Recuperar valores
Nestes dias de isolamento social dá para realizar muitas coisas para preencher, com maturidade e sabedoria, o tempo a disposição. Por sinal foi bastante dilatado, seja para cultivo pessoal e familiar. No meu quarto, olhando na parede atrás do computador está uma foto que ganhei. É do pai e mãe, do “nonno” e “nonna” paternos, uma tia Angelina, irmã do pai, e minha irmã Maria, a primogênita (já falecida), e meu irmão Dionízio, hoje, com 94 anos. A foto presumo que seja de 1926/27. Ela me fez suscitar, como sempre, algumas reflexões que reparto com você, caro leitor e estimada leitora. Vejamos.
Como o “nonno e a nonna”, depois de deixar o Norte da Itália, região da Lombardia, especificamente da Província de Bergamo, em 1875, após enfrentar a viagem, cantada em várias canções, chegar ao Brasil, permanecer confinados em acampamentos improvisados em Brusque, foram destinados para a região montanhosa de Porto Franco, hoje Botuverá. Conseguiram pequenos lotes de terra, com média de 300m de largura por 1000 de fundo, maior parte em morro bastante íngreme.
Praticamente isolados, nessas terras virgens e selvagens. Pois, foram enviados para o meio da mata cerrada, com índios residentes, alguns circulando nas imediações das casas (na frente da casa construída pelo “nonno” havia uma enorme ocara, desativada, onde os índios faziam sua fogueira permanente. A terra cota de mais de um palmo de fundura, indicava ser usada, há bastante tempo. Animais selvagens circulando continuamente pelas imediações. Poucos instrumentos agrícolas à disposição. Ali, construíram sua casinha de madeira e criaram sua família, bastante numerosa, cinco filhos e quatro filhas (duas como irmãs religiosas contemporâneas e auxiliares de Madre Paulina, hoje, Santa Paulina). Seus filhos viveram e formaram suas famílias, dentro desse ambiente.
O que manteve esse povo, em seu isolamento com quase nada à disposição, com ânimo e coragem de viver? Será difícil para nós, hoje, tentar fazer uma ideia que se aproxima da realidade vivida diariamente por todos, sem grandes distinções. Sem dúvida, foram os valores que aprenderam a viver em família. Entre todos, destaco os que consegui ver presentes na vida dos meus pais e em boa parte das famílias que conheci, em criança e na adolescência.
Assiná-lo os que mais invadem minha memória e também marcaram bastante minha vida: a família, nas suas várias atividades – unida à mesa; na oração do terço e outras orações; no árduo trabalho; na participação da comunidade eclesial, sobretudo, na vivência dos Sacramentos, particularmente, a celebração da Eucaristia e outras iniciativas e atividades da comunidade (escola, festas,..); na solidariedade com os vizinhos e outras pessoas necessitadas da comunidade; nos trabalhos domésticos, no cuidado com os animais domésticos, no cultivo de árvores frutíferas e de flores de quase todas as variedades disponíveis, na região… a fé vivida, na simplicidade, norteava tudo.
Penso que o ânimo ferrenho e a coragem de enfrentar a vida como ela se apresentava vieram dessa participação efetiva, na vida da família e da comunidade, tudo iluminado pala presença de Deus e da solidariedade em família e na comunidade.
Não se trata de saudosismo. Nem de usar a ferramenta da informática – copiar/colar – não é por aí. É recuperar esses valores e, com sabedoria e criatividade, inseri-los em nossa vida pessoal e familiar, com o “rosto” do momento histórico atual.