Imigração italiana foi incentivada por benefícios, mas marcada por problemas de estrutura, adaptação e conflitos

Chegada dos imigrantes território brusquense foi conturbada pela falta de estrutura e investimentos

Imigração italiana foi incentivada por benefícios, mas marcada por problemas de estrutura, adaptação e conflitos

Chegada dos imigrantes território brusquense foi conturbada pela falta de estrutura e investimentos

A chegada dos imigrantes italianos e tiroleses de língua italiana ao território brusquense da então Colônia Itajahy foi conturbada pela falta de estrutura e pelos investimentos feitos pelo Estado brasileiro. Após a chegada dos primeiros da chamada Grande Imigração, em junho de 1875, a população aumentava rapidamente e as promessas que fizeram os italianos deixarem a Europa tinham problemas na realidade.

Os 108 primeiros imigrantes chegaram a Itajaí, e teriam que seguir para Brusque ou Blumenau após alguns dias. Os navios aportavam no Ancoradouro das Cabeçudas. A recepção era realizada nas Casas de Imigração, conhecidas à época como Barracão dos Imigrantes, com capacidade de abrigar entre 160 e 200 pessoas. Assim terminava uma longa viagem de navio, que teve paradas no porto do Rio de Janeiro e, a depender do trajeto, também no porto de Desterro (atual Florianópolis).

Não havia estrutura suficiente para a recepção de uma grande quantidade de imigrantes quando o contrato Caetano Pinto começou a ser posto em prática. Os lotes não estavam demarcados quando os imigrantes chegaram ao território brusquense, as medições dos lotes eram demoradas e os colonos continuavam chegando. Eram garantidas, pelo contrato Caetano Pinto, hospedagem e alimentação nos oito primeiros dias após a chegada.

Acomodar os imigrantes era um problema central para a administração colonial. Sem lotes demarcados, eles eram acomodados nos chamados barracões de recepção. Eram construções precárias, de pau-a-pique, barreada, coberta de folhas de palmito trançadas. A princípio, o prazo máximo de acomodação deveria ser oito dias, mas os imigrantes podiam passar mais de seis meses nos barracões, com registros de superlotação a partir de 1876. O bairro Barracão, no atual território de Gaspar, tem este nome justamente por conta desta construção.

Os lotes eram comprados pelos imigrantes, sob condições e preços estabelecidos no Decreto nº 3748 de 19 de Janeiro de 1867.

Problemas de adaptação

Os italianos e tiroleses chegavam a lugares totalmente desconhecidos e isolados. As terras eram as periféricas na colônia Itajahy ou eram parte da já anexada Colônia Príncipe Dom Pedro, porque o território brusquense já era ocupado pelos alemães anos antes. Vários dos lotes tinham topografia irregular, entre os montes. Especialmente nestes, a agricultura acabava sendo dificultada.

Os primeiros imigrantes italianos e tiroleses de língua italiana, em 1875, foram levados a terras do que havia sido a Colônia Príncipe Dom Pedro. Contudo, recusaram o local e partiram, abrindo caminho rumo ao Vale do Rio Tijucas.

Estes pioneiros eram cerca de 20 famílias das regiões da Lombardia e de Trento. Elas se estabeleceram perto dos limites atuais entre os municípios de Brusque e Nova Trento, onde está hoje o distrito neotrentino da Claraíba. As origens e idiomas diferentes entre lombardos e trentinos causavam problemas de comunicação.

Os imigrantes receberam lotes nas localidades de Poço Fundo e Águas Claras. Na sequência, foram distribuídos lotes no atual território de Nova Trento. O núcleo de Porto Franco, na atual Botuverá, recebeu imigrantes de origem italiana, majoritariamente da região de Bérgamo. Muitos tiroleses de língua italiana foram instalados no Lageado Alto, na atual Guabiruba.

Com base nos relatos do padre Arcangelo Ganarini, a professora e pesquisadora Rosemari Glatz explica: “em vez de encontrarem os terrenos medidos, com suas casas provisórias e um trecho de floresta derrubado com suas estradas para localizá-los, nada existia. Houve necessidade de improvisar grandes barracões com capacidade para 50 a 60 famílias, enquanto um monte de pseudoengenheiros se metia nos matos em todas as direções, medindo terrenos para toda aquela gente.”

Quando as condições eram precárias e os lotes eram pouco agricultáveis, muitos colonos se viam obrigados a voltar para a Itália ou ir à Argentina. Grande parte das famílias ficava ociosa enquanto aguardava seu lote. As raras exceções se davam quando a administração da colônia organizava o trabalho na abertura de estradas. Italianos provenientes da Lombardia, quando recebiam terrenos inadequados para o plantio de produtos a que suas famílias estavam acostumadas, mudavam de local, especialmente se os benefícios do governo fossem cortados.

150 anos da Grande Imigração Italiana
Ed Carlos Santana/O Município

Preferência por Brusque

Mesmo com Blumenau tendo lotes demarcados anteriores à chegada dos imigrantes austríaco-tiroleses de língua italiana e italianos, a maioria preferia Brusque, a Colônia Itajahy, por estar vinculada ao contrato Caetano Pinto.

O local para se estabelecer no Brasil poderia ser escolhido já na Europa, antes da viagem. Uma vantagem importante para os imigrantes em Brusque era a ajuda de custo para a compra de sementes e ferramentas, entregues enquanto eles ainda aguardavam os lotes nos barracões. Algo diferente do que ocorria em Blumenau, que começou como colônia privada.

Alfredo d’Escragnolle Taunay, o Visconde de Taunay, foi presidente da província de Santa Catarina de 7 de junho de 1876 a 2 de janeiro de 1877. Neste período, se mostrou um crítico das políticas de imigração aplicadas pelo Império, como escreve em ofício de 1876 ao então ministro da Agricultura, Tomás José Coelho de Almeida.

“Esta situação […] é agravada de modo evidente pela chegada contínua de novos imigrantes. Acumula-se gente nos barracões de recepção, lá ficam seis ou mais meses a receber subsídios do cofre público e à espera de lotes medidos, onde serão localizados”.

“Chega o colono e é levado para o barracão de recepção da Barra do Itajaí-Mirim
e do Açu, onde fica dois dias à espera de uma condução, quer para Brusque, quer para Blumenau. Consultados sobre o destino que desejam, gritam todos, em uma só voz: Itajaí [Brusque], desconfiados de que possam ser enganados na direção a tomar e levados para Blumenau. Aí aparecem agentes de negociantes estabelecidos em Itajaí que aconselham resistência até que todos sigam para o centro onde eles têm suas casas de negócios.” 

“Uma vez em Brusque, o colono recebe de uma só vez todo o dinheiro para o seu estabelecimento, fartura de casa [alimentação], derrubadas [das matas], sementes e transporte, de modo que, se tiver três pessoas da família, recebe de pronto e de uma só vez 148$000 (cento e quarenta e oito mil réis), ainda que vá ficar oito ou mais meses dentro de um barracão de recepção à espera para que se localize num lote que ele, pelo seu contrato, ainda pode ou não aceitar, conforme for do seu agrado. E enquanto está no barracão, o Estado lhe dá 2$000 [dois mil réis] diários para que ele vá trabalhar em estradas, ficando a família a ‘abanar os braços’.”

“Uma vez de posse da soma que naturalmente lhes é fabulosa, aqueles proletários da Europa começam os gastos em botequins e casas de cerveja, de modo que uma dessas, do cidadão Thies, vendeu em cinco dias 16.000 garrafas de cerveja. Some-se a esta porção o que foi consumido em outros negócios e terá V. Ex.ª. uma quantidade enorme de litros de cerveja pagos pelo Governo do Brasil aos seus imigrantes como saudação de feliz chegada.”

Ilustração 150 anos da Grande Imigração Italiana - revolta dos colonos
Colonos organizados se revoltavam com a piora das condições de vida | Ilustração: Ed Carlos Santana/O Município

Conflitos e revoltas

Retiradas de direitos e precarizações ainda maiores nas condições de trabalho foram motivos de revolta por parte dos colonos a partir de 1878, com mudanças não apenas na direção da Colônia Itajahy, com o liberal João de Carvalho Borges Júnior assumindo o cargo, mas também no Conselho de Ministros do Império do Brasil, com a saída dos Gabinete Caxias III, conservador, e a entrada do Gabinete Sinimbu. Carvalho Borges assumiu em dezembro de 1877 e a mudança de gabinetes foi efetivada em 5 de janeiro de 1878.

Ainda em janeiro de 1878, a província de Santa Catarina intimou os diretores de colônias a suspenderem os pagamentos aos colonos. Em seu livro Cancionata, o escritor Saulo Adami cita o sociólogo e doutor em história Renzo Maria Grosselli:

“Não somente não se distribuía mais trabalhos nas estradas ou os poucos estritamente necessários, mas não se honrava os débitos contraídos com quem, nos meses precedentes, tinha trabalhado neste serviço. Acontecera que o governo do Rio [de Janeiro] tinha reduzido a um terço os financiamentos das colônias de Santa Catharina (sic). Como o ano financeiro não coincidia com o ano civil, mas ia de julho a junho, os governantes de Santa Catharina deram-se conta que haviam dispensado tudo o que tinha sido previsto para aquele exercício.”

Já com dificuldades de se manterem na agricultura e, agora, sem o auxílio diário de 1 mil réis (1$000), os colonos começaram a se revoltar, inclusive com uso de violência. Forças policiais eram acionadas para reprimi-los. Houve mortes, prisões e expulsões da colônia. Colonos condenados na acusação de terem sido líderes de um motim foram enviados de volta às terras natais.

O inspetor da colônia na época, Ludwig Heinrich von Holleben, e o agrimensor norte-americano Edward Dorr, eram conhecidos pelos italianos e tiroleses, tendo a violência na repressão como marca. Em Cancionata, o escritor Saulo Adami traz dois casos de abordagem violenta, com fontes primárias, testemunhos e documentação de arquivos policiais e judiciários nos quais Holleben e Dorr estiveram envolvidos. Um dos casos é o de um dos antepassados de Adami, Leopoldo.

O cenário da colônia

O padre Arcangelo Ganarini, vigário paroquial de São Luís Gonzaga na Colônia Itajahy de 1876 a 1882 e pároco de 1881 a 1884, tem relatos de 1880:

“Quando os imigrantes de língua italiana chegaram a Brusque, a própria sede da Colônia contava uma dezena de ranchos de madeira ou de barro, cobertos de folhas. As melhores construções eram o tempo antigo da Igreja Matriz São Luiz Gonzaga, a casa de orações protestante (luterana) e a Casa da Direção. Existia uma única bodega, mantida por uma sociedade, onde muito mal se poderia matar a fome. Um vigário católico e um pastor protestante exercitavam, havia já algum tempo, a cura das almas dos seus fiéis que, a não ser pequenos atritos, viveram sempre em boa paz”. O trecho adaptado e traduzido está contido nas pesquisas da professora e pesquisadora Rosemari Glatz.

Em 1880, quando o padre Ganarini fez seus relatos, o território brusquense tinha uma povoação à esquerda do rio Itajaí-Mirim. Havia bodegas, casas comerciais, agência de correio, clube de tiro ao alvo, um pequeno teatro, três fábricas de cerveja, padarias,
açougue, alfaiataria e outros estabelecimentos e serviços.

Estava em construção uma nova Igreja Matriz, e existiam três escolas: duas públicas, católicas, e uma luterana, privada. Uma estrada de 38 quilômetros levava a Itajaí. Outra, de 28 quilômetros, era a ligação com os territórios atuais de Nova Trento. Não havia pontes para ligar as margens do rio Itajaí-Mirim: eram duas balsas transportando veículos, animais e pessoas; e, em outros pontos, canoas faziam o transporte de pessoas.

Casa e alimentação

A professora Leda Maria Baptista é pesquisadora da história de Gaspar, cujo território integrava a Colônia Itajahy. No programa Momento Histórias de Gaspar, da TV Gaspar, ela resume hábitos e estruturas do cotidiano do imigrante italiano.

“Os abrigos, com materiais do mato, foram logo substituídos por casas com troncos e madeira serrada, cobertas com palhas ou tabicas, uma espécie de telha de madeira. Os telhados eram bem angulosos.”

Conforme a professora, a cozinha era construída separada da casa de dormir. A alimentação era feita com grãos, tubérculos e frutos da colônia, além de hortaliças coletadas ou cultivadas. Peixes, animais de caça, frangos e porcos eram as fontes de proteína.


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Platz foi a choperia mais popular de Brusque por anos. Relembre:


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