João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Fotógrafo da família reunida

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Fotógrafo da família reunida

João José Leal

Quando visitamos uma família amiga, da geração que está passando o bastão para essa nova tribo que vai continuar a corrida pela sobrevivência da nossa espécie, é comum ver aquela foto emoldurada, pendurada na parede. Ou, então, o porta-retrato em cima da pequena mesa, num canto da sala. É aquela tradicional foto da família.

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Tirada num passado já distante, o casal ainda jovem, os filhos pequenos, a foto logo desperta o interesse do visitante. Cheios de curiosidade, procuramos identificar cada um dos personagens da família, que envelheceram e mudaram a aparência física, porque o tempo implacável passa, marcando nossas vidas com rugas no rosto e brancura e calvície na cabeça.

Esse retrato da família, tão comum numa época que passou, era fruto do trabalho de um profissional que luta para se manter no mercado atual, invadido por câmeras digitais disfarçadas na pele de um telefone celular. Estou me referindo, claro, ao fotógrafo dos retratos de família. Cada cidade, que não fosse um simples povoado, tinha ao menos um desses tradicionais artistas da arte do retrato familiar estampada na fotografia em papel.

Quando cheguei em Brusque, havia muito mais fotógrafos profissionais, com seus estúdios como o atual Foto Primavera, que mantêm a tradição da fotografia revelada sobre papel.

Na minha infância, em Tijucas, o Foto Vadinho marcou época. Era desejo de consumo de cada família que se prezasse, um dia ter a sua sessão de fotos com o ilustre profissional tijuquense, consagrado artista da fotografia. Para a dona de casa, mãe de muitos filhos, o retrato da família reunida, numerosa prole de pais, filhos, sempre mais de cinco, acrescida dos avós porque sogra adora ser fotografada, era um desejo que nenhum marido podia negar à matriarca, a rainha-escrava do lar.

No estúdio, a família reunida para o retrato oficial. Nas costas da tribo, o conhecido e romântico cenário, com pinturas de árvores, flores, pássaros e riacho terminando em cascata. Olhares assustados, fixados na lente da Rolleiflex, fisionomias circunspectas, até carrancudas que sorrir era proibido. O pai de paletó e gravata, chapéu na mão, sentado e rodeado pelos filhos. Ao seu lado, a mãe, o melhor vestido de festa, o coque por penteado, também sentada e sempre um filho no colo porque a maternidade era missão sem fim.

Em volta do casal, os filhos com roupa da festa da primeira comunhão ou do Divino Espírito Santo, sapato e meia, mesmo que o dia-a-dia fosse de pé no chão, arando poeira nas ruas sem calçamentos da velha Tijucas.

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Não era somente a foto no ateliê. Muitas fotos da família antiga foram tiradas em plena praça principal da cidade. A enorme máquina fotográfica, estranha e assustadora geringonça, com um negro pano em forma de camisa pendente, ficava estaqueada sobre um tripé, à espera dos visitantes vindos dos lugarejos e das pequenas cidades do interior.

Família reunida para a pose solene, o fotógrafo mandava olhar o passarinho, metia a cabeça naquela camisa negra para enquadrar a tribo e apertava o botão para o clique da transformação da figura real em imagem revelada.

Hoje, tempo de telefone-câmera nas mãos, vivemos tirando fotos. Somos todos fotógrafos competindo com o profissional da fotografia e já não temos mais tempo para ir a um estúdio tirar o retrato da família.

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