ICMS é transformado em recurso destinado à duplicação da rodovia Antônio Heil
Parceria entre a empresa Irmãos Fischer e o governo do estado permite que a duplicação se torne realidade
Parceria entre a empresa Irmãos Fischer e o governo do estado permite que a duplicação se torne realidade
Com um tráfego diário de aproximadamente 20 mil veículos, a rodovia Antônio Heil (SC-486) é a principal entrada para o município de Brusque. A via liga a BR-101, em Itajaí, a Brusque, e possui trecho de 21 quilômetros de extensão. A duplicação, que sempre foi um desejo dos brusquenses, começou a se concretizar no fim de 2013, quando as obras no trecho que pertence ao município – cerca de quatro quilômetros – iniciaram.
A melhoria na infraestrutura da rodovia, no entanto, só foi possível graças a parceria firmada entre o governo do estado e a empresa Irmãos Fischer, fabricante de eletrodomésticos, equipamentos para construção civil e de bicicletas. Com isso, o recurso destinado à obra é investido por meio da tributação diferenciada do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Esta modalidade de parceria público-privada (PPP) é recente em Santa Catarina. O convênio assinado com a empresa brusquense e que possibilitou a execução da obra na rodovia Antônio Heil, foi o terceiro do estado.
A proposta de parceria com o governo estadual para a duplicação partiu do diretor-presidente da empresa, Ingo Fischer. Durante um encontro com o governador Raimundo Colombo, em Florianópolis, o empresário levantou a hipótese de investir o dinheiro que pagaria ao Estado por meio do ICMS para o pagamento da duplicação da rodovia.
“Na ocasião, o governador disse que iria analisar a proposta porque não é muito comum fazer este tipo de parceria entre empresa e estado, já que envolve muitas coisas em todo o processo”.
Contudo, 15 dias depois da conversa, Colombo entrou em contato com Fischer para informar que o estado aceitaria a parceria, desde que a empresa tenha condições de pagar a obra. “Foi aí que solicitamos o projeto da obra e o orçamento para o Deinfra [Departamento Estadual de Infraestrutura]. Eu precisava destas informações para ver se tínhamos todas as condições para pagar a obra”.
Depois do projeto e orçamento prontos, Fischer chegou a conclusão que a empresa tem arrecadação suficiente de ICMS e que, portanto, poderia duplicar os quatro quilômetros da rodovia que pertencem ao governo estadual em Brusque. “A partir daí, começamos a tramitação do processo com a Secretaria de Estado da Fazenda. Nesse processo, está estipulado que a Irmãos Fischer deixa de pagar esses recursos para a Fazenda e passa a pagar a duplicação da rodovia”.
Dos trâmites burocráticos até a autorização para o início das obras, levou cerca de um ano. “Eu insisti com o governador porque é uma obra de muita necessidade para Brusque. Vai beneficiar toda a população”.
Ao todo, os quatro quilômetros de obras na rodovia Antônio Heil custarão em torno de R$ 35 milhões para a Irmãos Fischer. Neste valor, já estão incluídas as indenizações – aproximadamente R$ 10 milhões -, que também foram pagas pela empresa brusquense.
“Esta é uma grande parceria que o governo faz com as indústrias, ajudando o município a melhorar sua infraestrutura. Além disso, ao invés de mandar os recursos do ICMS para o Estado, ele fica para o município em si, então quem ganha com isso é a nossa população, é o povo que mora em Brusque e também os que utilizam a rodovia”, destaca o empresário.
O sistema
Primeiro, a empresa que executa a obra faz contratações de empresas de engenharia e supervisiona a execução. A Irmãos Fischer faz os pagamentos mensais, conforme o andamento da obra, sob supervisão do Deinfra. Somente depois da verificação do andamento da obra, a empresa terá direito a um crédito de ICMS, que diminuirá o valor do seu recolhimento mensal.
Parceria público-privada é aposta da Fiesc
Entre as bandeiras da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc) estão as parcerias público-privadas e as concessões. Para a entidade, elas representam alternativas para que grandes obras de infraestrutura, fundamentais para o desenvolvimento do estado, saiam do papel.
“No nosso levantamento de obras da União, do previsto para Santa Catarina em 2014, em infraestrutura do transporte, foi pago somente 37%. Em 2015, na execução do orçamento geral da União e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), foi pago até o momento 20% do previsto, que era R$ 1,5 bilhões. Nós temos nessa área de transporte uma grande demanda de obras estratégicas e o que se percebe é que cada vez mais os governos têm dificuldade em cumprir essa agenda”, afirma o secretário executivo da Câmara de Transporte e Logística da Fiesc, Egídio Antônio Martorano.
No entanto, em pesquisa recente realizada pela entidade, ficou evidente que as parcerias público-privadas ainda são desconhecidas em grande parte dos municípios catarinenses. “Devido ao resultado da pesquisa, estamos com esse projeto de divulgar a PPP como alternativa para muitos municípios”.
Com o cenário de desconfiança com a economia brasileira, a Fiesc acredita que não existe outra saída a não ser a participação privada nos investimentos de infraestrutura. “Isso pode ser dado de qualquer forma: concessão, PPP, ou por meio do ICMS, como acontece em Brusque. O único problema do modelo do ICMS é a dificuldade do governo em abrir mão da receita”.
Para ele, o que ocorre em Brusque é um exemplo que deve ser seguido. “Essa iniciativa da Irmãos Fischer é louvável. Sem a participação privada não vamos cumprir a agenda de infraestrutura de forma alguma. Essa soma do público e do privado pode viabilizar obras importantes”.
Martorano ressalta ainda que as parcerias podem contribuir para a competitividade das indústrias. “A Fiesc defende a infraestrutura. Se não tivermos essas estradas prontas, as duplicações em andamento, vamos perder muita competitividade”.
Apenas em casos estratégicos
A modalidade de parceria usada para duplicar um trecho da rodovia Antônio Heil tem como base o Convênio ICMS 85/11, aprovado no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) em setembro de 2011. A legislação catarinense incorporou este instrumento legal introduzindo em seu Regulamento do ICMS o artigo 23-A, que busca conciliar o interesse público pela execução de obra de infraestrutura e pré-disposição de empresa contribuinte em assumir a sua execução.
“Entendendo o governo pelo interesse e pela conveniência da obra, e oferecendo-se a empresa a executá-la, o Estado fica autorizado por esta legislação a conceder um crédito adicional de ICMS à empresa”, explica, em nota, a Secretaria da Fazenda.
Conforme a pasta, a empresa que executa a obra pública tem uma tripla fiscalização do governo: a fiscalização técnica do Deinfra, nas questões relacionadas a engenharia e contratações; a fiscalização tributária da Secretaria de Estado da Fazenda, em relação aos créditos de ICMS e, posteriormente, a verificação da Auditoria de Obras do Estado, em relação aos gastos na obra. “Por fim, no exercício seguinte, tudo será novamente verificado, junto com as contas do governo, pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-SC)”, esclarece a Fazenda.
Embora tenha amparo constitucional, esta modalidade ainda é pouco utilizada no estado. Para a Secretaria de Estado da Fazenda, trata-se apenas de um instrumento para uso estratégico. “Considerando as dificuldades em gestão da arrecadação, em queda pela crise econômica, não há muitos casos em andamento. Apenas de obras estratégicas, em que empresas com sólidas condições econômico-financeiras possam conduzir a obra até o seu final”.
Além da Irmãos Fischer, utilizam desta modalidade a Baumgarten Gráfica e a Hemmer Alimentos, para a conclusão do Complexo Viário Bernardo Wolfgang Werner, mais conhecido como ponte do Badenfurt, em Blumenau; e a Klabin, para a melhoria de um trecho da SC-114, em Otacílio Costa, na Serra catarinense.
Neste ano, receberam a autorização para a execução de obras a empresa Krona, para melhoria do trevo da rodovia 108, no acesso à rua dos Suíços, em Joinville, no Norte do estado; e a Celulose Irani, para a melhoria da rodovia SC-451, no trecho entre Vargem Bonita e Ponte Serrada, no Oeste catarinense.
Pavimentação em parceria
Outro exemplo da parceria público-privado na região é o acesso que liga Brusque a Guabiruba. A estrada – 1,5 quilômetros – foi pavimentada e revitalizada pelo mesmo modelo do utilizado na duplicação da rodovia Antônio Heil.
Após anos esperando o governo do estado liberar o recurso para realizar a obra, o empresário Juliano Schumacher, presidente da empresa têxtil Guabifios, propôs a parceria na esperança que o projeto se concretizasse.
“Vi que o governo fez algo semelhante com o grupo Votorantim, em Vidal Ramos, então nos credenciamos. Felizmente, fomos contemplados”, diz.
A melhoria da estrada custou à Guabifios aproximadamente R$ 8 milhões. Tirando os problemas com a empresa que executou a obra e os sucessivos atrasos, o empresário diz que o esforço valeu a pena. “Faz parte da minha obrigação como cidadão, como empresário que usufrui da cidade. O dinheiro financiado, o tempo despendido, é motivo de orgulho e satisfação. Ficamos felizes que a obra está servindo tão bem a comunidade”.
Para ele, iniciativas como esta devem ser incentivadas. “Eu sei que nem todos têm vontade de aceitar um desafio, uma empreitada dessa, mas vale a pena. Infelizmente, as leis de parceria público-privada dentro do estado só contemplam obras de grande vulto, mas seria muito interessante fazer obras menores também por este sistema, assim, a empresa que fica em um determinado bairro, que tem alguma demanda, pode ser beneficiada por essa benfeitoria”.
20 mil
é o número de veículos que trafegam diariamente pela rodovia Antônio Heil, entre Brusque e Itajaí
R$ 35 milhões
é o valor custeado pela empresa Irmãos Fischer, incluindo indenizações, em troca do abatimento de ICMS