Há 110 anos, primeiro jornal da história de Brusque mudava de nome e passava a ser editado em língua portuguesa
Data marcou a transformação do Brusquer Zeitung para Gazeta Brusquense
Data marcou a transformação do Brusquer Zeitung para Gazeta Brusquense
Há exatamente 110 anos, em 31 de outubro de 1914, o primeiro jornal da história de Brusque, o Brusquer Zeitung, foi publicado pela primeira vez em português. Fundado em 1º de janeiro de 1912, o semanário até então circulava exclusivamente em alemão. Com a transição para o novo idioma, o jornal também adotou um novo nome: Gazeta Brusquense.
Segundo o pesquisador e escritor Saulo Adami, o Brusquer Zeitung foi idealizado (e redigido em alemão) por Otto Gruber. Além de redator, o imigrante alemão liderou um grupo de teatro formado por meninas, entre 1910 e 1915, e presidiu a Sociedade Esportiva Bandeirante de 1913 a 1920.
“Há quem diga que uma cidade se conhece através do jornal que ela edita. Sendo assim, os brusquenses conhecem sua cidade, via imprensa, desde quando Otto publicou a primeira edição do Brusquer Zeitung”.
Sobre o fato de Brusque ter ‘demorado’ para ter um semanário em português, o renomado pesquisador e fundador do Museu Casa de Brusque, Ayres Gevaerd, afirmou que a fundação e circulação de um jornal em alemão justificava-se pelo pouco conhecimento do português entre a população.
Como base de sua tese, Ayres afirmava que o jornal O Novidades, de Itajaí, publicava muitas notícias sobre Brusque, porém em português, fazendo com que fosse lido por poucos.
Foi nesse momento que a “barreira da língua” se tornou evidente, já que, na época, Brusque não contava com ensino público. Ou seja, os moradores só podiam estudar em escolas particulares, onde o ensino era exclusivamente em alemão.
Segundo Saulo Adami, o Gazeta Brusquense “foi uma alternativa que os editores da versão em alemão encontraram para atingir os leitores que não liam ou falavam a língua dos primeiros imigrantes”. Embora poucos, eles existiam e cada vez mais aumentavam sua presença na cidade.
Além disso, a mudança também teria ganhado força com o início da Primeira Guerra Mundial. O conflito militar de escala global, com foco na Europa, começou em 28 de julho de 1914 e se estendeu até 11 de novembro de 1918. Porém, um ano antes de ter fim, em 1917, foi determinada a suspensão de publicações em idioma alemão pelo Governo do Brasil.
Segundo a jornalista Bárbara Sales, em poucos meses, a vida dos moradores de Brusque mudou drasticamente, já que a cultura alemã, que influenciava fortemente a rotina da população desde a chegada dos primeiros imigrantes em 1860, foi silenciada.
“Toda a população ficou apreensiva, e qualquer ocorrência na sede causava a retirada das famílias mais receosas para o interior. As celebrações de missas e cultos, as atividades sociais, as aulas nas escolas e o jornal Brusquer Zeitung foram proibidos de circular em língua alemã”.
Otto Renaux presidiu o grupo de acionistas que orquestrou e manteve o Brusquer Zeitung. Para Ayres Gevaerd, o jornal “certamente não visou lucros”.
“É possível que tivesse contribuído para o seu lançamento um pouco de propaganda dos sentimentos da cultura germânica, tão exaltada naqueles tempos, principalmente nos lugares onde predominava o elemento étnico alemão”, disse historiador. A fala é citada no livro “Brusque: Cidade Schneeberg”, de Saulo Adami.
Outros redatores do Brusquer Zeitung incluíram o cônsul Carlos Renaux, que atuou de 24 de abril a 13 de novembro de 1915, e Moritz von Schoenebeck, que foi seu gerente de 13 de novembro de 1915 até o fechamento do jornal em 23 de outubro de 1917.
“Em 1922, Arthur Gevaerd adquiriu o jornal, a tipografia e a livraria que pertenciam à empresa, permanecendo no comando até 1925, quando vendeu para Otto Demarchi. Durante esse período, passaram pela redação Arthur Gevaerd e A. M. da Silveira. Otto Demarchi e Arthur Gevaerd ‘sustentaram o jornal’ até 1928”, complementa Saulo.
O artigo “Brusquer Zeitung”, escrito pelo historiador e colaborador da Fundação Cultural de Brusque, Álisson Sousa Castro, analisou 53 edições do Brusquer Zeitung para obter uma compreensão abrangente do estilo de conteúdo publicado.
De acordo com o estudo, das 53 edições examinadas, 45 apresentavam uma única manchete principal, enquanto outras 8 edições tinham duas ou até três manchetes principais.
Entre essas manchetes, 16 estão relacionadas à Alemanha; 16 a assuntos locais ou ao Brasil; 4 aos Estados Unidos e à Inglaterra; e 2 cada uma à França, Itália, Europa, Ásia e aos Bálcãs.
“Quando se fala de Alemanha, as principais notícias dividiram-se entre as temáticas do campo econômico, político e militar da Alemanha. Já com relação ao Brasil, trataram do cotidiano (volta às aulas), economia (indústria e agricultura), efemérides (4 de Agosto e 7 de Setembro), infra-estrutura (energia e transporte) e figuras políticas de renome (Lauro Müller e Rio Branco)”.
Sobre os Estados Unidos e o Reino Unido (Inglaterra), o assunto, segundo o historiador, é predominantemente a política.
No mesmo artigo é citada uma fala da historiadora brusquense Giralda Seyferth, já falecida. Na ocasião, Giralda afirmava que “os jornais em língua alemã que circularam no sul do Brasil até 1941 se consideravam, sem exceção, como defensores do ‘Brasilianisches Deutschtum’ (germanidade brasileira).
A germanidade brasileira é um sentimento cultivado por emigrantes que tiveram em seu país de origem a formação recente do Estado nacional (Alemanha e Itália) em que o principal fator de coesão é identificado como a língua e união em torno de um inimigo em comum.
“Esta germanidade, ou Deutschtum, acabou ganhando contorno do Brasilianischer Deutschtum, ou seja, uma germanidade brasileira em que uma parcela de imigrantes italianos acaba aderindo à cultura germânica compartilhando alguns signos em comum – tendo feito neste sentido o jornal a contribuição para a coesão grupal”, publicou Álisson.
Kai-Fáh: Luciano Hang foi dono de bar em Brusque, onde conheceu sua esposa: