástica”, na qual qualquer questão era minuciosamente analisada, todos os prós e contras eram postos na mesa, e até objeções possíveis eram criadas para que o assunto ficasse o mais claro possível. Na filosofia escolástica temos o mais fino exemplo de honestidade intelectual e espírito científico. O nome geral dado a esse método é “Dialética”, pois consiste no diálogo contínuo entre teses opostas, pormenorizadamente analisadas, até que não reste dúvida sobre o assunto. Quando não era possível chegar a uma conclusão apodíctica, abria-se espaço para as diferentes opiniões, até que uma nova evolução no estado de coisas tornasse possível o acordo.
Com o advento da modernidade, no entanto, esse rigor se afrouxou e começaram a pipocar filósofos para todos os lados, afirmando quaisquer bobagens, sem uma rigorosa comunidade científica que lhes pudesse corrigir os erros. E assim nasceu a chamada filosofia moderna, tentando reinventar a roda e rediscutir, normalmente de maneira débil, questões que já haviam sido debatidas há séculos. Um dos frutos dessa mudança de atitude foi a descrença gradual na verdade. Filósofo após filósofo, o caminho foi sendo aberto para a ideia mais difundida no meio intelectual contemporâneo: a de que não existe verdade. Qualquer estudante de ensino médio é capaz de afirmar isso com o peito estufado, com ar de quem está proferindo um oráculo, e não uma rotunda asneira. Esse estilo de vida intelectual se organizou bastante após o século XIX, e virou militância cultural e política. O objetivo dessa nova intelectualidade não é conhecer a verdade, posto que já duvidam dela de saída. Trata-se de construir uma realidade nova, alternativa, destruindo sistematicamente tudo que se coloque no caminho. Ora, se não existe verdade, ninguém precisa admitir erros. Como o que interessa é o resultado que se quer produzir, então as opiniões podem mudar ao sabor do vento e das conjunturas.
Tudo isso está por trás do que representa o “fenômeno Lula”. Não adianta tentar entender o que se passa na cabeça dos seus defensores usando uma lógica normal e buscando coerência. Embora os intelectuais que o defendam gostem de ser chamados de “dialéticos”, fazem o extremo oposto do fino método medieval. Não discutem, pois qualquer superficial discussão exporia a falta de sustentabilidade de seus discursos. Repetem para si mesmos as mesmas palavras de ordem e ameaçam com a violência de seus grupos articulados para essa finalidade, como o MST e o MTST. Criaram a Lei da Ficha Limpa, mas agora querem rasgá-la para insistir na candidatura do Sr. Mentira. Dizem defender a democracia, mas desrespeitam e ameaçam as instituições democráticas quando decidem contra seus interesses, além de serem defensores enfáticos de ditaduras obsoletas. Como Aristóteles faz falta!
Lula já é página virada, mas levará muito tempo ainda para colocar nos eixos nossa cultura e nossa vida intelectual.