Para todas as pessoas que tiveram o privilégio de ser alfabetizadas ainda na primeira infância, a capacidade de ler parece ser uma condição inata. A melhor prova de que isso não é verdade é o fato que a grande maioria de nós tem uma lembrança da fisionomia, o nome ou uma lembrança emocional do professor ou professora que nos alfabetizou.

Fui alfabetizado por uma freira de nome Tereza Emmanuel, uma professora que tinha o dom para ensinar e que alfabetizou milhares de crianças.
Por parecer algo tão natural, poucas vezes percebemos a importância de esse aprendizado, o primeiro grande passo na formação da pessoa que seremos no futuro.

Ler abre as portas do mundo, a taxa de alfabetização é um dos principais indicadores para saber o grau de desenvolvimento de um país. Há aproximadamente 6 mil anos aparecem na Mesopotâmia os primeiros sinais escritos em forma de desenhos.

Há uma longa jornada até o aparecimento de uma escrita alfabética pelo ano de 1850 a.C.
Em 1250 a.C. os fenícios chegaram a um sistema de 22 sinais, desse sistema descendem todas as ramificações da escrita alfabética, até que no século VIII a.C. um homem desconhecido, certamente um gênio, a partir do alfabeto fenício, inventou e adaptou para sua língua grega as já conhecidas consoantes e inventou as cinco vogais.

Esse alfabeto melhorado foi o que se difundiu pela Europa e que permitiu que a escrita saísse dos palácios e fosse acessível às pessoas comuns.
Já era estudante de medicina quando tomei conhecimento que existem pessoas que tem dificuldades para aprender a ler e escrever, transtorno conhecido como dislexia.

Uma colega, pessoa de rara inteligência, tinha dislexia moderada e isso dificultava muito seu aprendizado, principalmente porque nos primeiros anos de medicina é necessário decorar milhares de páginas.

Ela conseguiu vencer esse desafio montando estratégias que facilitavam seu aprendizado, pedia para outros lerem os textos, nunca faltava nas aulas e durante elas mantinha um hiperfoco.

Outra estratégia produto da orientação de uma pedagoga foi o uso de uma regra vazada que permitia ler uma linha do texto de cada vez.
Muitos disléxicos têm dificuldade para seguir a linha de leitura de um texto porque parece que as palavras das linhas superiores e inferiores se misturam àquelas que ela está lendo.

Nos anos 80 era difícil conseguir literatura sobre dislexia, uma exceção era o livro do professor argentino Julio Bernaldo de Quirós, um pesquisador que ajudou a formar gerações de especialistas.

Júlio foi um dos precursores da formação dos cursos de fonoaudiologia da USP e da PUC-SP no Brasil. A prática da leitura proporciona uma série de benefícios para o nosso desempenho cognitivo e nossa saúde mental.

Infelizmente o desenvolvimento tecnológico está priorizando os recursos audiovisuais e os textos curtos de rápida recompensa sobre a leitura de livros ou textos longos dos mais variados temas.
O IBGE relata que apenas 9,5% dos estudantes brasileiros leram algum livro com mais de 100 páginas. Entre os benefícios que a leitura proporciona podemos citar a melhora da nossa memória ao relacionar uma sequência de diálogos, personagens, fatos e lugares.

Há também uma melhora da capacidade de atenção e concentração, melhora do nosso vocabulário e, portanto, maior capacidade de verbalização.
Vários estudos têm demonstrado que a prática da leitura com uma frequência maior a uma vez por semana atrasa o desenvolvimento de quadros de demência e até do conhecido deterioro cognitivo leve do idoso. A leitura é capaz de diminuir a frequência cardíaca ao diminuir o estresse e a ansiedade.

Na terceira idade tem sido uma ferramenta fundamental para enfrentar o isolamento social tão frequente nessa fase da vida. Um livro é sempre um bom investimento, tem muitos benefícios e não tem efeitos colaterais.

Ao presentear alguém com um livro, além de diversão estamos oferecendo saúde mental.